Vale participa de nova empresa criada para reabilitar áreas degradadas. Deveria começar por Itabira, onde o passivo ambiental é enorme
Ampla área desmatada na Serra do Esmeril, em Itabira, na década de 1980, aguarda reabilitação paisagística com reposição da mata nativa
Carlos Cruz
Leio na Folha de S.Paulo, em 12 de novembro, o anúncio com toda pompa e circunstância, durante a 27ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP27), realizada em novembro, na cidade de Sharm El-Sheikh, no Egito, que a Vale, juntamente com o Itaú, Marfrig, Rabobank, Santander e Suzano constituíram uma joint-venture para exclusivamente dedicar às atividades de restauração de áreas degradadas e conservação de florestas no Brasil.
Um objetivo nobre e necessário nesta conjuntura de mudanças climáticas e aquecimento global, e que pode vir a ser uma grande contribuição para ampliar o sequestro de carbono, gerando inclusive receitas para a nova empresa, batizada de Biomas.
Matas nativas

Com a nova empresa, a proposta é reabilitar matas nativas, principalmente em áreas degradadas de diferentes biomas brasileiros, principalmente Amazônia e Cerrado.
Não se sabe o motivo de não incluírem a Mata Atlântica, um dos biomas mais impactados pela mineração, como ocorreu em Itabira, com a supressão de matas nativas para abertura de lavras e também para o plantio de florestas homogêneas (pinus e eucalipto), pela subsidiária Florestas Rio Doce, nas décadas de 1970/80.
A nova empresa Biomas vai investir também na reconversão (a empresa e os órgãos ambientais tratam como conversão, o que já ocorreu quando deixou de ser mata nativa para se transformar, pela ação antrópica, em floresta homogênea) de áreas de pastagens que já não servem para esse fim e que não mais estejam de acordo com a legislação, para que voltem a ser ocupadas por florestas nativas. Nesse caso, diz a boa notícia, parcerias serão estabelecidas com fazendeiros e sitiantes.
O aporte inicial de capital é pequeno. Poderia ser muito maior considerando a nobre missão e as perspectivas: R$ 120 milhões – R$ 20 milhões de cada uma das seis sócias. Parece até simbólico, pela dimensão do propósito anunciado.
A sustentabilidade da nova empresa virá por meio da venda de créditos de carbono, reduzindo a emissão de gases que causam o aquecimento global com o plantio e desenvolvimento de novas espécies nativas.
Condicionantes

Como a ideia é fazer a reconversão de florestas homogêneas para nativas, a nova joint-venture bem que poderia começar a desenvolver as suas ações de reabilitação por Itabira, onde os estragos da mineração estão presentes em larga escala, com a supressão de extensas florestas de Mata Atlântica e do Cerrado para abertura de lavras, como também para plantio de pinus e eucalipto.
Assim fazendo, ajuda inclusive a Vale cumprir as condicionantes 33 da Licença de Operação Corretiva (LOC) do Distrito Ferrífero de Itabira, e também a 37, que mandam (sic) a empresa fazer a reconversão de florestas homogêneas para que essas áreas voltem a ser ocupadas por espécies nativas, as mesmas que existiam originalmente, conforme estabelece o plano de manejo que está no detalhamento dessas condicionantes.
Essa conversão, hoje proibida, de um bioma de mata nativa para floresta homogênea, é um passivo que precisa ser urgentemente reparado e que está atrasado. A mineradora Vale ainda não comprovou e demonstrou em Itabira – e possivelmente não tem como comprovar – que cumpriu integralmente as duas condicionantes da LOC.
A Vale dispõe de cerca de 15 mil hectares em Itabira, dos quais apenas 10% desse território é ocupado pela operação de suas minas e complexos mineradores. O restante é formado por florestas nativas secundárias, além de pinus e eucalipto. Perguntada sobre qual percentual da área é ocupada por florestas homogêneas, a mineradora não respondeu.
Manejo inédito

No início deste século, dando cumprimento às condicionantes que estipulam as ações de fazer impostas pelo órgão ambiental estadual, e aos termos de ajustamento de conduta (TAC) firmado com o Instituto Estadual de Florestas (IEF), a empresa deu início a uma experiência piloto de reconversão, com a supressão de pinus e eucalipto, deixando florescer o sub-bosque, em uma área de 206 hectares, no projeto Pedreira 2, próximo do povoado Morro de Santo Antônio.
Na ocasião a Vale noticiou em seu informativo que se tratava de um manejo inédito e que certamente serviria de referência para outras áreas que passariam pelo mesmo processo.
Era o começo para desencadear as etapas seguintes, culminando com a formação de um extenso cinturão verde, que seria formado pelas matas do Pontal, Jirau, Santana, São José e Itabiruçu.
O manejo consistia em deixar acontecer a sucessão natural, explicou o então coordenador do Instituto Ambiental Vale Salim Jordy. “A região tem um rico banco de sementes e um poder de regeneração muito grande”, salientou o engenheiro florestal.
Inicialmente, no projeto Pedreira 2 foram mantidos 25% de eucaliptos, que seriam eliminados com o tempo, pelo sistema de anelamento, estrangulando e matando a planta invasora, artificialmente introduzida no local.
Espalhadas em meio aos sob-bosques, os eucaliptos remanescentes forneceriam sombra e proteção às espécies nativas reintroduzidas – e também aos sub-bosques em desenvolvimento.
Após a morte das espécies homogêneas, elas ainda forneceriam material orgânico para suprir as espécies reintroduzidas de ipê amarelo, peroba rosa, candeia, canafístula, angico vermelho, imbiruçú, ipê rosado, sete cascas.
E também forneceriam o mesmo material orgânico às espécies frutíferas nativas, que teriam sido reintroduzidas para alimentar a avifauna como a goiaba, jenipapo, gabiroba, ingá, araticum. Com essas espécies dando frutos, iriam alimentar pássaros e animais silvestres, reconstituindo a fauna original.
Sem proteção

