Vale já faz censo de moradores que devem ser removidos nos bairros Bela Vista e Nova Vista, diz procurador de Justiça. Mineradora não confirma
Conforme antecipou este site Vila de Utopia, a mineradora Vale vai mesmo ter de remover parte de moradores dos bairros Bela Vista e Nova Vista, que é para construir um dos dois muros de contenção como parte das obras de descomissionamento de diques na barragem do Pontal.
As informações sobre essas obras foram apresentadas pelo engenheiro Vicente Mello, da Aecom, empresa de consultoria, na reunião virtual realizada pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) com ativistas do Comitê Popular dos Atingidos pela Mineração em Itabira e Região, no dia 30 de março. Leia mais aqui, aqui e aqui.
Já na reunião on line nessa terça-feira (27) com os mesmos procuradores do MPMG, ativistas do Comitê Popular divulgaram ofício do procurador-geral de Justiça de Minas Gerais, Jarbas Soares Júnior, confirmando que a Vale deve mesmo fazer essa remoção de moradores. O ofício foi em resposta à solicitação do gabinete da deputada federal Áurea Carolina (PSOL).
Segundo o procurador-geral do MPMG, desde janeiro deste ano a Vale teria comunicado que, na segunda fase das obras de descomissionamento, está “estimada a remoção definitiva de cidadãos residentes em 300 unidades imobiliárias e a remoção temporária de cidadãos residentes em 68 unidades imobiliárias, localizadas nos bairros Bela Vista e Nova Vista”.
Na mesma correspondência, o procurador Jarbas Soares informa ainda que a empresa já está realizando pesquisa “para o censo dos moradores das regiões possivelmente impactadas pela segunda fase da construção, devendo o cadastro ser concluído até 30 de abril do corrente ano”.
Sem novidades
Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa da mineradora Vale não confirma a realização do censo entre os moradores. Diz apenas que não há novidades em relação ao que já havia sido informado anteriormente a este site.
Foi quando informou que tem realizado reuniões periódicas com representantes do Ministério Público acerca da descaracterização de diques construídos pelo método à montante em Itabira.
“As reuniões envolvem a análise de metodologias e estudos para implantação de medidas de segurança na região, antes do início das intervenções nos diques.”
E acrescenta: “O programa de descaracterização de estruturas a montante em Itabira teve início no segundo semestre do ano passado, com o objetivo de aumentar a segurança das comunidades onde a Vale atua. Em dezembro, foi concluída a descaracterização do dique Rio do Peixe.”
Estruturas com cortinas de tubos metálicos serão construídas no Pontal, informa a mineradora ao MPMG
Entretanto, para a Procuradoria-Geral de Justiça a Vale prestou mais informações, sobre as quais os moradores deveriam ter sido os primeiros informados – mas que até estão sendo os últimos a saber.
“Em janeiro de 2021 a empresa Vale apresentou a intenção de construir duas estruturas de contenção (ECJ – Estrutura de Contenção a Jusante), utilizando a técnica de cortinas de tubos metálicos preenchidos com concreto, para descaracterização dos diques Minervino e Cordão Nova Vista.”, é o que também informa o procurador-geral do MPMG em ofício encaminhado ao gabinete da deputada Áurea Carolina.
De acordo com o que informou a Vale ao procurador, a construção dessas estruturas de contenção está dividida em duas fases. Para a primeira fase a Vale informa que não há previsão de remoção de atingidos, o que só deve ocorrer na segunda fase.
“Registra-se, ainda, que o projeto de construção das ECJ’s foi submetido à análise técnica de engenharia da empresa de auditoria ambiental independente Aecom, que apresentou informações detalhadas das referidas fases do projeto, as quais corroboram os esclarecimentos ora expostos”, frisa o procurador-geral em sua correspondência à deputada do PSOL.
