Prefeitura de Itabira repudia acusação de superfaturamento de cemitério vertical, contratado sem licitação sob o argumento de patente exclusiva

Imagem do cemitério vertical de Itapevi (SP), semelhante ao que foi contratado pela Prefeitura de Itabira da mesma empresa que detém a sua pantente

Fotos: Agência de Notícas da
Prefeitura de Itapevi

Carlos Cruz

A nova denúncia do vereador Neidson Freitas (MDB), que lidera informalmente a bancada oposicionista no legislativo itabirano, formulada na reunião ordinária dessa terça-feira (25), pode ser uma “marolinha”, mas também pode ser transformada em um tisunami avassalador, com a promessa de mais levantamentos de supostas irregularidades que estariam sendo praticadas na administração municipal, com possíveis favorecimentos, superfaturamentos de obras e serviços contratados com ou sem licitações, ainda que com base na legislação federal.

No novo “caso”, segundo o vereador, a Prefeitura de Itabira contratou sem fazer licitação a instalação de um cemitério vertical, a ser construído em área remanescente do atual e já super ocupado cemitério da Paz, que contará com lóculos (gavetas) e ossuários. É que, de acordo com a defesa da Prefeitura, conta com a melhor e exclusiva tecnologia patenteada no país, daí que a lei faculta a inexigibilidade de realizar concorrência pública.

Freitas discorda. De acordo com ele, a contração sem licitação, a um custo de R$ 9 milhões, da empresa Evolution Tecnologia Funerária Eireli, da cidade do Recife (PE) – e que tem pedido de registro junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), não se enquadrada nos casos em que a legislação faculta a dispensa de licitação. E o que seria mais grave: a contratação pode ter sido superfaturada, com sobrepreço estimado em R$ 735,4 mil.

Para sustentar a suspeição de superfaturamento, o parlamentar oposicionista comparou preços globais e unitários da contração do modelo similar pela prefeitura de Artur Nogueira (SP), que fica na região metropolitana de Campinas, com uma população de 54,8 mil habitantes, distribuída em um território municipal de 178 quilômetros quadrados.

Já a prefeitura de Itabira, com base no pedido de registro apresentado pela Evolution de patente do Sistema Eco No-Leak, já contratado, sustenta que a aquisição corresponde a uma tecnologia exclusiva, daí a condição de inexigibilidade da concorrência pública para a sua contratação.

“Trata-se de um Sistema Integrado de Sepultamento Biosseguro com Controle Inteligente de Estanqueidade e Tratamento de Gases por Dissociação Molecular”, explica a administração municipal em nota encaminhada a esta revista eletrônica.

Além disso, sustenta ainda que essa tecnologia atende à resolução do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) de número 335/2023, onde estão dispostas as diretrizes para o processo de licenciamento ambiental específico de cemitérios verticais.

Neidson contesta essa condição de exclusividade, informando que há outros modelos homologados – e que o simples pedido de registro de patente junto ao INPI não confere ainda ao solicitante o regime de exclusividade – o que seria premissa necessária para que não se faça a licitação para a contratação de obras e serviços públicos, nos termos da legislação.

Para o vereador, o pedido de patente protocolado junto ao INPI, ainda sem ter sido outorgada, não teria o condão da validade, assim como não seria válida a declaração de exclusividade emitida pelo sindicato dos Cemitérios e Crematórios Particulares do Brasil. “Sob o ponto de vista legal, esse documento pode não ter validade”, acredita.

Parecer jurídico

Para sustentar o caráter exclusivo de seu sistema Eco No-Leak, já contratado pela Prefeitura de Itabira, a empresa Evolution apresentou parecer jurídico encomendado ao Escritório de Advocacia Especializada Pezati Parceiros, o qual assegura que a dispensa de licitação, no caso, encontra respaldo legal, não ferindo o que está disposto na Lei 8.666/93.

“Entende-se pela viabilidade e validade da contratação pública, via inexigibilidade, do sistema para sepultamentos em cemitérios verticais, por meio da técnica descrita no pedido de patente de modelo de utilidade n. BR 20 2017 009857 0 U2, cumulada a apresentação dos atestados de exclusividade fornecidos por associações”, é o parecer assinado pela advogada Emanuele Pezati Franco de Moraes. ´

Evidentemente que para o vereador oposicionista, esses argumentos não convencem. Tanto que Neidson Freitas disse que vai encaminhar ao Ministério Público de Minas Gerais e ao Tribunal de Contas de Minas Gerais as documentações que diz dispor em seu gabinete sofre esse affaire político-eleitoral-jurídico que levantou no legislativo itabirano.

“São suspeitas que devem ser apuradas para que sejam confirmadas ou não. Cabe ao executivo se defender. Entendo como oportuna a vinda do Klaus Amann (secretário municipal de Desenvolvimento Urbano, responsável pela contratação) a esta Casa para explicar toda essa situação. Será uma oportunidade para ele esclarecer as nossas dúvidas e outras que podem surgir após minuciosa análise técnica”, convida o vereador.