Maravilha, caso isso de fato tenha acontecido e prosperado. Entretanto, a mineradora nada informa sobre as áreas por onde essa experiência se estendeu, apesar de a informação ter sido solicitada pela reportagem.
Mas o que se observa até aqui não é alvissareiro. Na região do Pontal, por exemplo, é fácil constatar que esse processo de cortar eucalipto e deixar florescer o sob-bosque formado por nativas foi pífio, embora tenham sido formadas pequenas ilhas de regeneração.
Não se tem o resultado esperado por vários fatores. Um deles é que o próprio eucalipto cortado sem ser destocado pela raiz volta a florescer. E como essa espécie florestal tem crescimento mais rápido, acaba por impedir o desenvolvimento das nativas.
Além disso, como a área não é cercada, e não há vigilância, os incêndios florestais são recorrentes todos os anos. O último, neste ano, causou uma enorme devastação, como noticiou esse site.
Leia aqui:

E o que mais se perdem, quando os incêndios florestais acontecem, são os sub-bosques que, se desenvolvessem plenamente, se transformariam em florestas nativas com espécies de sucessão.
Portanto, está na região do Pontal, que passa por processo de descomissionamento de vários diques e do cordão Nova Vista, uma gleba ideal para que a nova empresa Biomas inicie o projeto de regeneração de áreas degradadas pela supressão de mata nativa, um crime ambiental que precisa ser reparado e que para isso já passou da hora.
Sem vigilância, e sem cercamento, áreas revegetadas recentemente com a desativação de diques no Pontal, e também em pilhas de estéril, são invadidas por animais (bois, cavalos).
Pisoteiam o solo, alimentam-se do que foi plantado com espécies nativas, gramíneas e leguminosas. Atrasam o processo de regeneração e a empresa nada faz para impedir essa invasão de muares e ruminantes.

Serra do Esmeril
Além do Pontal, a Vale deve a Itabira a reabilitação da Serra do Esmeril, que teve toda a sua vegetação nativa suprimida de uma só vez com corte raso no início da década de 1980 para abertura de frentes de lavras nas chamadas Minas do Meio.
Uma ação civil pública foi instaurada em 1985 para obrigar a empresa dar início à reabilitação paisagística da Serra do Esmeril, A ação foi aberta a pedido do Ministério Público. Posteriormente, em 1993, um TAC foi assinado, mas muito pouco foi feito até aqui nesse sentido.
No alto da serra, próximo da cava Cauê, a Vale está reconformando alguns taludes. Em resposta a este site, disse que não se trata do início da reabilitação da serra, mas de medida operacional.
“O objetivo é intensificar a segurança da estrutura”, respondeu a assessoria de imprensa da mineradora, sem, no entanto, explicar que fragilidade existe nessa estrutura a ponto de ter de haver essa intervenção, que deveria, já há muito tempo, se estender por toda a serra do Esmeril.
Saiba mais aqui:
Dívida ambiental

Pois no cumprimento do TAC da reabilitação paisagística da Serra do Esmeril, e também para dar encaminhamento ao que está indicado no Plano de Fechamento de Minas (PFM), encaminhado em 2013 ao antigo Departamento Nacional da Produção Mineral (DNPM), a Vale bem que poderia, por meio da Biomas, investir no resgate dessa dívida ambiental com Itabira – e que só aumenta e parece não ter fim.
Para isso é preciso intensificar a reabilitação dessas áreas degradas. Para saber mais sobre o Plano de Fechamento das Minas de Itabira, encaminhado ao órgão regulador da atividade minerária, acesse aqui:
Vale já prepara, pelo menos desde 2013, o Plano de Fechamento das Minas de Itabira
E também aqui:

