O romancista Cornélio Penna
Por Adonias Filho
A imprensa mineira continua se preocupando com Cornélio Penna, o grande romancista agora morto. Em artigos, entrevistas, confissões, declarações ou crônicas – como a que o poeta Carlos Drummond de Andrade escreveu pedindo um busto do escritor para Itabira do Mato Dentro – a inteligência brasileira exalta o ficcionista que, isolado em exilio quase voluntário, realizou uma das obras mais poderosas da moderna literatura.
Pertencendo à geração que provocaria a sublevação modernista de 22, tendo começado seu percurso artístico como desenhista e pintor, abriria com “Fronteira”, em 35, amplo e novo itinerário para o romance brasileiro.
A significação desse livro, com duas edições esgotadas, pode ser adquirida ainda hoje pela citação obrigatória da crítica ao fazer a abordagem da moderna ficção nacional.
Ao contrário de tantos outros, que estreiam e permanecem em discussão, Cornélio Penna jamais foi um autor discutido. Aceito desde o primeiro livro, essa aceitação se robusteceu à proporção em que foram surgindo os livros posteriores.
Em “Dois romances de Nico Horta” – talvez o mais difícil dos seus romances – por exemplo, a consagração crítica não sofreu a menor fenda. Lembro-me do artigo que Mário de Andrade escreveu auscultando-o em profundidade, nele reconhecendo uma das futuras posições da nossa novelística.
É a partir de “Repouso”, entretanto, que a experiencia literária de Cornélio Penna – relacionada com experiência de romancistas católicos, como Bernanos e Malègue – ao distante de tal modo que vem forçar mesmo um dos núcleos ficcionais mais expressivos.
Quando publica “A Menina Morta” – e sempre presente o cenário mineiro, e sempre flagrante o interesse psicológico, e sempre inevitável a linha metafisica – que será um dos vértices, no movimento temático escravista, já sua influência marcava inúmeros outros ficcionistas.
Verificar-se-á, levantando-se o estudo comparativo dos seus com os romances posteriores, como foi decisiva aquela influência.
O romance brasileiro de tendência incontestável para a extroversão e o documentário, e quando muito para o psicológico, inicia outro caminho que vai atingir o plano da consciência à sombra dos problemas extremos. Compreendia-se, afinal, a enorme e indiscutível influência de Cornélio Penna.
Tudo isso justifica, agora quando o romancista está morto, a exaltação que a inteligência brasileira vem tecendo sobre a sua obra e sua figura humana.
Com a edição crítica dos seus quatro romances – a sair sob a responsabilidade do editor Aguilar – confirmar-se-á o grande lugar que o romancista Cornélio Penna conquistou no quadro geral da literatura brasileira.
[Coluna Estante no Diário de Notícias de 26/2/58. Pesquisa na hemeroteca da BN/Rio]