Pilhas de estéril podem ter efeitos “tão graves” quanto rompimento de barragens, diz MPMG; Itabira já dispõe de 14 dessas estruturas
Pilha de Depósito de Estéril (PDE) Canga, em Itabira, fica acima da barragem do Rio de Peixe
Foto: Carlos Cruz
Reportagem do jornal O Tempo desta terça-feira (18), que pode ser lida na íntegra aqui, destaca a advertência do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) sobre os potenciais danos graves das pilhas de rejeito/estéril, que considera serem comparáveis aos de um rompimento de barragem.
Durante o atendimento às 288 pessoas desalojadas em Conceição do Pará, devido ao deslizamento de uma pilha de rejeitos de ouro, o MPMG enfatizou a necessidade de rigor na avaliação e monitoramento dessas estruturas.
Especialistas ouvidos pela reportagem, como Vinícius Papatella Padovani, advogado e cientista socioambiental, concordam que as pilhas de rejeito representam um grande risco, podendo desestabilizar barragens e diques.
Esse é o risco potencial, por exemplo, da Pilha de Depósito de Estéril (PDE) Canga, instalada próxima a cidade de Itabira, acima da barragem do Rio de Peixe.
Na resposta à reportagem de O Tempo, a 1ª Promotoria de Justiça da Comarca de Pitangui ressaltou que o rompimento dessas estruturas pode causar impactos ambientais e comunitários tão graves quanto os desastres de Mariana e Brumadinho.
“O rompimento de uma estrutura como esta (pilha) tem potencial de causar efeitos deletérios para o meio ambiente e às comunidades tão graves quanto àqueles causados por rompimentos de barragens de rejeitos – o que se deu nos desastres de Mariana e Brumadinho”, escreveu o MPMG em resposta à demanda do jornal belorizontino.

Esclarecimentos necessários
Após o deslizamento de uma pilha estéril no município de Conceição do Pará, pertencente à Mineração Serra Oeste, o Conselho Municipal de Meio Ambiente (Codema) de Itabira aprovou o encaminhamento de convite à mineradora Vale para que informe sobre os aspectos de segurança dessas pilhas e as medidas de controle e prevenção dos riscos inerentes a essas novas estruturas.
O envio do convite à mineradora foi aprovado pelo órgão ambiental municipal em dezembro do ano passado, após solicitação de esclarecimentos do conselheiro Leonardo Reis, representante da Cáritas Diocesana. O pedido foi reiterado na reunião extraordinária órgão ambiental ocorrida em janeiro deste ano.
Entretanto, até a última reunião do Codema, na sexta-feira (14), a Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMMA) não havia enviado o ofício à mineradora, mesmo tendo o pedido sido novamente reiterado na reunião extraordinária do órgão ambiental em janeiro.
Pilhas em Itabira
No município, que dispõe das maiores barragens de rejeitos de minério de ferro do país, proibidas de receber esse material à exceção da barragem de Itabiruçu, que foi alteada recentemente com licença ambiental obtida pela Vale antes das tragédias-crimes de Mariana e Brumadinho, a alternativa encontrada tem sido a disposição desse material em pilhas a seco.
No entorno da cidade, já estão instaladas 12 pilhas de estéril e duas de estéril e rejeito compactado, totalizando 14 estruturas. E essas devem ser só o começo, uma vez que já se encontra em processo de licenciamento a expansão das cavas das minas Conceição e do Meio, assim como de pilhas de estéril,
Essa expansão certamente demandará mais espaço para novas pilhas, ainda que no atual processo de licenciamento esteja relacionada apenas à expansão de uma pilha já existente no complexo Conceição.
Outras estruturas semelhantes devem surgir no entorno da cidade com a expansão das cavas das minas Conceição e do Meio em processo de licenciamento, cuja anuência deve ser discutida pelos conselheiros do órgão ambiental municipal nos próximos meses.
Riscos inerentes
Especialistas ouvidos pela reportagem de O Tempo, como o professor Roberto Galéry da UFMG, destacam que as pilhas de rejeitos exigem metodologias rigorosas de compactação e monitoramento intensivo, dada a sua alta umidade e baixa coesão.
O Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM) afirma que o licenciamento dessas pilhas é detalhado, exigindo projetos executivos que incluem dimensões, altura, volume, drenagem e cálculos de estabilidade. Uma norma publicada em novembro de 2024 prevê a exigência de estudos de impacto ambiental e de ruptura hipotética para pilhas de estéril.
Entretanto, nada disso ainda foi apresentado pela Vale a Itabira, tendo as novas pilhas sido licenciadas sem a participação da comunidade e até mesmo das autoridades municipais, com prévia anuência do Codema, que é o órgão municipal deliberativo e continua sendo consultivo nas questões ambientais.
É preciso que o país crie novas normas e regulamentações mais rígidas para essas estruturas, antes que seja tarde.
O que diz a Vale
Em resposta em reportagem anterior deste site, Vale diz manter todas as medidas de controle e monitoramento das pilhas, conforme legislação. Confirma que mantém atualmente 12 pilhas de estéril e duas pilhas de estéril e rejeito compactado, totalizando 14 estruturas em Itabira.
Diz que “o empilhamento do estéril e ou rejeito segue projeto de engenharia desenvolvido por empresa especializada e atende às normas e parâmetros técnicos estabelecidos na legislação,” assegura.
“As pilhas são dotadas de sistemas de drenagem, possuem instrumentos de monitoramento geotécnico e passam por inspeções e manutenções periódicas para conservação de suas condições de segurança.”
Além disso, a Vale diz ter implementado metodologia de avaliação e gestão de riscos. “As estruturas também são avaliadas constantemente por equipe técnica externa especializada.”
São duas pilhas de disposição de estéril e rejeito compactado: Ipoema-Borrachudo e Cauê, que iniciaram suas operações em 2022 e 2024, respectivamente.
De acordo com a mineradora, as pilhas são dotadas de sistemas de drenagem, possuem instrumentos de monitoramento e passam por inspeções e manutenções periódicas para conservação da estabilidade e de suas condições de segurança. “As estruturas também são avaliadas constantemente pela EoR (Engenharia de Registros).”
Segundo explica a mineradora, trata-se de uma prática na qual engenheiros e desenvolvedores criam e mantêm metadados detalhados sobre os dados gerados, coletados ou utilizados por um sistema. “Esses metadados são chamados de ‘registros’ e incluem informações como a origem dos dados, transformação, destino, qualidade e governança.
Na oportunidade, a mineradora esclarece que estéril é o material extraído na cava, no processo de lavra do minério de ferro, e é composto basicamente por solo e rocha. Já o rejeito é gerado após o processamento do minério de ferro em usinas. “Para ser empilhado, o rejeito é filtrado e disposto em estado sólido”, acrescenta.