Alternativas técnicas e modelos diferentes de cemitérios verticais

Cemitério vertical biosseguro de Itapevi, constuído também sem licitação pública pela mesma empresa Evolution, já foi concluído e inaugurado. Foto: Agência Itapevi de Notícias

Freitas diz existirem outros modelos igualmente eficientes no propósito apresentado pela Prefeitura para a dispensa de licitação – e que atendem a todos os requisitos ambientais da resolução Conama que regulamenta as condições para a instalação de cemitérios verticais.

De fato, em uma rápida pesquisa pela internet, descobre-se vários outros modelos similares não somente do ponto de vista técnico, mas também dispondo de diferentes formas de contratação, inclusive por dispensa de licitação específica.

Esse foi o caso da cidade de Itapevi, que tem o primeiro cemitério vertical implantado no estado de Sáo Paulo, tendo para isso optado por um modelo de parceria público-privada (PPP), muito parecido em suas cláusulas, com o que o ex-prefeito Ronaldo Magalhães pretendia implantar na gestão passada como meio de viabilizar a transposição de água do rio Tanque para abastecer a cidade e atrair novas indústrias.

Com as obras iniciadas do parque vertical em Itapevi em 2019, e já concluídas, a Prefeitura local também não precisou fazer licitação específica para a sua instalação.

Optou por abrir licitação, um chamamento público para que se definisse a empresa que executaria a obra, ficando também responsável pela sua gestão, com concessão por prazo de 30 anos, auferindo evidentemente lucros com a parceria público-privada.

A empresa vencedora foi o Memorial Parque Itapevi, criada especificamente para esse fim, hoje presente em muitas outras cidades – e que posteriormente fez as aquisições necessárias para a instalação dos equipamentos e software, sem ter que promover concorrência pública, da mesma empresa contratada em Itabira: a Evolution Tecnologia Funerária Eireli.

Pelo modelo de PPP adotado para o cemitério vertical de Itapevi, se por um lado o contribuinte não arca com o custo de sua implantação por meio do erário municipal, por outro, paga muito mais quando precisar usufruir do serviço para dar um destino digno e ambientalmente correto ao corpo de um ente familiar que faleceu.

É que segundo o site da Prefeitura de Itapevi, a instalação do cemitério vertical não envolve recursos públicos, pois o investimento está sendo bancado pela empresa vencedora da PPP, que “apresentou a proposta mais vantajosa para a administração pública e para os usuários do serviço”.

Acrescenta que a PPP foi aprovada pela Câmara Municipal da cidade, assim como aconteceu em 2019 com a aprovação pelos vereadores itabiranos da PPP do Rio Tanque, pela administração anterior.

Ou seja, em ambos os casos de PPP, é o usuário quem paga ao comprar por um serviço público que foi privatizado. No caso do cemitério vertical de Itapevi, a conta é paga ao comprar as gavetas ofertadas pela empresa concessionária do serviço público, com o lucro privado embutido.

Já se prevalecesse a PPP proposta pelo Saae na administração de Ronaldo Magalhães para a transposição do rio Tanque, a conta cairia para o usuário pagar com o aumento da tarifa de água paga no fim do mês.

Por força de um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) firmado com o MPMG, é a Vale que vai pagar a conta da transposição, ficando com a “cereja do bolo” de 400 litros por segundo (l/s), já que a cidade, nos primeiros anos, vai demandar apenas 200 l/s.

Esse excedente a Vale vai poder usar como lhe aprouver em suas atividades mineráris, enquanto a cidade não precisar de todo esse volume para abastecimento público e atrair novas indústrias.

Prefeito diz que denúncias encobrem interesses econômicos contrariados e que eram cartelizados

Marco Antônio Lage se defende das acusações da oposição dizendo que a motivação real, por trás dessas denúncias, é o descontentamento de muitos empreiteiros da cidade, que viram a sua administração quebrar cartéis que até então dominavam as obras e os serviços contratados pela Prefeitura de Itabira (Foto: Carlos Cruz)

Conforme adianta o vereador Neidson Freitas, as apurações de possíveis irregularidades nas licitações, ou nas ausências dessas por meio de atas de adesão de preços, vão continuar.

“O meu gabinete recebeu da Prefeitura caixas contendo documentações de licitações municipais e também das dispensas por motivos diversos. O meu jurídico está analisando a documentação e devemos trazer novos casos suspeitos que temos o dever de tornar público e apurar”, afirma o oposicionista, prometendo esquentar ainda mais o clima no legislativo itabirano.

Para o prefeito Marco Antônio Lage, nada disso é surpresa. Em recente entrevista a este site, já prevendo esse clima político acirrado na cidade, antecipando a campanha eleitoral para a sua sucessão em 2024, ele assegurou que existem interesses econômicos contrariados bastante conhecidos – e que “são esses grupos econômicos que fomentam as denúncias em curso de ‘suposta’ corrupção” em sua gestão.

