Presidente muda o “centro nervoso” do governo, mas o Centrão avisa: “vamos com Bolsonaro até o cemitério, mas não pulamos na cova”
Por Rafael Jasovich*
Jair Bolsonaro, o presidente sem partido, finalmente cedeu e “aceitou” o pedido de demissão do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. Se a queda do “chanceler” já era esperada desde a semana passada, a súbita saída do ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, surpreendeu Brasília e provocou um terremoto de especulações.
Horas depois, foram anunciadas oficialmente mudanças em seis ministérios. O general Braga Netto deixa a Casa Civil para substituir Azevedo e Silva e o general Luiz Eduardo Ramos (da Secretaria de Governo) assume a Casa Civil. A Justiça passa a ser chefiada pelo delegado da Polícia Federal Anderson Gustavo Torres.
O embaixador Carlos Alberto Franco França assume o Itamaraty. E André Luiz de Almeida Mendonça – que já chamou Bolsonaro de “profeta” – ocupa o lugar de José Levi na Advocacia-Geral da União (AGU).
E a Secretaria de Governo fica com o Centrão: a deputada federal Flávia Arruda (PL-DF) assume o posto, enquanto o general Walter Braga Neto assume o ministério de defesa.
Circula a versão de que Azevedo e Silva saiu da Defesa porque teria sido contra eventual demissão do comandante do Exército, general Edson Leal Pujol, que seria considerado “fraco” por Bolsonaro.
Na nota em que anuncia sua saída do governo o ex-ministro da Defesa escreveu uma frase que chamou a atenção: “Nesse período, preservei as Forças Armadas como instituição de Estado”.
Importante perceber que as mudanças acontecem no “centro nervoso” da segurança nacional: Defesa, Ministério da Justiça, AGU, Casa Civil e Secretaria de Governo. Apesar de a deputada do PL assumir a Secretaria de Governo, a dança das cadeiras não está acontecendo no terreno tradicional do Centrão.
Na opinião do deputado federal Marcelo Freixo (Psol-RJ), Bolsonaro “está unindo fisiologismo e autoritarismo”. A estratégia, especula, seria abrir espaço para o Centrão e ao mesmo tempo fortalecer “a ala militar mais submissa ao seu projeto de poder”.
A nota do já ex-ministro da Defesa seria “um alerta de que as Forças Armadas serão cada vez mais o tal do ‘meu Exército’”, escreveu Freixo na rede social.
“O que temos a dizer é que não é céu de brigadeiro em Brasília”, ironiza Paulo Teixeira (PT-SP). Segundo ele, o general Fernando Azevedo saiu porque “não se alinhou à escalada autoritária do presidente da República”. O deputado especula que as mudanças ministeriais podem ser resultado do desgaste “pela criminosa condução da pandemia e o efeito Lula”.
Os comandantes militares colocam seus cargos à disposição do novo ministro da Defesa. Na realidade foram sumariamente demitidos por um capitão.
Bom, feitas as trocas e a posse sem jornalistas presentes, o Centrão ganha força, mas nada muda: segue tudo igual, com o capitão recomendando o uso de cloroquina comprovadamente ineficaz para o tratamento da Covid-19, com as UTIs lotadas, o número de mortes ultrapassando os 4 mil diários e o povo morrendo da doença e de fome.
O Centrão acompanhará o capitão enquanto conseguirem vantagens pecuniárias. Mas como já avisaram, “vamos com Bolsonaro até o cemitério, mas não pulamos na cova”
Para o capitão que vem derretendo diariamente só resta o sonho do golpe com o “meu exército”, como ele chama as Forças Armadas da Nação. Mas até nisso ela já fracassou.
*Rafael Jasovich é jornalista e advogado, membro da Anistia Internacional
No destaque, Bolsonaro, agora com máscara, dá posse aos seis novos ministros (Foto: Marcos Correa/PR/Agência Brasil)