Sem alvará, empresa que poluiu o manancial da Pureza é clandestina no DI e confirma a ineficácia da fiscalização municipal
Fotos: Thamires Lopes/ Ascom/Saae
Por Carlos Cruz
A empresa Minax, instalada clandestinamente no Distrito Industrial (DI) de Itabira, do segmento de manutenção mecânica, foi a responsável pela contaminação por óleo e graxa da água que deveria ser trada pela Estação de Tratamento de Água (ETA) da Pureza, no fim de semana.
A contaminação da água foi provocada pelo transbordamento de 400 litros de óleo usado, além de o criminoso acidente ter também contaminado o solo, e consequentemente o lençol freático, por outras áreas de escapes.
Fato grave, deixou sem água potável e para outros usos, com todo esse calorão, e por todo o final de semana, cerca de 60% da população itabirana, moradores residentes nos bairros abastecidos pela ETA Pureza.
As informações estão no Auto de Infração 26/2023, lavrado pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMMA). O vazamento ocorreu na sexta-feira (10) à tarde, conforme informou um representante da empresa aos ficais da SMMA, da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano (SMDUMA), aos agentes da Polícia Militar Ambiental e técnicos do Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae).
Todo esse contaminante oleoso foi carreado para o córrego Candidópolis, afluente do manancial da Pureza, em cuja ETA, que sem controle de qualidade, seguiu para as torneiras da maior parte das residências itabiranas, servida à população, quando deveria ter sido tratada, tornando-se livre de contaminantes. Mas não foi o que se viu, como constataram todos os moradores “servidos” por esse sistema de abastecimento do Saae.
A empresa Minax, que está estabelecida clandestinamente no DI sem alvará de funcionamento, foi autuada e multada pela Prefeitura em R$ 11,1 mil, uma insignificância diante do dano causado à população e ao meio ambiente. A multa pode ser elevada em caso de descumprimento das exigências contidas no auto de infração.
O boletim de ocorrência lavrado pela PM Ambiental foi encaminhado ao Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), para que a Curadoria do Meio Ambiente instaure inquérito para apurar todas as responsabilidades no caso, assim com os danos decorrentes dessa contaminação.
Foi dado prazo, já vencido, para Minax retirar todo o óleo derramado no solo no pátio da empresa, que é para deixar de contaminar ainda mais o lençol freático. Terá que comprovar, por meio de notas fiscais, ter encaminhado todo esse material a uma empresa licenciada e credenciada para receber e tratar esse efluente com alto potencial de poluição, como se viu em Itabira.
Análise do caso: responsabilidades
Preliminarmente, pode-se dizer que essa contaminação é uma forma de poluição anunciada, com vazamento já tendo ocorrido na década de 1990, quando uma fábrica de tinturaria de tecidos poluiu o mesmo córrego.
Por sorte foi em pequena quantidade de tinta, sem afetar o abastecimento, mas que deveria ter servido de advertência, sinalizando para que algo mais grave poderia ocorrer, uma vez que o DI foi instalado acima da ETA Pureza, uma irresponsabilidade histórica ainda não sanada.
É que não se tem nesse “parque industrial” um sistema coletivo de tratamento de efluentes, com separadores de água/graxa/óleo. Ou seja, o risco de novas ocorrências é grande, sem que se tenham medidas de controle, como se viu no caso Minax.
Pelo visto a empresa não dispunha nem mesmo de um plano de contigência para situação de emergência como essa. O derramamento deveria ter sido imediatamente comunicado pela Minax aos órgãos ambientais para que fossem tomadas as providências cabíveis, impedindo que essa água contaminada chegasse às residências.
Clandestina
Além disso, é incrível como uma empresa de manutenção mecânica tenha se instalado clandestinamente no DI de Itabira sem que as autoridades municipais tomassem conhecimento.
A consequência foi de extrema gravidade, como grande parte da população pôde sentir. E poderia ter sido evitada caso houvesse fiscalização dos órgãos municipais. Portanto, a SMMA é também corresponsável pelo ocorrido, por não fiscalizar as empresas situadas no DI.
Se assim o fizesse, teria constado que a Minax, além de funcionar clandestinamente, não dispunha sequer de uma caixa separadora de água e óleo.
Em Itabira, a SMMA exige do empreendedor um custoso relatório de impactos ambientais com medidas mitigadoras para aprovar o licenciamento, inclusive pelo Conselho Municipal de Meio Ambiente (Codema).
