Série: um poeta & um teórico na caixa de fósforos
Capítulo 3
Caixa aberta a novas experimentações
reginà guerra
Na primeira vez em que ajudei o Marcelo a montar HAICAIXAS fiquei muito impressionada com a ordem sequencial em que eram colocados os haicais. Todos os 100 haicais meticulosamente cortados eram colocados enfileirados na perfeita ordem inversa na mesa.
O primeiro haicai que ia para o fundo da caixa era o 100 e assim, sucessivamente, até o número 1. Por cima do haicai número 1, a folha de rosto com os dados da edição.
Eu que tinha uma HAICAIXA, presente do Marcelo em 2006, não sabia dessa ordem. Minha HAICAIXA ficava na mesa de centro da sala e eu a abria tirando um haicai ao acaso, como um pequeno oráculo, inspiração para aquele momento. E o haicai voltava para um novo lugar na HAICAIXA.
E era essa a ideia do Marcelo: um conceito dentro da HAICAIXA, obra aberta. Conceito desenvolvido pelo Umberto Eco que considera o leitor/espectador como criador da obra de arte; a recepção da obra sendo parte dela. Talvez a poesia seja a arte mais aberta: o leitor pode viajar/imaginar inúmeros sentidos a partir das sugestões do poema.
A HAICAIXA amplia, potencia esse conceito ao permitir que o leitor monte sua própria sequência, sem estar preso a uma página do livro. Os haicais não mostram marcação numérica: não é mais possível recriar a ordem exata do poeta. Nasce assim uma nova sequência feita das preferências do leitor ou pelo acaso.
Apresento aqui minha sequência dos três primeiros haicais:
*
um amigo:
a metade de tudo
mais o perigo.
*
Sétimo céu # 2
perto de ti
céu de março
o que vivi perdi
*
solidão: a chuva
só cai
em sua sombrinha