Prefeitura lança Portal do Ar, mas ainda sem divulgar em tempo real os índices da poluição

Carlos Cruz

Desde terça-feira (21) já é possível saber, ainda sem todos os dados, como anda a qualidade do ar na cidade de Itabira. A divulgação ainda não está completa. É que, diferentemente do que foi divulgado, os índices da poluição atmosférica por partículas de minério de ferro em suspensao não estão disponíveis de hora em hora para cada estação, com as 24 medições diárias.

Para não haver dúvidas, a divulgação deve ser feita simultaneamente ao recebimento dos índices, medidos em microgramas por metro cúbico (µg/m³), sem a validação da mineradora Vale, que é a responsável pelo monitoramento.

A publicação dos dados em tempo real é importante para se saber como está a poluição em Itabira no exato momento em que ocorrem episódios críticos, com os parâmetros medidos em cada estação de monitoramento.

Se em alguma estação houver uma ocorrência que possa alterar os dados, como por exemplo, a existência de queimadas ou poeira de construção por perto, esses resultados só devem ser excluídos pela anomalia conjuntural em consenso com os técnicos da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMMA).

Além disso,  mesmo que parciais, os dados não estão atualizados no Portal do Ar – a última medição é de quarta-feira (22).

Mas sem dúvida, a criação do portal é um avanço, embora esteja ainda insuficiente. O portal pode ser acessado aqui: https://meioambiente.itabira.mg.gov.br/custom/cfg_qual_ar.aspx

Juntamente com os dados relativos às partículas totais em suspensão (PTS), PM-10 e PM-2.5, que são partículas mais finas que ficam em suspensão deteriorando a qualidade do ar na cidade, será também publicado no portal um Boletim Interpretativo da Qualidade do Ar.

Vai ser editado por meio de parceria com o Instituto de Ciências Puras e Aplicadas, da Unifei, com participação da professora  Ana Carolina Freitas e estudantes do curso de engenharia ambiental. A proposta editorial do boletim é traduzir os dados apurados para linguagem acessível a todos os interessados.

Leia mais aqui: Parceria entre Prefeitura e Unifei vai interpretar como está a poluição atmosférica em Itabira por meio do Portal do Ar

Fonte: Portal do Ar/SMMA/PMI

Conquista

Desde a administração passada, este site Vila de Utopia tem publicado reportagem cobrando a divulgação dos índices do monitoramento da qualidade do ar em tempo real.

Mas a solicitação, que é de interesse da população, até então não havia sido atendida – e nem mesmo os dados consolidados, validados pela mineradora Vale, que é o principal agente poluidor, eram informados ao site pela SMMA para divulgação.

Ao ser cobrada pela reportagem, a Vale respondeu que, pela condicionante da Licença de Operação Corretiva (LOC), de 2000, cabe à mineradora disponibilizar as informações aos órgãos ambientais de hora em hora, com as 24 medições diárias. São esses dados que devem constar, na íntegra, no portal.

Disse também, por meio de sua assessoria de imprensa, que a divulgação dos dados apurados com o monitoramento é atribuição da Prefeitura e dos órgãos ambientais.

Leia também: Índices da qualidade do ar não são informados em tempo real para a população 

E mais aqui Vale diz adotar medidas necessárias para diminuir a poeira em Itabira

Transparência

Trata-se, portanto, de uma decisão política da Prefeitura, de querer ou não dar transparência às informações, que são cruciais para avaliar a qualidade do ar e o impacto da poluição atmosférica na saúde da população.

Ter acesso a essas informações é um direito constitucional por dizer respeito à qualidade de vida na cidade. Além disso, é preciso que se faça a aferição, por empresa independente, das calibragens dos aparelhos de medição, que é para dar mais confiabilidade aos parâmetros divulgados.

Além disso, o monitoramento só faz sentido para que sejam adotadas as polítcas públicas por parte da Prefeitura, e as de mitigações pela mineradora com base na realidade factual.