Outro lado
Resposta da Vale
“As supressões de eucaliptos são realizadas em atendimento aos programas ambientais de acordo com o que preconiza a legislação. O material lenhoso gerado é, legalmente, comercializado com empresas especializadas, que são as únicas responsáveis pelo seu processamento final.”
“O reflorestamento das áreas, incluindo os taludes, é realizado tanto por plantio de espécies nativas da região, como por processo de regeneração natural, conforme metodologias aplicáveis e de acordo com as orientações técnicas-legais.”
“A Vale também realiza manutenção periódica de suas áreas, adotando a prática de vigilância patrimonial, cercamento, construção e conservação de aceiros nas áreas limítrofes com terceiros, além da identificação das áreas por meio de sinalização.”
“Sobre a questão referente ao Plano de Fechamento de Mina, compartilhamos link com as informações para consulta”:
http://www.vale.com/brasil/pt/investors/information-market/annual-reports/20f/paginas/default.aspx
Horizonte de exaustão
Esse link acima é o mesmo que foi encaminhado ao Codema, como resposta ao pedido de acesso aos Planos de Fechamento das Minas (PFM) de Itabira. Trata-se do relatório Formulário 20F, encaminhado à Bolsa de Valores de Nova Iorque, Estados Unidos.
O Codema reiterou o pedido para que sejam encaminhados os PDFs, inclusive para que esses planos sejam avaliados antes mesmo da concessão de nova licença ambiental para operar as minas de Itabira, que estão vencidas desde 2016. O órgão ambiental municipal deve também requerer a realização de audiência pública antes de sua renovação.
Saiba mais aqui:
E também aqui:

Para a Vale, o PFM só tem início cinco anos antes da exaustão das minas, prazo que vem sendo sucessivamente adiado, com as novas pesquisas geológicas e inclusão de mais recursos minerários, ainda que pobre em ferro. Isso mesmo que muitas minas já tenham sido exauridas em Itabira, a exemplo da principal e histórica mina Cauê – e várias outras frentes das Minas do Meio.
Embora a legislação determine esse prazo para início das discussões sofre o fechamento, e da execução das medidas mitigadoras e compensatórias, a atualização do PFM deve ser feita a cada cinco anos, devendo ser encaminhado à Agência Nacional de Mineração (ANM).
O próximo deve ser encaminhado ainda neste mês de dezembro.
Sabia mais acessando aqui:
Quando apresentar o Plano de Fechamento de Mina na ANM
Mas a empresa, pelo visto, não pretende dar ciência à sociedade itabirana sobre o que pretende fazer com as áreas mineradas após a exaustão, cujas medidas reparadoras deveriam ser implantadas desde já.
A maioria das perguntas encaminhadas pela reportagem não foi respondida pela Vale. São elas:

- A condicionante 33 da LOC, e também 37, que determinam a reconversão de florestas homogêneas para nativas em Itabira foram cumpridas? Onde, de que forma e qual foi a extensão dessa área (hectares)?
- Na área do Pontal, a Vale tem cortado eucalipto e vendido para fabricação de carvão vegetal? Após a supressão dessa vegetação, será feito plantio de espécies nativas, ou será apenas com o desenvolvimento de sub-bosques? Verifica-se, no Pontal, que o desenvolvimento de espécies nativas ocorre em alguns pontos, já em outros, possivelmente na maior parte, esse desenvolvimento não ocorreu, até mesmo em decorrência de incêndios florestais.
- Não seria o caso de intensificar essa substituição com o plantio e manejo adequado de espécies nativas? Outra medida não seria cercar a área, até mesmo para impedir a entrada de gados de fazendeiros vizinhos
- Dos 15 mil hectares de terra da Vale em Itabira, qual é a área coberta por florestas homogêneas (pinus e eucaliptos)? A empresa pretende fazer a reconversão para que voltem a predominar espécies nativas nessas áreas?
- Desde 1985, a Vale responde a uma ação civil pública para que faça a reabilitação da Serra do Esmeril, com a reconformação de taludes e plantio de espécies nativas. Por que isso ainda não foi feito ou pouco foi feito? Quando pretende fazer?
- O que a Vale pretende fazer com as áreas de diques e do cordão Nova Vista que estão sendo descaracterizados no sistema Pontal? Pretende cultivar plantas medicinais para a indústria farmacêutica conforme conta do Plano de Fechamento de Minas apresentado ao antigo DNPM em 2013?
- Ainda no Pontal, as lâminas d’água (lagoas) remanescentes serão também esvaziadas no processo de descomissionamento do sistema, ou terão alguma outra finalidade? Quais?
- Numa das fotos anexadas, observa-se a disposição de entulhos em área do Pontal. Que material é esse e porque está sendo disposto nesse local? Há licenciamento para essa disposição?
Área em reabilitação florestal na Serra do Esmerial: medida precisa ser intensificada e cobrada pela sociedade itabirana
Nos 70 foi extraído cascalho para srem usados nos aterros nas áreas operacionais da Udina de Conceição. Este cacslha foram retirados dos terrenos da família de Duvsl Augusto Gomes próximo à entrada de Bateia. Com esta retirada de cascalho formaram grandes erosões que assolam a bacio do Rio de Peixe e consequentes bacia do Rio Piracicaba. Peço a atenção da Vale em nos ajudar a ver este passivo