Raquell Guimarães diz em entrevista a Luiz Nassif que o Brasil prende a pobreza e protege o poder
Foto: Reprodução/ CGN
Estilista e primeira-dama de Itabira defende a ressocialização como caminho para a segurança pública e denuncia o encarceramento em massa de jovens pobres e periféricos no Brasil
Em entrevista ao jornalista Luiz Nassif, publicada no Jornal GGN, a estilista e empresária Raquell Guimarães, primeira-dama de Itabira, compartilhou sua experiência de quase duas décadas atuando dentro do sistema prisional brasileiro.
Desde 2007, ela mantém oficinas de costura em unidades penitenciárias, oferecendo trabalho, qualificação e dignidade a pessoas privadas de liberdade por meio de sua marca @doiselles.
“Estar onde poucos foram e as minorias estão. Trazer para onde a maioria vive um conceito de justiça e transparência com os recursos materiais e humanos”, define Raquell, que iniciou sua trajetória quando o tema da ressocialização ainda era tabu no país.
Ressocializar é devolver humanidade
Hoje, seu projeto está presente em unidades da Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (Apac), modelo prisional criado em Minas Gerais, sem presença policial e baseado na confiança, voluntariado e autonomia do preso. “A Apac é um sonho dourado. É a única metodologia que realmente oferece chance de ressocialização”, afirma.
Raquell critica o sistema penal tradicional, que, segundo ela, “brutaliza o sentenciado e apaga sua porção humana”. “Na APAC, entra o homem, o delito fica do lado de fora. O trabalho remunera, dá status dentro do sistema. É o orgulho de dizer à família que está produzindo algo que não é o crime.”
O centro de reintegração social da Apac em Itabira, onde a primeira-dama atua, foi inaugurado em 16 de outubro de 2020, resultado de uma mobilização social buscando humanizar o sistema carcerário existente em Itabira, que tinha o pior exemplo na cadeia pública na rua Paulo Pereira, um dos mais degradantes exemplos de como não se deve vigiar e punir o condenado.

O colapso do sistema e a raiz da violência
Na entrevista, Raquell aponta a mudança na Lei de Drogas de 2006 como um dos principais motores do encarceramento em massa. “Ela prende o peixinho e deixa o tubarão nadando livre. O sistema pune a pobreza e protege o poder”, denuncia.
Para ela, o ciclo da violência começa muito antes da repressão. “Com 11 anos, o menino já está soltando foguete para avisar da chegada da polícia. Com 14, segura o fuzil. Com 18, é preso. A expectativa de vida dele é de 21 anos. É uma loucura.”
Nesse contexto, Raquell defende que o papel das prefeituras é fundamental. “Cabe aos municípios garantir escola em tempo integral, esporte, lazer, saúde pública. É impedir que esse jovem se seduza por essa vida de guerra.”
Conexão com Itabira e o debate sobre o novo presídio
A atuação de Raquell Guimarães ganha ainda mais relevância diante do impasse sobre a construção de um novo presídio em Itabira, uma vez que o que existia no Rio de Peixe foi fechado por se encontrar em Zona de Autossalvamento (ZAS), pela proximidade com a barragem Itabiruçu, da mineradora Vale.
Seu marido, o prefeito Marco Antônio Lage (PSB), tem defendido um modelo de unidade prisional menor, com foco na ressocialização, na dignidade do apenado e na proximidade familiar, em oposição à proposta estadual de um presídio de grande porte, que poderia abrigar até 1,8 mil detentos.
A ausência de uma unidade prisional na cidade tem gerado impactos recorrentes. A Polícia Civil, por exemplo, tem enfrentado desvio de função, dedicando tempo e recursos ao transporte de presos para outras comarcas, o que compromete o trabalho investigativo e sobrecarrega a estrutura local.
Já os familiares dos detentos, em sua maioria moradores de bairros periféricos, precisam se deslocar por longas distâncias para visitar seus parentes encarcerados, arcando com custos elevados e enfrentando barreiras logísticas e emocionais.
Nesse contexto, a experiência de Raquell dentro do sistema carcerário reforça a visão de que segurança pública se constrói com oportunidade, não com encarceramento em massa.
Sua trajetória é um contraponto necessário ao discurso punitivista e uma inspiração para políticas públicas mais humanas, eficazes e conectadas à realidade social das famílias afetadas pela prisão.
Assista:










Que maravilha ter uma primeira dama com lucidez e projetos sociais próprios!
Após ler a reportagem e a entrevista, entendi por que tantas pessoas torcem o nariz para a atuação da primeira-dama Raquell Guimarães, de Itabira. Assim como Janja, primeira-dama nacional, Raquell é uma mulher empoderada, engajada, conectada com seu tempo e profundamente comprometida com causas sociais, especialmente com a ressocialização de quem mais precisa. Sua postura firme e solidária incomoda quem ainda não está pronto para ver mulheres ocupando espaços de protagonismo com coragem e sensibilidade. Parabéns, Raquell, por ser exemplo de liderança e humanidade.
Márcia Ribeiro Labiack Moreira