Codecon nega empréstimo, mas Banco do Povo pode ser salvo pela cultura

Tudo parecia conspirar contra a Associação de Crédito Popular de Itabira, mais conhecida pela alcunha Banco do Povo. Sem sucesso, o seu presidente, João Tôrres Moreira Júnior já havia percorrido gabinetes do terceiro andar da Prefeitura sem conseguir o aval necessário para obter novo aporte de R$ 150 mil para saldar as dívidas de cerca de R$ 65 mil – a maior parte com a única funcionária, que está sem receber há um ano – e dar prosseguimento à política de abertura de crédito aos microempreendedores.

João Tôrres, presidente do Banco do Povo, ainda tem esperança de salvar a instituição de crédito popular (Fotos: Carlos Cruz)

A porta para que houvesse esse aporte de capital, necessário para o prosseguimento do banco, parecia ter sido fechada a sete chaves depois de ter sido reprovado (leia aqui), pelo Conselho Municipal de Desenvolvimento Econômico (Codecon), o plano de negócio apresentado pela instituição de crédito popular.  A alegação foi que o plano apresentava “inconsistência dos dados contábeis”, o que justificou a reprovação do empréstimo por unanimidade, na reunião de 10 de abril.

Luz no fim do túnel

Para decidir o destino do Banco do Povo, na assembleia de sexta-feira (15) surgiu uma luz no túnel com a proposta apresentada pelo presidente do Conselho Municipal de Política Cultural (CMPC), Marcelino de Castro. Ele vê como missão da instituição financiar a economia criativa no município, principalmente com recursos que, por lei, devem ser destinados para a área cultural.

Marcelino de Castro, presidente do CMPC, vê saída no financiamento da economia criativa

Para isso, defendeu, basta que o prefeito Ronaldo Magalhães (PTB) cumpra o que está disposto na lei municipal que criou o Sistema Municipal de Cultura, pelo qual, o percentual de 1% do orçamento anual da Prefeitura deve ser destinado à Fundação Cultural Carlos Drummond de Andrade.

Essa, por sua vez, deve repassar 1% desse mesmo orçamento para o Fundo Municipal de Cultura. “Esses recursos equivalem a cerca de R$ 5 milhões anuais e não estão sendo repassados”, lamentou e cobrou o presidente do CMPC.

De acordo com ele, para gerenciar esses recursos, a FCCDA vai ter de contratar um agente financeiro. “Parte desses recursos é reembolsável e pode ser administrado e emprestado aos agentes culturais pelo Banco do Povo, que receberá por isso como qualquer outra instituição de crédito”, propôs.

Além disso, informou o presidente do CMPC, o governo federal sancionou a lei de apoio aos arranjos produtivos locais. Segundo Marcelino, será disponibilizada uma linha de crédito da ordem de R$ 20 milhões para esse fim. “Está aí outra fonte de recursos para o Banco do Povo administrar como meio de fomentar os arranjos produtivos locais”, sugeriu. “A diversificação da economia de Itabira passa pela cultura”, defendeu.

Fila de desempregados na porta do Sine: clientes potenciais do Banco do Povo

Uma comissão foi formada para, mais uma vez, tentar negociar com o governo municipal uma saída para a continuidade do Banco do Povo. A expectativa é que o bom senso prevaleça e que essa importante instituição de crédito popular volte a operar no município. Para isso, precisa ter gerenciamento eficaz, e uma política de crédito que privilegie os pequenos empreendedores em todos os segmentos da economia criativa. E rever os juros cobrados, hoje de 3,5%, que nada têm de subsidiados.

Pá de cal

Izeni Cabral defende o papel social da instituição de crédito popular

Caso seja reprovado o aporte de recursos necessários para a continuidade da instituição de crédito popular, será colocada uma “pá de cal” nas pretensões de prosseguir com a instituição, por não ser lucrativa, segundo os conselheiros do Codecon.

Isso em uma conjuntura de desemprego em massa, quando a chamada economia criativa, cuja base são os pequenos empreendedores, se apresenta como saída para amenizar as condições de vida dos chamados “hipossuficientes”, que são os que mais sofrem com a crise.

Sem ainda ver saída para dar a continuidade às suas atividades, o fechamento do Banco do Povo já estava delineado para ocorrer na assembleia dos instituidores, na sexta-feira. “Se a Prefeitura não vai colaborar e os inadimplentes, que são amigos de políticos, não quitam as suas dívidas, não vejo outra saída que não seja a de fechar o Banco do Povo”, disse a comerciante Izeni Cabral, representante da Comissão Municipal de Emprego. “O que é uma pena (o fechamento). O banco desempenha uma função social importante.”

Inadimplência pode ser revertida, diz representante da OAB

Maria Nicolau vê uma minoria inadimplente prejudicar a maioria que paga em dia

A inadimplência nominal dos devedores do Banco do Povo é de R$ 250 mil, o que, em valores corrigidos pelo salário mínimo, salta para R$ 750 mil. Pelo De acordo com relatório apresentado na assembleia, esse montante é devido por 11 tomadores de empréstimos, de um total de 1.046 micros empreendedores que fizeram empréstimos – e saldaram as suas dívidas.

“Essa minoria está prejudicando a maioria que quitou os seus débitos”, lamentou a representante do Clube de Mães, Maria Nicolau Costa. Quando é o pobre que deve, eles pegam gato, cachorro, o que tiver para pagar. Já com pessoas que têm condições de pagar, ficam enrolando. Deixam a funcionária sem salário e sem recursos para emprestar para o pobre”, protestou, traduzindo o sentimento da maioria dos representantes dos instituidores do banco.

Ronaldo Caldeira, da OAB (ao centro), vê saída jurídica para cobrar dos inadimplentes

Embora a maior parte dessa dívida com o banco possa estar prescrita, como ocorreu também com uma grande quantia dos recursos emprestados pelo Fundesi a empresários, o advogado Ronaldo Caldeira, representante da Ordem dos Advogados (OAB), subseção de Itabira, acredita que ainda é possível rever o que é devido.

Segundo ele, pelo novo Código de Processo Civil podem ser abertas ações de não cumprimento contra os devedores que têm patrimônios. “Essas ações não prescrevem”, assegurou. “Trata-se de pedir o ressarcimento por ter havido enriquecimento ilícito. Esses devedores usaram dinheiro do Banco do Povo para enriquecer e não pagaram”, explicou. “Se o devedor tiver lastro (recursos), podem ser bloqueados até 30% de seu salário para o pagamento da dívida.”

Fundesi e os maus pagadores

Conselheiros do Codecon desaprovam plano de negócios do Banco do Povo, recusando socorro para continuidade da instituição de crédito popular

A ação de cobrança por enriquecimento ilícito pode ser também necessária para a Prefeitura reaver parte dos recursos emprestados a empresários inadimplentes com o Fundesi.

É fato que muitos se enriqueceram ilicitamente às custas do erário municipal, prejudicando a política de diversificação econômica do município, ainda hoje extremamente dependente da mineração.

Em ambos os casos, no caso de prevalecer a prescrição das dívidas, que os nomes dos devedores sejam divulgados amplamente, para conhecimento do público de quem anda lesando o erário municipal. Afinal, tanto o capital do Banco do Povo como os recursos emprestados pelo Fundesi saíram da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais, os chamados royalties pela exaustão do minério de ferro.

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