Vale tem prazo até junho para informar à ANM como vai garantir a segurança de quem vive nas zonas de autossalvamento
Carlos Cruz
A mineradora Vale tem prazo até 30 de junho para apresentar à Agência Nacional de Mineração uma das três alternativas para garantir a vida e a segurança dos cerca de 18 mil moradores, na cidade de Itabira, inclusive de seus patrimônios, que estão nas chamadas Zonas de Autossalvamento (ZAS), em atendimento ao que dispõe o artigo 18-A, parágrafo primeiro da Lei federal nº 14.066/2020. .
O prazo foi estipulado no artigo 54 da resolução nº 95/2022, da Agência Nacional de Mineração (ANM), que consolida os atos normativos dispostos sobre Segurança de Barragens de Mineração no Brasil. Em Itabira, essas áreas alcançam cerca de 15% do perímetro urbano.
São áreas que podem ser alcançadas pela lama de rejeito em caso rompimento de uma das 16 barragens que comportam, em seu conjunto, mais de 500 milhões de metros cúbicos de lama contendo resíduos pesados do ferro desprezado no processo de produção de pellets-feeds para o mercado internacional.
As principais barragens são Itabiruçu, Conceição, Rio de Peixe, Pontal e Santana (essa não tem rejeito, trata-se de um reservatório para abastecer a usina Cauê). Saiba mais clicando aqui.
Resolução ANM

Pelo artigo 56 da resolução ANM, só é admitida nas áreas abrangidas pela ZAS “a permanência de trabalhadores estritamente necessários ao desempenho das atividades de operação, manutenção, obras de alteamento, descaracterização ou reforço da barragem ou de estruturas e equipamentos a ela associados”.
Mas a legislação prevê alternativas para garantir a vida de quem mora nessas áreas de possíveis alagamentos e mortes em caso de ruptura de uma dessas estruturas de contenção de rejeitos, que estão relacionadas no artigo 18-A, agora já eficaz com a resolução da ANM:
“No caso de barragem em instalação ou em operação em que seja identificada comunidade na ZAS, deverá ser feita a descaracterização da estrutura, ou o reassentamento da população e o resgate do patrimônio cultural, ou obras de reforço que garantam a estabilidade efetiva da estrutura, em decisão do poder público, ouvido o empreendedor e consideradas a anterioridade da barragem em relação à ocupação e a viabilidade técnico-financeira das alternativas.”
Ou seja, até o prazo estipulado pela ANM, a Vale terá que apresentar uma das alternativas, “comprovando a sua eficácia”: 1) descaracterizar (descomissionar) as estruturas de contenção até 31 de dezembro de 2027; 2) reassentar as comunidades e o patrimônio cultural existentes nos territórios até a mesma data; 3) realizar obras de reforço que garantam a estabilidade efetiva da estrutura, com prazos específicos, o que já vem ocorrendo com os diques e cordão Nova Vista, na barragem do Pontal.
Como a Vale já vem anunciando que dará prosseguimento ao alteamento da barragem Itabiruçu, que teve as obras já licenciadas interrompidas por aparecimento de fissuras no novo maciço (alterações decorrentes de assentamentos diferenciais no terreno), instalado em terreno argiloso, conforme já havia alertado o engenheiro Antônio Carlos Felício Lambertini, da empresa Geologia de Engenharia (Geoservice).
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Consultores analisam situações de risco das barragens no vale do rio de Peixe, em Itabira
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Além do retorno de rejeitos na barragem Itabiruçu, a mineradora já divulgou também que continuará operando no sistema Pontal. Isso ocorrerá após concluir os reforços que estão sendo realizados com muros de contenção e a descaracterização de estruturas alteadas a montante.
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Reforço estrutural
Com isso, o mais provável é que venha a adotar a terceira opção. É o que a mineradora deixa entender com a resposta encaminhada à reportagem deste site, ao ressaltar as obras que já estão em curso para reforçar as estruturas.
Para isso, deve apresentar até o prazo estipulado pela ANM a alternativa considerar mais viável, juntamente com certificado internacional atestando que são todas as estruturas seguras, além de “considerar a anterioridade da barragem em relação à ocupação e a viabilidade técnico-financeira das ações que devem ser adotadas em cada uma das situações analisadas, sugerindo ao Poder Público a alternativa mais viável.”

“Diante disso, a Vale está trabalhando nos referidos estudos em relação às respectivas barragens que possuem comunidade na ZAS, estando o prazo para apresentação ainda em curso.”
A empresa acentua ainda que, especificamente em relação às barragens de Itabira, as estruturas com alteamento a montante estão sendo reforçadas e descaracterizadas, como os diques internos do Sistema Pontal.
