O Codema não é democrático e só representa os empresários, reconhece seu vice-presidente

Num lampejo de sinceridade, como é de seu feitio, o vice-presidente do Conselho Municipal de Meio Ambiente (Codema), Sydney Almeida Lage, reconheceu que o órgão ambiental, que deveria cuidar dos interesses ambientais difusos da sociedade, não é democrático.

E mais, ele assumiu que também não é representativo. “Os trabalhadores têm o Ministério do Trabalho (Justiça do Trabalho) que defende os seus interesses. Já esta Casa (o Codema) é dos empresários”, afirmou, no fim da reunião do órgão ambiental na quinta-feira (10).

Sydney Almeida (segundo à esquerda) defende mais participação popular nas reuniões do órgão ambiental (Fotos: Carlos Cruz)

Para democratizar o Codema, ele sugeriu que no final das reuniões a palavra seja franqueada ao público, independente de se inscrever antecipadamente para essa finalidade. A inscrição prévia para se manifestar é o que ocorre atualmente para temas específicos e previamente agendados.

“Eu entendo que as licenças (ambientais) são destinadas às empresas. A população se faz presente, quer manifestar, mas não pode. Vamos abrir esse espaço para que o povo possa também se manifestar”, propôs, dizendo estar cansado de ouvir reclamação sobre o caráter pouco democrático das reuniões do órgão ambiental.

A sua proposta foi aprovada em caráter experimental. As reclamações apresentadas, conforme sugeriu um conselheiro, serão incluídas na pauta da reunião do mês seguinte, para que sejam deliberadas.

Falta representatividade

A proposta do empresário Sydney Almeida não deixa de ser uma solução, mas é só parcial. É que, embora se assegure a livre manifestação popular, não toca na questão da falta de representatividade do Codema.

Nomeados pelo prefeito, o órgão ambiental municipal é constituído por 25 membros. Teoricamente, era para haver paridade entre conselheiros do poder público e da sociedade civil. Mas não há. Para começar, o poder público, que inclui a Câmara, o Saae e a Itaurb, dispõe de 13 cadeiras, enquanto a sociedade civil dispõe de 12 conselheiros.

Dos representantes da sociedade civil, conforme reconheceu o próprio vice-presidente do conselho, a maioria é indicada pelo segmento empresarial ou o representa na prática. Para isso, basta fazer as contas e ver quem é quem no Codema.

Só a área de mineração tem dois representantes, um da Vale e o outro da Belmont – de longe as maiores empresas do município e que, teoricamente, são as que mais impactam o meio ambiente.

A Loja Maçônica União e Paz também está representada. Isso enquanto os conselheiros indicados pelo Rotary Club e pela Associação dos Engenheiros, Arquitetos, Agrônomos, Geólogos e Geógrafos (Asseag) estão sempre se abstendo de votar por representarem e ou defenderem interesses de empresas que estão sendo licenciadas. Ao absterem-se de votar, seguem orientação do Ministério Público, que também já questionou a representatividade do Codema.

O Sindicato Rural, que é patronal, invariavelmente vota com o governo. Já o conselheiro indicado pela construtora MD Predial representa as loteadoras e incorporadoras imobiliárias. O representante da Acita, óbvio, defende os interesses do empresariado.

Como representação popular têm-se a Interassociação de Moradores e a Associação dos Produtores da Agricultura Familiar de Itabira (Apafi), o que, convenhamos, é muito pouco para se dizer que o órgão ambiental realmente representa os interesses difusos da comunidade itabirana.

Pois é justamente essa falta de representatividade que precisa ser revista, caso se queira ter um órgão ambiental realmente representativo da sociedade organizada itabirana. Não é à toa que assuntos importantes e de grande repercussão para o meio ambiente são aprovados sem se aprofundar a pauta, assim como as condicionantes e as medidas compensatórias cabíveis.

Não foi sem razão que os sucessivos alteamentos da barragem do Itabiruçu obtiveram a anuência do município sem que fosse pedida a realização de uma audiência pública. Isso só ocorreu agora, por iniciativa do presidente da Câmara, vereador Neidson Freitas, que é membro do Codema e está sempre ausente, mas sem a garantia de que será realizada pelo Copam.