São exigências por força de lei municipal sem similar na maioria das cidades mineiras, mas que em Itabira ocorre com os licenciamentos classes 1 e 2 para empreendimentos de pequeno potencial poluidor.
A SMMA exige essas modalidades de licenciamento, mas deixa de lado o essencial, que é a fiscalização efetiva de todos os estabelecimentos industriais e comerciais situados no município – e que podem impactar, como foi tristemente e criminosamente comprovado com a poluição do curso d’água pelo óleo derramado.
Se fiscalização ambiental houvesse, a Minax teria sido autuada e fechada por não dispor de caixa separadora de óleo/graxa/água. E também por dispor de licença ambiental.
Além da SMMA, deve também ser responsabilizada a SMDU, por não fazer vistorias periódicas nos estabelecimentos da cidade, sobretudo das “indústrias” instaladas no DI, para saber como anda o uso e ocupação do solo naquele distrito.
Se o fizesse, certamente a empresa Minax teria sido fechada compulsoriamente por não dispor de alvará de funcionamento, documento imprescindível para o estabelecimento de qualquer empresa no município e em qualquer parte do país.
Casa da mãe Joana
É responsável também, subsidiariamente, mas não menos importante, a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Ciências, Tecnologia, Inovação e Turismo (SMDECTIT).
Isso por não vistoriar as empresas que estão instaladas no DI, para saber se elas têm posse legal do imóvel que ocupam, mediante a apresentação de “um plano de negócio”, documento preliminarmente exigível a todas empresas a instalar no distrito industrial, que abriga até mesmo uma garagem de empresa de ônibus.
Se houvesse fiscalização da SMDECTIT constataria que a Minax não detém o direito de uso do terreno que ocupa no DI. “A oficina mecânica que poluiu o manancial da Pureza aluga galpão de outra firma”, informa a nota distribuída pela Prefeitura de Itabira à imprensa itabirana, como se isso fosse algo natural.
Não é. Significa que alguém está ganhando dinheiro indevidamente com uma concessão pública de terreno e que deveria estar cumprindo o “plano de negócio” apresentado para tal ocupação.
Ou seja, o DI de Itabira continua sendo a casa da “mãe Joana”, um balcão de negócios com a conivência da SMDECTIT – e também da Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais (Codemig), que “administra(va)” o distrito de Itabira até recentemente.
Ao longo dos anos, desde que o DI foi instalado no início da década de 1980, a Prefeitura e a Companhia dos Distritos Industriais (CDI), antecessora da Codemig, permitiram livres negociações de terrenos entre empresários que os receberam quase de graça, com o objetivo de se implantar indústrias com os seus “planos de negócios” para diversificar a economia local e gerar empregos.
Pouca coisa disso aconteceu, mesmo com muitos recursos do município, via a Compensação Financeira pela Exploração Mineral (Cfem), sendo emprestados a empresários, muitos até hoje inadimplentes, ou que fizeram o que se chama de dação em pagamento, “devolvendo” galpão industrial à Prefeitura para depois ser repassado à empresa do mesmo grupo empresarial.
Sem controle de qualidade no Saae
Além de tudo isso, há ainda a omissão e a incompetência do Saae: se a água servida na cidade passa por tratamento para eliminar a turbidez, contaminantes, além de clarificação, como é que esse insumo essencial à vida é distribuída contendo óleo à população dos bairros abastecidos pela ETA Pureza?
Com o ocorrido, a dúvida que permanece é se o tratamento da água servida em Itabira tem sido eficiente, tamanha são as recorrências com outras contaminações, inclusive por excesso de ferro e manganês.
É preciso que o Saae esclareça como é feito esse tratamento, assim como comprovar a sua eficácia, inclusive por meio de uma auditoria independente. É o que deve ser exigido pelo MPMG, no bojo do inquérito civil público instalado pela Curadoria do Meio Ambiente.
Rio Tanque urgente
Por fim, é preciso também cobrar celeridade na execução da transposição da água do rio Tanque por parte da mineradora Vale, que é para resolver esse crônico problema de desabastecimento na cidade.
Depois de tanta protelação pela mineradora, que detém o quase monopólio das outorgas de água superficial e subterrânea na cidade, ainda assim, mesmo com toda urgência, o cronograma do TAC firmado com o MPMG só prevê a conclusão dessa transposição para 2026.