“O dique 2 foi reforçado em 2020 e a obra de descaracterização está programada para 2023; os diques 3 e 4 foram reforçados em 2021 e estão sendo descaracterizados; e o dique 5 foi descaracterizado no ano passado, assim como o dique Rio de Peixe”, relaciona.
“Já o projeto de descaracterização dos diques Minervino e Cordão Nova Vista está em fase de desenvolvimento. Os diques 1A e 1B, da mina Conceição, estão em obras de adequação de descaracterização para atendimento às regulamentações recentes.”
Falta combinar com os moradores

Portanto, a expectativa da mineradora, que terá de ser aprovado (anuência) da administração municipal, é de que, com as obras de reforço, não será preciso remover moradores dessas áreas, nem tão pouco descaracterizar as barragens com alteamento a montante.
Ocorre que, mesmo com a segurança dessas estruturas sendo ampliada com as obras de reforço, e certificada por empresa internacional (a Tüv Süd Bureau de Projetos e Consultoria estava entre as mais conceituadas até o rompimento da barragem 1 da mina de Córrego do Feijão, em Brumadinho), como fica a tranquilidade e o sentimento de (in) segurança de quem vive nas áreas relacionadas como ZAS?
A lei faculta aos que nao se sentirem seguros discordar da alternativa apresentada pela empresa. Nesses casos, a alternativa é buscar judicialmente, ou negociar diretamente com a empresa, indenizações pelos seus imóveis.
Para isso devem ingressar com ações na justiça para que seja pago o valor de mercado, antes dos rompimentos das barragens em Mariana e Brumadinho, que tragicamente demostraram que não se está seguro quem reside abaixo dessas estruturas.
Tanto é assim que a empresa se viu obrigada a sinalizar as áreas que podem ser afetadas pela lama no caso de ruptura de uma de suas estruturas existentes na cidade, além de promover, periodicamente, treinamentos de “autossalvamento.”
Reconhecimento

É com esse sentimento que muitos moradores em Itabira já têm recorrido à justiça na busca de indenização pela desvalorização de seus imóveis – e também para que possam procurar outro imóvel para viver em segurança.
É o que fez o ex-delegado Robson Matos que ingressou com ação cautelar com tutela antecipada contra a mineradora Vale, negada em primeira instância, mas que ele recorreu, para que o seu sítio, no Bálsamos, seja incluído na ZAS das barragens Conceição de Itabiruçu.
Com a inclusão de seu imóvel na ZAS, Matos espera ser indenizado por danos moral, ambiental e material. O seu sítio está a poucos metros da barragem do rio de Peixe e abaixo das barragens Itabiruçu e Conceição (Zé Cabrito).
“Hoje, diante de todas as evidências, já temo pela minha segurança e da minha família, como também dos vizinhos, pois não temos garantia de que essas barragens são seguras”, diz o ex-delegado, que aponta também a desvalorização de seu imóvel.
“Desisti de abrir um loteamento em um terreno que tenho aqui ao lado. Quem vai querer comprar se o imóvel está na rota da lama?”, questiona o ex-delegado ao relacionar as perdas econômicas que está tendo em decorrência da proximidade com as barragens de contenção de rejeitos.
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Indenização
A própria empresa já trabalha com a possibilidade de se ver obrigada, judicialmente, a indenizar quem não se sente seguro morando abaixo de barragens, mesmo depois de concluídas as “obras de reforço”.
“A Vale informa que todas as indenizações eventualmente devidas serão tratadas com os envolvidos individualmente”, adianta a mineradora em nota encaminhada à reportagem deste site pela sua assessoria de imprensa.
Trata-se de uma decisão que tem firme oposição do Comitê dos Atingidos pela Mineração em Itabira e Região, que considera a negociação em separado, com cada proprietário, uma estratégia usada pela empresa para dividir e fragilizar as comunidades.
Segundo o professor Leonardo Ferreira Reis, a legislação assegura aos atingidos o direito à negociação coletiva. “É também assegurado o direito de os moradores disporem de uma assessoria técnica independente e à reparação integral de todos os danos causados pela mineradora proprietária da barragem”, acrescenta o ativista.
Entendimento
Procurada pela reportagem, a curadora de Meio Ambiente na Comarca de Itabira, a promotora Giuliana Talamoni Fonoff reconhece que o cumprimento da legislação federal é questão complexa e que o “entendimento (de como será a sua aplicação em Itabira) ainda está sendo construído”.
Perguntada se o MPMG abriu procedimento para tratar exclusivamente dessa pauta, a promotora respondeu negativamente. “Informo que não existe procedimento especifico sobre o tema”, disse ela, que acrescentou:
“Mas as questões são discutidas em procedimentos que demandam a discussão. O trabalho do MP sempre se baseia em fatos concretos que são tratados em suas especificidades, como inclusive a lei de segurança de barragem determina.”
