Prefeitura vai reformar a avenida Machado de Assis. Vereadores temem perda de garantia por falta de relatório técnico comprovando erros
Carlos Cruz
A sessão ordinária de terça-feira (7) da Câmara Municipal de Itabira seguia modorrenta, com vereadores apresentando os indefectíveis projetos de concessão de títulos honoríficos de cidadania itabirana até mesmo para quem andava negando a pandemia e as medidas de proteção, como o uso de máscara, mas foi só o vereador Robertinho “da Autoescola” Araújo (MDB) levantar a questão da avenida Machado de Assis para atiçar lenha na fogueira.
Ele quis saber quando estará concluída a reforma da avenida Machado de Assis, oficialmente chamada Integração, por interligar as regiões dos bairros João XXIII e Gabiroba. Faltou perguntar quem vai pagar a conta.
É grande o risco de o povo pagar a conta da reforma dessa avenida, que ainda está no prazo de garantia, executada e concluída no final da administração passada, pela existência de falhas e omissões de serviços essenciais no seu projeto executivo.
Malversação
Inaugurada na última hora permitida pelo calendário eleitoral de 2020 – por isso mesmo designada pela bancada situacionista na Câmara, e pelo próprio prefeito Marco Antônio Lage (PSB), como sendo obra eleitoreira, ninguém nega a sua importância por interligar duas regiões densamente populosas. A avenida custou aos cofres públicos a bagatela de R$ 41,5 milhões.
O questionamento do vereador Robertinho foi o bastante para o tema dominar o pinga-fogo, espaço democrático da sessão legislativa que os edis itabiranos hoje chamam de “palavra-aberta”. As narrativas abordaram o controverso tema, classificando a situação da “interditada” avenida como “escândalo”, pela malversação do dinheiro público e “irresponsabilidades da administração passada”.
Ou como “cortina de fumaça” para desviar a atenção da opinião pública daquilo que a oposição chama de falta de gestão da atual administração municipal.
Perda de garantia
O pior é que o povo pode pagar pelo “conserto” da avenida, mesmo estando ainda vigente o prazo legal de garantia da obra.
Conforme alertou o próprio vice-líder do governo na Câmara, vereador Bernardo Rosa (Avante), se o prefeito der início à reforma sem que se tenha a culpabilidade comprovada das falhas estruturais, isso pode acarretar na perda da garantia da obra, que é de cinco anos.
Sem essa responsabilidade apurada, “vai ser um jogo de empurra, com fulano dizendo que a culpa é de beltrano e esse dizendo que é de fulano.”
Com o vice-líder concorda o vereador Reinaldo Lacerda (PSDB), que questiona a validade do laudo técnico apresentado pelo vereador Marcelino Freitas Guedes (PSB), da bancada situacionista.
Para ele, não se trata de um documento válido, por ser apócrifo. “É preciso ter um relatório assinado pelo responsável técnico pela sua realização”, defende.
Ou até mesmo uma perícia judicial, acrescenta o vice-líder, o que, nesse caso, pode levar décadas até que se tenha uma decisão – e a população operária que reside nessa densa região, principal usuária da avenida, mesmo sem ciclovia, não pode esperar.
Falhas estruturais
Marcelino Guedes fez um relato circunstanciado das falhas estruturais existentes na avenida por erro da administração passada.
“A empresa que executou a obra, a Terramil, se esquiva da responsabilidade. Alega ter alertado a Prefeitura da existência dessas falhas, como as ausências de drenos profundos e superficiais que não constavam do projeto executivo.”
Essa alegação da construtora, que pode levar à perda de garantia, segundo o mesmo vereador, foi confirmada pela Geoconsult Engenharia, responsável pela elaboração do projeto executivo.
É que ítens essenciais à garantia da qualidade da avenida foram suprimidos, mesmo tendo os gestores municipais sido alertados que eram imprescindíveis para a conservação da obra. Sem esses itens, o asfalto da avenida “esfarinhou” com pouco tempo de tráfego, pois sem dreno, a água “detonou” a pavimentação em vários trechos.