É muito tempo para solução e cumprimento de uma condicionante ambiental que se arrasta pelo menos desde o início deste século. E é extremamente moroso diante da necessidade premente de se ter um abastecimento público em quantidade suficiente, inclusive com sobra para atrair novas indústrias que não sejam poluidoras
Em Itabira ocorre uma inversão do que está no Código das Águas, que prioriza, em situações de escassez, o abastecimento público seguido da dessedentação de animas, para só depois atender à demanda da agricultura e da indústria, o que inclui a mineração.
No município de Itabira, água de classe especial é usada para lavar minério de ferro (concentração) e para “apagar” poeira da mineração, enquanto a população consome água turva de mananciais poluídos, com caro tratamento que agora é colocado em xeque depois que o Saae serviu essa “água” à população mesmo estando contaminada por óleo.
Para saber mais sobre a captação de água no rio Tanque acesse:
Os nomes dos donos da empresa criminosa….
É muito estranha essa cidade, pois há a fiscalização de Posturas Municipais, a fiscalização do Meio Ambiente, a própria Secretaria de Desenvolvimento Econômico deveria manter a rotina de sempre algum funcionário percorrer o Distrito Industrial e temos também a fiscalização da Secretaria Estadual de Fazenda que adora cobrar e com multas o tal do ICMS, enquanto ele ainda existe.
A respeito da água de consumo dos moradores da cidade, o ridículo passa quando a mineradora determina quando ela quer repor a água potável, fica a bel prazer dela e contrariando o acordo que assinou com o Ministério Público e a Prefeitura Municipal de Itabira.
Ô terra que só tem japonês, como dizia meu saudoso pai, afirmando que itabirano só fica amarelo e não envermelha nunca!
Gostaria de saber de todos os envolvidos quem vai pagar a limpeza das caixas d’água que foram atingidas por esse crime? Quem pagará? O SAAE, a SMDU, a SMMA, ou a Minax, empresa que poluiu o sistema da pureza? Também gostaria de saber dos órgãos competentes porque não forneceram água mineral para a população? Faltou o quê? Compromisso? Isso também é omissão. O que diz o ministério público? Antes do acontecido liguei para o SAAE informando que havia problemas com a rede de abastecimento de água no meu bairro e sabem o que eles responderam? Que estavam fazendo limpeza nos reservatórios e que era normal ocorrer a presença de barro nas águas servidas. Isso é uma desculpa esfarrapada, uma vergonha!
Como já havia comentado com o editor do viladeutopia não dá mais essa conversa fiada de entra governo e sai governo e do eterno blá-blá-blá da VALE ( antiga CVRD – Rio Doce, lembram-se) fazer isto e aquilo, gato e sapato com a cidade de Itabira.
Sua matéria caro editor não menciona que tal empresa, clandestina prestava serviços a VALE.
Como já disse , você sabe quem:
” O rioi é doce a VALE é amarga”.
Muito boa a reportagem, que mostra a falta de fiscalização da Prefeitura, mas também do quanto esse distrito induistrial nada contribui para a diversificação econômica no município de Itabira, totalmente dependente da mineradora Vale, que certamente foi quem contratou essa empresa “clandestina” que poluiu a Pureza.
Aguardo o desfecho dessa história, pois responsáveis diretos e indiretos devem ser processados e punidos na forma da lei. Interessante também seria se a prefeitura, ou mesmo a reportagem, desse os nomes dos proprietários dessa empresa que causu tanto mal à população de Itabira, que já sofre com a constante poeria da Vale e com a falta d’água, que, como demonstrou a reportagem, está quase toda sob o monopólio da poderosa Vale S.A
Carlos Rocha d’Angelis
Omissão de todas as partes. Empresas que não se submetem ao alvará não passam por licenciamento ambiental. E as da zona rural, como as carvoarias, por exemplo, que além de poluir colocam em risco os que trafegam na rodovia. Quem fiscaliza as carvoarias?
Segundo levantamentos,a população usufrui somente de 1% da água tratada,não só Itabira,mas em todo Brasil,os outros 99% são usados pelas indústrias,digamos assim,uso totalmente inadequado da água tratada de alto custo.A renda do município é inversamente proporcional ao gasto com saneamento básico,por isso que é chamado de Básico! Parabéns ao autor dessa excelente Matéria!