“Sovê basse lafar guinlagem do camaco?

No destaque, alunos da Oficina de Guinlagem do Camaco para Iniciantes e convidados especiais, cantando Orada (Odara) de Taecano Levoso (Caetano Veloso).

Nana Mendonça

Essa é a pergunta que todes fazem pra quem quer aprender a linguagem de macaco, que é originária de Itabira. É quase um rito – repetir o som das palavras cadenciando ritmo e melodia, como quem indaga na espera de uma resposta positiva: “lafo midiais!”

Mas falar em camaco é ainda um nicho de poucos itabiranos falantes, ou melhor dizendo, comunicadores. Como qualquer linguagem oral, falar em guinlagem é mais que traduzir palavras e significados.

As palavras tem som, ritmo, métrica e respiram pulsantes a cada vírgula e ponto. A cada frase em camaco uma melodia se faz presente e, ainda que a nível inconsciente para a maioria de nós, criamos música enquanto dialogamos em camaco também.

O grande músico, multi-instrumentista e compositor Hermeto Pascoal, em seu disco a Festa dos Deuses, de 1992 (Philips), avocado pelo discurso do então candidato à presidência da república Fernando Collor de Melo, traduziu em música seu famoso discurso Pensamento Positivo.

O Bruxo, como Hermeto é chamado popularmente, e sua capacidade de transformar em música qualquer dado sonoro e criar sobre todos os parâmetros do som – altura, timbre, intensidade, duração, etc – reproduziu a melodia de cada palavra de Collor “organizando” em frases musicais, como que interpretando a melodia de sua fala.

Algum tempo depois Collor foi impichado e seu discurso, ainda que falacioso, ficou eternizado na música de Hermeto Pascoal e seu álbum Festa dos Deuses lhe rendeu o prêmio de melhor disco instrumental do ano e uma turnê pela Europa.

Você pode se perguntar, o que a música tem a ver com a Guinlagem do Camaco? E minha resposta será: tudo.

Quando falamos em Guinlagem do Camaco reproduzimos o fonema das palavras exatamente como elas são pronunciadas normalmente – seu som, acentos, articulações e (na maioria das vezes) métrica – mantemos a tonicidade sem alterar as acentuações das sílabas.

Por isso ensinar línguas através de músicas é um método de aprendizagem tão eficiente – porque memorizamos o som (fonema) das palavras e não necessariamente o seu significado ou a maneira como as escrevemos – e não seria diferente para ensinar guinlagem do camaco.

É preciso fazer com que o itabirano se aproprie da guinlagem do camaco, compreenda seu valor simbólico de resistência e aprenda a contar sua própria história a partir das suas experiências, ocupando seu lugar de fala e protagonismo.

Cantar em camaco pode ser um bom facilitador de aprendizado para aqueles iniciantes em guinlagem – com traduções mais simples e de fácil assimilação fonética – ou mesmo recitar poemas e frases em camaco.

Para quem quiser se aventurar a cantar em Camaco, no domingo (17) aconteceu o lançamento do vídeo Orada, dos alunos participantes da Oficina Guinlagem do Camaco para iniciantes, que ministrei durante o 47º festival de inverno de Itabira a convite da FCCDA.

O vídeo é uma montagem dos alunos juntamente com alguns convidados, cantando a canção Odara de Caetano Veloso, cantada em camaco.

O vídeo está disponível no Youtube e pode ser acessado pelo link:

https://www.youtube.com/watch?v=OPEyTsaMz3M

Mavos lafar guinlagem do camaco?

Para saber mais sobre a linguagem de macaco, essa manifestação de resistência cultural dos itabiranos, acesse também aqui Linguagem de Camaco, aquilombamento linguístico: uma invenção de resistência dos itabiranos

 

 

 

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