“Sob essa perspectiva, para além dos casos em que há necessidade de remoção de atingidos, as obras de construção das ECJ´s têm claro potencial para gerar impactos socioeconômicos negativos sobre as comunidades dos bairros Bela Vista, Vista Nova e Praia”, frisa o procurador-geral.
Com relação aos moradores do bairro Praia, segundo o engenheiro Vicente Mello, da Aecom, eles não terão de ser removidos. É que o projeto prevê a construção de dois grandes muros, de tecnologia japonesa, a ser edificado em duas fases, sendo que a primeira será na região da lagoa do Coqueirinho, dentro da propriedade da mineradora.
“Nesse caso, não haverá necessidade de remoção de moradores, como também não será necessário no bairro Praia”, contou o engenheiro da Aecom. “A remoção de moradores será necessária para a construção do muro que segue pelo cordão em direção ao Minervino”, acrescentou.
Acompanhamento
O procurador-geral informa ainda que, além dos procedimentos administrativos já instaurados pela 2ª Promotoria de Justiça de Itabira, a Coordenadoria de Inclusão e Mobilização Sociais do Ministério Público de Minas Gerais (Cimos) também acompanhará essa remoção de moradores.
“O objetivo é exigir e fiscalizar, no caso concreto, a aplicação da Política Estadual dos Atingidos por Barragem, prevista na Lei Estadual n.º 23.795/21”, assegura o procurador-geral, reafirmando na correspondência à deputada Áurea Carolina o compromisso do MPMG “com o contínuo acompanhamento dos impactos socioambientais inerentes à atividade minerária e com a defesa dos atingidos.”
Consultoria
A promotora Giuliana Talamoni Fonoff, da 2ª Promotoria de Justiça de Itabira, coordenadora do Meio Ambiente na Comarca, comprometeu-se, mais uma vez, a propor reunião da Vale com os moradores para esclarecer todas as dúvidas e prestar as informações necessárias.
“Nosso trabalho é no sentido de acompanhar esse processo, juntamente com a auditoria externa independente a ser contratada, não necessariamente a Aecom, mas pode ser ela, para que os moradores tenham conhecimento das ações e todas as dúvidas dos moradores sejam esclarecidas”, disse a promotora na reunião virtual com os ativistas e moradores.
A Coordenadoria de Inclusão e Mobilização Sociais (Cimos), do MPMG, também vai acompanhar o processo de remoção. Para isso, deve fiscalizar não somente as ações da Vale, como também dos órgãos públicos responsáveis pelo acompanhamento, tais como Defesa Civil, Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente, além do próprio Estado de Minas Gerais (órgãos ambientais).
“Estaremos ao lado dos atingidos para que sejam assegurados os direitos humanos e também o direito a um meio ambiente equilibrado”, comprometeu-se, mais uma vez, o promotor Marcelo Mata Machado, da Curadoria de Mobilização Social do MPMG.
“Se durante o processo não sair uma solução de consenso, vamos recorrer ao judiciário para garantir os direitos dos moradores, fiscalizando e exigindo o cumprimento do que está na lei”, disse Mata Machado na reunião virtual com moradores.
Audiência
O Comitê Popular dos Atingidos cobrou a realização de uma audiência pública para a empresa esclarecer as dúvidas e informar à população. Entretanto, segundo a promotora Giuliana Fonoff, no caso de estruturas a jusante, a legislação não exige licença prévia ambiental.
“O MPMG propôs ação civil contra o Estado de Minas Gerais para que seja exigida a audiência pública também nesses casos. Já existe liminar determinando o licenciamento, mas houve recurso e a ação ainda está tramitando na Justiça.”
Entretanto, como instrumento democrático para se ouvir e informar a população, a audiência pública pode ocorrer também por iniciativa da própria empresa.
A sua realização seria um sinal claro de que a Vale quer mesmo dialogar com a sociedade itabirana, por meio de seus diferentes segmentos sociais – e não apenas com o poder público e entidades empresariais.
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