Segundo ele, tudo isso não passa de uma tentativa de impedir a sua reeleição, como ocorreu no passado, por meio de campanhas difamatórias, instrumentalizadas pelo mesmo grupo político em relação a outros prefeitos, que não se reelegeram. “São denúncias vazias que vamos demonstrar em todas as instâncias. As nossas contratações são abertas e transparentes.”

É assim que Marco Antonio refuta a pecha de corrupto que a oposição o quer impingir. “Querem desconstruir a minha imagem de político probo, como se eu fosse farinha do mesmo saco de políticos corruptos. Não vai colar.”

Na mesma entrevista a este site, Marco Antônio insiste que a motivação real por trás dessas denúncias é o descontentamento de muitos empreiteiros da cidade, que viram a sua administração quebrar cartéis que até então dominavam as obras e os serviços contratados pela Prefeitura de Itabira.

Segundo ele, o resultado é o fim desse monopólio pelo qual a população itabirana já sente a diferença, por exemplo, com o recapeamento de vias asfálticas na cidade, que já não suportavam mais remendos recorrentes, permanentes sangradouros do erário municipal, um serviço sem fim.

Mais esclarecimentos

Prefeitura informa detalhes da dispensa de licitação do cemitério vertical

Por meio de sua assessoria de imprensa, a administração municipal de Itabira enviou nota a este site. Leia a íntegra:

A Prefeitura de Itabira esclarece que a contratação do cemitério vertical, no Sistema Eco No-Leak, corresponde a uma tecnologia exclusiva.

Trata-se de um Sistema Integrado de Sepultamento Biosseguro com Controle Inteligente de Estanqueidade e Tratamento de Gases por Dissociação Molecular. Essa tecnologia foi desenvolvida para atender a resolução CONAMA 335/2003, que define as diretrizes para o processo de licenciamento ambiental de cemitérios e, no artigo sexto, específico para cemitérios verticais.

A tecnologia existente no Sistema Eco No-Leak é o único que permite:

1 – lóculos (gavetas) que comprovadamente demonstram a capacidade de não ocorrer vazamento de líquidos e/ou gases; lóculos que são constituídos de materiais que comprovadamente demonstram elidir (de forma duradoura) a passagem de gases para os locais de circulação dos visitantes e trabalhadores;
2 – lóculos que são constituídos de materiais que comprovadamente demonstram elidir (de forma duradoura) ao vazamento dos líquidos oriundos da coliquação;
3 – lóculos que são constituídos de dispositivo que permita a troca gasosa, em todos os lóculos, proporcionando as condições adequadas para a decomposição dos corpos, exceto nos casos específicos previstos na legislação;
4 – lóculos que são constituídos de tratamento ambientalmente adequado para os eventuais efluentes gasosos;
5 – exumação em sistema sem vazamento.

Diferente do que disse o vereador em plenário, é importante ressaltar que a Evolution Tecnologia Funerária Eireli, inscrita no CNPJ 22.446.464/0001-69, pertence ao único grupo detentor dos direitos de fabricação e comercialização deste sistema contratado pela Prefeitura de Itabira, acompanhado do software Siga (Sistema Inteligente de Gerenciamento de Automação). O serviço é patenteado, como pode ser conferido no documento anexado a esta nota. Portanto, não há possibilidade de competição, já que o objeto é exclusivo.

Além disso, não existem “penduricalhos”, todos os itens incluídos no contrato são necessários para a realização da obra. Itabira incluiu ainda itens como gavetas (lóculos) para crianças e obesos, incluindo, também, uma plataforma elevatória.

Se comparar a licitação com o município Itapevi/SP, atendido pela mesma empresa, é possível verificar exatamente os mesmos itens contratados para, inclusive com os mesmos custos unitários (anexo).

A Prefeitura de Itabira rechaça as denúncias de superfaturamento, uma vez que a contratação de Itabira é diferente da contratação da cidade de Arthur Nogueira.

Em relação aos ossuários, a demanda de Itabira é muito maior que a de Arthur Nogueira, que possui 51.456 habitantes de acordo com o Censo 2022.

Logo, foi contratado os ossuários duplos, semelhante ao de Itapevi/SP, com maior quantitativo para atender a população de Itabira. Sendo assim, os valores pagos pela Prefeitura são correspondentes à tecnologia contratada pelo município.

A construção dos lóculos verticais com gavetas, no Sistema Eco No-Leak, será executada no Cemitério da Paz, por meio da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano (SMDU).

De acordo com o contrato, em 12 meses, serão feitos 176 lóculos normais, 6 lóculos obesos, 30 lóculos infantis, totalizando 212 lóculos. Além disso, 8 lóculos irão para a estação de tratamento dos gases que fica dentro do bloco, diretriz obrigatória da CONAMA 335.”

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