Insegurança
A mesma lei federal, em seu artigo 18-A, páragrafo 2º, já citado, é clara ao determinar que somente se admite na ZAS a permanência de trabalhadores estritamente necessários ao desempenho das atividades de operação e manutenção da barragem ou de estruturas e equipamentos a ela associados.
Se é assim, como então permitir a permanência de moradores nessas áreas que podem ser atingidas pela lama de rejeitos em caso de ruptura de uma dessas estruturas?
É o que vem, seguidamente, questionando a aposentada Maria José Araújo, moradora do bairro Conceição, que fica abaixo da barragem homônima, também conhecida como de Zé Cabrito.
Ela diz não ter mais tranquilidade de continuar em sua residência desde que ocorreu o que chama de crime de Brumadinho.
“Quem mora na zona de alto risco de morte (as ZAS) tem que se salvar sozinho. Se a lama descer, e se isso pode ocorrer, muitos vão morrer. Aqui no bairro temos muitos idosos, gente acamada e em cadeiras de rodas”, afirma.
Para ela, nenhuma obra de engenharia pode ser considerada 100% segura. “Toda obra um dia pode entrar em colapso, foi o que li em uma reportagem.”
Maria José é uma das muitas pessoas em Itabira que não acreditam nos certificados internacionais de segurança. Ela quer ser indenizada, pelo preço justo, para não continuar morando onde não se sente segura.
Leia a íntegra da resposta da Vale aos questionamentos da reportagem
“É importante esclarecer que o Art. 18-A, §1º da Lei nº 12.334/2010, instituído pela Lei nº 14.066/2020, foi recentemente regulamentado pelo Art. 54 da Resolução nº 95/2022 da Agência Nacional de Mineração – ANM.
O dispositivo determinou que, para atendimento ao Art. 18-A, §1º, que o empreendedor deverá apresentar à ANM até o dia 30/06/2022 estudo de alternativas avaliando a relação de custos, riscos e benefícios para definição de qual será a medida a ser adotada (descaracterização da estrutura, ou o reassentamento da população e o resgate do patrimônio cultural, ou obras de reforço que garantam a estabilidade efetiva da estrutura), devendo considerar a anterioridade da barragem em relação à ocupação e a viabilidade técnico- financeira das ações que devem ser adotadas em cada uma das situações analisadas, sugerindo ao Poder Público a alternativa mais viável.
Diante disso, a Vale está trabalhando nos referidos estudos em relação às respectivas barragens que possuem comunidade na ZAS, estando o prazo para apresentação ainda em curso.
A Vale ressalta que não vem medindo esforços para garantir a segurança das pessoas das localidades onde atua, adotando as melhores práticas para resguardar as vidas, sempre buscando soluções para aumento crescente da segurança.
A empresa ressalta o cumprimento de todas as obrigações legais, com o aprimoramento dos sistemas de emergência e Planos de Ação de Emergência de Barragens de Mineração (PAEBM) implantados e funcionais.
A empresa ainda tem intensificado a rotina dos exercícios simulados de emergência, capacitando todos os empregados e a população, com a participação de agentes públicos, para que tenham condições de proceder com as ações necessárias em caso de emergência.
A Vale reforça que todas as barragens são monitoradas, permanentemente, pelo Centro de Monitoramento Geotécnico (CMG) e diversos instrumentos, e são submetidas a inspeções de campo regulares.
Além disso, a Companhia, visando a maior proteção das comunidades e incremento da segurança das suas operações, e em atendimento às normas vigentes, vem procedendo com a eliminação de todas as barragens a montante da empresa no Brasil, reforçando o seu compromisso com a salvaguarda das vidas humanas e do meio ambiente.
Especificamente em relação às barragens de Itabira, as estruturas consideradas como de alteamento a montante estão sendo reforçadas e descaracterizadas, como os diques internos do Sistema Pontal.
O dique 2 foi reforçado em 2020 e a obra de descaracterização está programada para 2023; os diques 3 e 4 foram reforçados em 2021 e estão sendo descaracterizados; e o dique 5 foi descaracterizado no ano passado, assim como o dique Rio de Peixe.
Já o projeto de descaracterização dos diques Minervino e Cordão Nova Vista está em fase de desenvolvimento. Os diques 1A e 1B, da mina Conceição, estão em obras de adequação de descaracterização para atendimento às regulamentações recentes.
Por fim, a Vale informa que todas as indenizações eventualmente devidas serão tratadas com os envolvidos individualmente.”
Eu se fosse os moradores na mira da lama da mineradora imoral, me juntaria a d. Maria José Araújo, ela sabe tudo…
E a Prefeitura? Já fez a lista do que foi roubado e destruído pela mineradora cruel, imoral?
A mineradora deita e rola em Itabira, por que o Povo ama a mineradora…. A Itabira não têm consciência e nem perspectiva de futuro. Prefere sofrer, pois só assim é feliz, com a mentira.