A falta de representatividade popular no Codema é, pois, uma questão orgânica, que cabe ao governo municipal resolver sob a liderança da nova secretária de Meio Ambiente, Priscila Martins da Costa, empossada nesta segunda-feira (14) no cargo. Isso caso se queira de fato democratizar o órgão ambiental, o que provavelmente não irá ocorrer.

Se assim permanecer, resta ao Ministério Público intervir no caso e propor as mudanças na composição do órgão ambiental para que passe a representar toda sociedade – e não apenas os interesses de empresários e políticos, como ocorre atualmente. Sem isso, resta ao povo esbravejar as suas queixas nos minutos finais das reuniões do órgão ambiental sem nenhum ou pouco efeito prático.

 

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4 Comentários

  1. Sem dúvida, os segmentos da sociedade ligados à classe empresarial têm muita força entre os representantes da sociedade civil no Codema, mas a paridade (metade do poder público e metade da sociedade civil) existe, sim, a menos que os representantes de algum segmento deixem de comparecer e participar das reuniões ou algum segmento não indique seus representantes no processo eleitoral dos representantes da sociedade civil neste Conselho. A lei 3761/2003 definiu a composição do Codema com 24 conselheiros titulares (12 dos órgãos públicos e 12 da sociedade civil) e a Lei Municipal 4777/2014 acrescentou 2 titulares (1 de órgão públicos e 1 da sociedade civil), passando a totalizar 26 conselheiros 13 de órgãos públicos e 13 da sociedade civil), com seus respectivos suplentes, distribuídos da seguinte forma:
    I – representantes do Poder Público: a) um presidente nato, que é o titular da Secretaria Municipal de Meio Ambiente; b) um representante do Poder Legislativo Municipal designado pelos Vereadores; c) um representante da Secretaria Municipal de Saúde; d) um representante da Secretaria Municipal de Obras; e) um representante da Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento; f) um representante da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e Turismo; g) um representante da Secretaria Municipal de Ação Social; h) um representante da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano; i) um representante da Secretaria Municipal da Fazenda; j) um representante da Procuradoria Jurídica do Município; l) um representante do Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE) de Itabira; m) um representante da ITAURB – Empresa de Desenvolvimento de Itabira Ltda; n) um representante do Órgão de Defesa do Consumidor – Procon – Itabira. (este último foi acrescentado pela Lei Municipal 4777/2014)
    II – representantes da sociedade civil, eleitos pelo segmento, desde que legalmente constituídas e em funcionamento regular de suas atividades: a) um representante dos Clubes de Serviços; b) um representante dos Sindicatos de Trabalhadores; c) um representante dos Sindicatos Patronais; d) um representante das Associações de Classes de Atividades Econômicas; e) um representante das Associações de Classes Profissionais; f) um representante das Entidades Mantenedoras de Ensino Superior; g) um representante das Atividades Minerárias; h) dois (2) representantes de Entidades Civis criadas com o objetivo de defesa dos interesses dos moradores, com atuação no Município, sendo um deles representante dos Distritos legalmente constituídos; i) um representante de Entidades Civis, criadas com finalidade de defesa da qualidade do Meio Ambiente, com atuação no âmbito do Município; j) um representante das Empresas Loteadoras ou Incorporadoras, legalmente constituídas, com negócios imobiliários no Município e quites com suas obrigações tributárias; l) um representante da Companhia Vale do Rio Doce; m) um representante das entidades técnicas relacionadas ao setor de saneamento básico. (este último foi acrescentado pela Lei Municipal 4777/2014).

  2. Para melhorar a representatividade e até mesmo o funcionamento do Codema (e dos demais conselhos municipais), a comunidade deve se organizar e reivindicar/cobrar as mudanças cabíveis junto ao Poder Executivo Municipal, à Câmara Municipal, ao Ministério Público Estadual e até mesmo junto ao próprio Codema, que é deliberativo e pode encaminhar decisão neste sentido por decisão da maioria de seus membros tomada nas próprias reuniões do Conselho.

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