Operação Carbono Oculto, da Polícia Federal, acende alerta sobre governança

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Auditoria e transparência em transações financeiras devem ser criteriosamente observadas a fim de evitar fraudes e associações criminosas

Na quinta-feira, 28, a Polícia Federal, junto com órgãos como a Receita Federal (RF) e o Ministério Público de São Paulo (MPSP), deflagrou uma operação de grandes proporções contra um esquema bilionário comandado pela facção Primeiro Comando da Capital (PCC), por meio de fraudes em combustíveis, fundos de investimento e fintechs. Foram 350 mandados de busca, apreensão e prisão envolvendo pessoas físicas e jurídicas em diversos Estados, configurando a maior ofensiva já registrada no País contra a infiltração do crime organizado na economia formal. A RF estima que o esquema tenha movimentado R$ 52 bilhões.

O nome “Carbono Oculto” foi escolhido pela PF e pelo MPSP como uma metáfora para o esquema descoberto. A cadeia de combustíveis lida diretamente com a queima de carbono e, portanto, com emissões de gases de efeito estufa. Só que, no caso investigado, havia também um “carbono invisível”, representado pelo dinheiro sujo do crime organizado que se misturava à atividade lícita. As investigações deixam claro que havia uma teia de empresas formais misturadas com companhias de fachada ligadas ao PCC. Como a cadeia é extensa e pulverizada — envolvendo produtores, distribuidoras, transportadoras, revendedores e fundos financeiros — algumas empresas podem ter sido cooptadas ou se associado indiretamente sem plena consciência da fraude.

“Instituições sérias poderiam evitar se envolver em transações criminosas adotando processos de auditoria rotineira. O registro imutável por meio de blockchain e a transparência para consulta pública torna as transações financeiras mais seguras tanto para as organizações envolvidas quanto para o investidor”, reflete Odair Rodrigues, CEO e fundador da B4, primeira bolsa de ação climática do Brasil, especializada na listagem e negociação de ativos sustentáveis.

Com rastreabilidade em tempo real, a B4 adota processos de triagem da documentação e checagem periódica inteligente. Em caso de descumprimento de cláusulas de segurança ou conflito de dados, a empresa de serviços ambientais pode sair da listagem de ativos automaticamente, gerando a necessidade de readequação e novas análises. O monitoramento é realizado a cada 15 ou 30 dias, garantindo negociações sólidas.

Como resultado das investigações, a Receita Federal publicou uma nova portaria já nesta sexta-feira, 29, no Diário Oficial da União. A instrução normativa submete fintechs às mesmas regras dos grandes bancos. Com isso, elas passam a ser obrigadas a enviar ao fisco dados detalhados sobre operações financeiras. O Banco Central (BC) também passará a fiscalizar todas as fintechs de maneira mais rigorosa e investigar o uso das plataformas para fins ilegais. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defendeu a intensificação das atuações contra crimes.

“No nosso processo, uma fraude assim não acontece. Quando se trata de créditos de carbono, a transparência é um ponto fundamental. A B4 registra e publica todos os dados de transações. Desde o início, tínhamos a tese de que os ativos sustentáveis brasileiros eram escassos e difíceis de analisar, possivelmente fraudulentos. Nossa tese se confirmou. Por isso, já iniciamos nossas atividades com um padrão de acreditação que cobre várias etapas.”

O que diz a legislação

No Brasil, a Lei nº 6.385/1976 criou a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e disciplinou o mercado de capitais para que seja eficiente e transparente, com regras claras para divulgação de informações relevantes. Já a Lei nº 8.021, de 1990, exige a identificação dos contribuintes para fins fiscais, vetando pagamentos a beneficiários não identificados e impondo restrições à emissão de cheques e títulos ao portador. A redação expressa a essência da norma: impedir resgates sem identificação, garantindo transparência e rastreabilidade nas movimentações financeiras de bancos, o que, até agora, não era uma exigência às fintechs também.

Mais recente, a Medida Provisória nº 1.303/2025, publicada em junho deste ano, estabelece um novo regime de tributação para aplicações financeiras e ativos virtuais. Dentre as principais alterações, a MP revoga a isenção de Imposto de Renda sobre Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) e do Agronegócio (CRAs), além de outros títulos. A maior parte das novas regras, especialmente as relacionadas à tributação, entrará em vigor a partir de 1º de janeiro de 2026. Mas para se consolidar na legislação brasileira, a MP depende da aprovação no Congresso Nacional.

Para Rodrigues, se a lei estivesse inscrita no blockchain do circuito de transações, as instituições teriam menos dificuldade para fiscalizar, porque o contrato inteligente faz isso de forma automática. “E não estamos falando só de tecnologia, mas de regra. Nossa visão é de que empresas públicas e privadas precisam ser mais rigorosas e transparentes, adotando metodologistas mais interessantes e atuais para prevenir problemas que são rotina no mercado financeiro.”

O CEO cita ainda o Boticário e a Natura como exemplos de empresas que seguem processos transparentes com relação aos seus ativos ambientais, facilitando o acesso do consumidor a informações úteis à decisão de compra. Ele menciona ainda o caso da China que, apesar de ser o maior emissor de carbono do mundo, também está muito à frente na corrida pela tecnologia sustentável. A Agência Internacional de Energia (AIE) prevê que 60% de toda a capacidade de energia renovável instalada no mundo entre 2025 e 2030 venha da China, que também é a principal fabricante de turbinas eólicas, painéis solares, veículos elétricos e baterias de íons de lítio.

Para o cidadão comum, ter conhecimento sobre atividades socialmente responsáveis, compensação da pegada de carbono, captação de matéria-prima certificada e manejo de resíduos, por exemplo, são essenciais para fazer escolhas de consumo mais conscientes. “Hoje, empresas publicam seus compromissos de forma voluntária. Mas a legislação vai exigir transparência no rótulo e a fiscalização deve aplicar multas no futuro próximo. Essa é a evolução do mercado”, conclui o empresário.

Sobre a B4

A B4 é a primeira Bolsa de Ação Climática do Brasil, criada com o propósito de fortalecer o mercado de créditos de carbono por meio de tecnologia blockchain, garantindo rastreabilidade e segurança nas transações. Com operações iniciadas em 2023, a B4 atua como um ambiente regulado e transparente para empresas que buscam compensar emissões e investir em sustentabilidade, conectando inovação tecnológica a práticas de responsabilidade ambiental. A expectativa é consolidar o Brasil como protagonista no mercado global de créditos de carbono, ampliando a liquidez e a confiança nesse segmento estratégico para a transição climática.

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