Polêmico, o filme Saltburn tem cenas picantes de sexo, com críticas a uma rica e tradicional família inglesa
Imagem: Prim Video
Daniel Cruz Fonseca*
O filme Saltburn,que está disponível no Amazon Prime Video, foi um dos mais comentados do último mês. Entre “amei” e “odiei”, ouvi vários amigos falando a respeito e resolvi conferir.
A história do filme começa quando Felix Catton convida o seu novo amigo Oliver Quick para passar as férias de verão na mansão de sua família, na região de Saltburn. Com a chegada do garoto, uma série de eventos perturbadores atinge os Cattons.
O filme, dirigido por Emerald Fennell (Bela Vingança), é muito hábil em mostrar ironicamente e de forma exagerada a vida de uma família rica e tradicional da Inglaterra. Conta com uma ótima atuação de Barry Keoghan como Oliver e de Rosamund Pike como Elspeth.
Uma fotografia magnífica usa muitas luzes e planos abertos em alguns momentos. Isso enquanto faz um contraste com momentos sombrios e planos bem fechados.
Sem sombras de dúvidas é um bom entretenimento e em vários momentos causa risadinhas e até arrepios.
Alguns podem achar longo ou arrastado, mas não foi o meu caso. Diverti-me com os diálogos, fiquei enojado com algumas cenas e adorei o ar de tensão sexual constante, de deslocamento do personagem principal naquele universo e de constante manipulação.
É brilhante como o cotidiano se apresenta de forma inusitada.
Mas, nem tudo são flores. Gosto de distinguir as camadas do filme entre entretenimento e mensagens.
Na primeira camada o filme de fato é divertido, belo, estranho, sexual e arrepiante. Porém, há diversas incoerências e problemas na segunda camada.
(Aviso que começarei a falar com spoiler)
O filme tenta criticar os excessos da riqueza, os comportamentos fúteis de uma família que mascara suas falhas continuando seu jantar, o excesso de materialismo dos ricos que julgam até a roupa de Oliver.
Porém, alça os comportamentos mais repugnantes e o crime mais horrendo justamente ao personagem de Oliver. Ou seja, o vilão do filme é o Oliver, o que não é rico. E o próprio Oliver mascara suas falhas, manipula e é materialista.
O filme que vinha construindo uma crítica do capital acaba ao final por generalizar as fraudes a todos os humanos e inocenta o comportamento da nobreza. Afinal, apesar de tudo, eles não mataram ninguém.
A ausência de investigação policial dos crimes também me soou forçada. Afinal, todas as maneiras com que o Oliver gerou as mortes poderiam ser facilmente descobertas. Não ter câmeras numa casa daquelas também é estranho.
A obsessão exagerada, problema psiquiátrico, do Oliver o torna um stalker perigoso, algo bem legal do filme. Porém, a diretora optou por nos apresentar uma narração do Oliver questionando a sua sexualidade e se amava Félix no início do filme.
Assim, a mensagem nas entrelinhas fica sendo de que a sexualidade de Oliver era responsável pelo seu comportamento. Notei um problema parecido em Maestro quando resenhei aqui na Vila de Utopia.
A cena final de Oliver dançando nu e a cena de sexo com o túmulo me pareceram um pouco gratuitas, talvez tenham até motivos.
Entretanto, àquela altura foram no mínimo repetitivas. Diferente da cena na banheira que de fato valorizou a película.
Quando o roteiro tenta abordar a questão racial do personagem Farleigh o faz de forma brusca e rasa. Não há nada de útil a ser extraído deste trecho que poderia ser um dos temas mais importantes do projeto.
Por fim, a narrativa longa demorou a demonstrar seus padrões de thriller. É assim que quando estes movimentos assassinos vieram já estavam tão forçados e previsíveis que perderam o impacto.
Nota: 7/10
*Daniel Cruz Fonseca é advogado, mestre em Direito nas relações econômicas e sociais, crítico de arte e cinéfilo, escritor e poeta, autor dos livros “Nuvens Reais” e “Alma Riscada”.