Outubro Itabirano. Crônicas da Itabira do Matto-dentro Imperial – 1866 – De nada valem as vozes estridentes dos eleitos progressistas
Rua do Bongue, Itabira, junho de 1997
Foto MCS Pesquisa: Cristina Silveira
Itabira, 9 de setembro de 1866. Nesta a minha primeira palavra e um aperto de mão que lhe dirijo pela publicação de minhas toscas linhas. Sou homem sem lima, mas ainda assim não posso furtar-me a obediência de um dos mais sagrados deveres: ser muito reconhecido aos favores que se me dispensa.
Hoje não serei tão explicito como desejo, tenho medo dessa me molestar pela ousadia que abracei de quebrar o silêncio sepulcral, em que vive a Itabira.
Não sou o romano C. Mucio jovem animoso, que, amamentando o desejo de matar a Porsenna quando este dava audiência, em seu lugar apunhala o seu secretário, o que motivou ser o mesmo coagido a lançar sua mão direita ao fogo, ordem que gostosamente executou dizendo: Romanus civis sum, hostis hostem occidere volui.
Sou tímido.
Não posso correr muito que poderei cair.
Ditas estas coisas entro em matéria.
Causa dor de coração aos verdadeiros brasileiros o procedimento que há tido nesses últimas anos o governo de nosso país.
Os interesses vitais do Império são sacrificados.
A honra de nossa briosa pátria por vezes tem sido conspurcada.
A guerra mais tremenda se há feito aos míseros proscritos numa época, em que o acontecimento das paixões seria uma necessidade.
Não contentes com isto a máquina eleitoral se retoca, começa a contradança das autoridades.
O governo geral se degrada ao ponto de preparar arena para bater os gladiadores históricos!
Aos míseros conservadores o que fará!
Apertará a corda que lhes lançou ao pescoço e tripudiará sobre seus corpos aos frenéticos aplausos, que lhes fornecerá o furor das bacanais.
Não desanimemos.
É tempo que o povo recupere sua autonomia perdida.
É tempo de se lavrar o mais eloquente protesto contra essa política hibrida.
É tempo de se mostrar que se compreende a existência de dois partidos discriminados, mas não essa amalgama de ideias, sinal o mais evidente da transigência de consciências.
É tempo de mostrarmos que apreciamos nossa liberdade, e que como livres pautaremos nosso proceder pelos ditames de nossas consciências.
Não nos esquecemos que somos brasileiros, povo livre e como tal mui cioso de nossos direitos.
Que somos os competentes para apreciar a marcha dos negócios públicos, porque para sua gerencia é preciso o nosso mandato.
Que tais devemos lavrar, como independentes no exercício da soberania nacional, uma sentença condenatória contra a presente ordem de coisas, essa mistificação de tudo quanto é belo, grande e nobre.
Para isso só temos mister de seguir as doutrinas sustentadas pelo Constitucional.
Por falar em política um passeio a Ouro Preto.
Aí deveras devemos chorar, o sistema representativo está desvirtuado.
A Assembleia Provincial é um exemplo edificante.
Por que adiou a sua reunião a vice-presidência?
Será pelos fúteis motivos que aduziu em justificação?
Será por que se receava da maioria que tinha de lhe atirar a luva ao tapete, e descobrir os senões dessas administrações, que tem empalidecido o brilho de nossa heroica província?
É compreensível!!
O que é certo é que a minoria estreia brilhantemente, à toda evidencia prova a-imortalidade da cessão da tipografia do Diário à um particular.
De nada valem as vozes estridentes dos eleitos progressistas, suas opiniões se contradizem!
O sr. Emílio Horta estriba-se e sofismas de meninos! O sr. Misael passa-lhe tremendos bolos, e dá por terra com o castelo de cartas armado pelo ilustre paladino do sr. Saldanha! O sr. Nunes G. espicha-se redondamente, e tanto são os esforços que empregam que o resultado é a imoralidade à luz do dia!!!
O que é isto? Pois deveras a nossa mineira terá descido tanto que não queira reaver sua preponderância das eras que já se foram?!
Vamos a Itabira.
Glória in excelcis Deo!
Aqui ainda se respira alguma coisa.
O nosso povo é por excelência ordeiro. Não precisa de baionetas do governo, ele compreenderá sua missão e distinguirá o mérito.
Não crê mais nas melodias das sereias.
Está muito cansado de ver metamorfoses.
O comércio aqui definha, prova isto o grande número de pedintes às portas nos sábados.
O numero seria maior se não fosse o hospital, que presta muitos serviços à humanidade desvalida, graças ao pé em que se acha pelos cuidados que com o mesmo se dispensa.
Tivemos missões por um mês dos padres do Caraça. Produziram muito entusiasmo e despertaram o amor religioso tanto que a confissão foi geral, mas o que dói é que cansaram-se à toa (falaram muito bem) porque a roda começa a desandar, e já teria se deseixado se não fora o temor do castigo eterno.
A nossa atmosfera está muito impregnada e o ar menos salubre porque é geral coqueluches, desinterias etc. [Constitucional (MG), 15/10/1866. BN-Rio]