Como os recursos saíram de sucessivos empréstimos contraídos pela administração passada junto ao Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), e também com a Caixa Econômica Federal (CEF), por envolver recursos da União, cabe até mesmo investigação da Polícia Federal, a exemplo do que ocorreu com a construção da Estação de Tratamento de Esgoto do Laboriaux, financiada pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
O prefeito já encaminhou denúncia ao Ministério Público de Minas Gerais e determinou à Procuradoria-Geral que ingresse com ações cível e criminal para apurar as responsabilidades da empresa que executou o projeto e dos antigos gestores da obra.
Convocação
O presidente da Câmara, vereador Weverton “Vetão” Andrade (PSB), também concorda que há mesmo esse risco de se perder a garantia da obra com a reforma da avenida sendo iniciada sem um relatório técnico comprovando as falhas estruturais e as responsabilidades.
“O povo não pode pagar duas vezes pela mesma obra. É preciso ter esse relatório assinado por um responsável técnico”, avalizou.
“Concordo com Reinaldo quando ele pede a convocação do dono da empresa que construiu a avenida para explicar o porquê desses itens essenciais não terem sido executados”, comprometeu-se.
Segundo informou o líder do prefeito, vereador Júber Madeira (PSB), a reforma da avenida com a inclusão dos itens essenciais que não constaram do projeto executivo, terá início já no dia 27 de junho.
“A Prefeitura vai tomar todos os cuidados para não perder essa garantia e buscar as responsabilidades”, afirmou.
“É uma questão séria, grave. Que as responsabilidades sejam apuradas com o encaminhamento das denúncias aos órgãos fiscalizadores”, disse ele, o que já foi feito, em parte, pelo prefeito ao enviar o caso para ser apurado pelo Ministério Público de Minas Gerais, Curadoria do Patrimônio Público.
Cortina de fumaça
Para o vereador Neidson Freitas (MDB), se houve mesmo essa falha e negligência, que as responsabilidades sejam apuradas. “O ouvinte (que acompanha a reunião da Câmara pelas emissoras de rádio) deve estar achando que acabou a avenida, que tudo se pôs perder”, disse ele.
“Não é bem assim. A avenida está lá e precisa de uma manutenção cara, mas que é possível de ser feita”, sustentou. “Para apurar as responsabilidades existem os órgãos de controle.”
Segundo ele, a denúncia do “escândalo” da avenida Machado de Assis não passa de uma “cortina de fumaça” para esconder a incompetência da atual administração.
“Marco Antônio está morrendo de medo de entrar para a história como o pior prefeito de Itabira. Essa narrativa de que a cidade está arrasada, que nada do que foi feito pelas administrações passadas presta, serve para esconder a sua própria incompetência administrativa, a sua falta de gestão”, sustentou o oposicionista no pinga-fogo da Câmara.
Ele propôs aos vereadores investigarem também o excessivo número de consultorias que a Prefeitura tem contratado, sem o devido processo licitatório. “Uma dessas consultorias foi contratada pegando carona numa licitação da cidade de Sinop, do Mato Grosso, para fazer diagnóstico da gestão municipal”, denunciou.
“Na Fundação Cultural estão contratando uma consultoria por R$ 100 mil, de uma empresa cujo capital social é de R$ 2 mil, para fazer um diagnóstico da cultura em Itabira. Outra consultoria é para fazer o diagnóstico do esporte na cidade”, relacionou.
“Precisamos acabar com essa farra de gastos com essas consultorias, com o dinheiro do povo”, propôs o líder da oposição na Câmara, levantando também uma “cortina de fumaça” para desviar a atenção do “escândalo” da Machado de Assis, que é da administração passada da qual Freitas foi dedicado e eficiente líder.
Cadê a fiscalização da obra? Quem assina ou assinou as planilhas da obra? Os cronogramas foram cumpridos? Certa vez respondi sobre um contrato de instalações de mata burros na zona rural de Itabira, e que foi devidamente arquivado pela comprovação por mim apresentada junto ao TCE. Cabe agora fazer o mesmo. Chame o fiscal, o engenheiro e todos os envolvidos e façam uma auditoria completa. Passando pelo projeto até chegar aos responsáveis.