Dentre essas políticas, inclui a realização de uma segunda etapa dos estudos epidemiológicos sobre as doenças respiratórias.

“Os estudos epidemiológicos previstos na LOC da Vale precisam ser resgatados. Há muito material disperso e necessitamos retomar esse assunto para que os impactos decorrentes da poluição atmosférica possam ser adequadamente analisados, considerando os novos fatores (PM 2,5) e, também os efeitos da pandemia sobre o sistema respiratório da população”, afirma o secretário municipal de Meio Ambiente, Denes Lott.

Saiba mais aqui Composição da poeira em Itabira começa a ser dissecada e requer estudos mais aprofundados sobre doenças respiratórias

Antecedentes

Desde a década de 1980, a mineradora Vale monitora a qualidade do ar em Itabira. Mas foi somente após a abertura de inquéritos pelo então promotor José Adilson Bevilácqua, em 30 de setembro de 1985, que os índices passaram a ser divulgados mensalmente.

Os inquéritos foram instaurados a partir de reportagens do jornal O Cometa, com base na Lei federal 7.347/85, que trata dos interesses difusos e coletivos da sociedade,

Naquela ocasião, os índices de poeira em suspensão na cidade superaram em 22 vezes o máximo admitido de 240 microgramas por metro cúbico (µg/m³). Esse índice máximo, segundo resolução do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), não pode ser superado mais de uma vez no ano.

A partir dos inquéritos, e das decorrentes ações civis públicas, a mineradora passou a adotar medidas de maior eficácia para conter a poeira.

A principal medida foi a revegetando áreas descobertas, sem cobertura vegetal, que havia sido suprimidas pela atividade minerária. Outras foram a umectação de vias de acesso e pilhas de material estéril não revegetadas. Incluiu, também, o asfaltamento da estrada Cento e Cinco.

Ainda assim, nos momentos críticos de estiagem, essas medidas até hoje têm-se revelado insuficientes. Tanto que neste ano, por superar em pelo menos duas ocasiões o índice máximo de 240 µg/m³, a Vale foi multada pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente por dois episódios críticos ocorridos no mês de julho.

A primeira foi pelo registro da poluição no dia 19 de julho na estação de Chacrinha, com 247,9 µg/m³ – e a segunda no dia 28 na estação do bairro Fênix, com 247 µg/m³.

Leia aqui: Poluição do ar por partículas de minério agrava com as fuligens das queimadas e da usina de ferro-gusa

As multas aplicadas foram, respectivamente, de 650 mil Unidades Padrão Fiscal do Município (UPFM), correspondentes a R$ 2.2 milhões, e de 1,3 milhão de UPFMs, que valem R$ 4,5 milhões, totalizando R$ 6,7 milhões.

Como sempre faz, a Vale recorreu para não pagar as multas. É que a empresa não vê competência da Prefeitura para aplicar essas multas, que seriam atribuições exclusivas dos órgãos ambientais estaduais.

Parâmetros municipais

O conselheiro Francisco Carlos Silva, representante da Interassociação no Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente (Codema), sugeriu na última reunião do órgão ambiental a reedição da resolução municipal de 4 de outubro de 2007, que adota parâmetros da qualidade do ar mais restritivos, com índice máximo admitido de 150 µg/m³ por PTS.

Essa resolução, porém, caducou por ter tido como referência a resolução Conama anterior. É preciso agora se adaptar à resolução nº 49, de novembro de 2018, incluindo os parâmetros para o PM-2.5. Por essa resolução, o índice máximo de PTS admitido continua sendo de 240 µg/m³.

Para a reedição da resolução, o Codema constituiu um grupo de trabalho que terá a incumbência de apresentar uma nova legislação municipal com parâmetros mais restritivos.

O grupo de trabalho contará, também, com a consultoria da professora Ana Carolina Freitas, da Unifei, graduada em Física pela Universidade do Estado de São Paulo (Unesp) e pós-doutora em Ciência da Atmosfera.

E também com a assessoria de técnicos da Secretaria Municipal de Meio Ambiente.

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