Noronha diz que André Viana será vogal da CPI das condicionantes da Vale. Prefeitura também tem comissão para discutir pendências

Enfim, depois de muita insistência, inclusive deste site Vila de Utopia, as autoridades municipais começam a se mover para averiguar se todas as 52 condicionantes específicas, e mais duas gerais, da Licença de Operação Corretiva (LOC), aprovada em 2000 pela Câmara de Mineração, do Conselho Estadual de Meio Ambiente, foram de fato, e não de ficção, integralmente cumpridas.

Para isso, a Câmara Municipal já aprovou a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), requerida pelo vereador André Viana Madeira (Podemos). Segundo o vereador Heraldo Noronha (PTB), o autor do requerimento é que deve assumir a relatoria da comissão. E que nos próximos dias nomeia o seu presidente e o secretário, para que possa enfim dar início às investigações.

Noronha promete nomear CPI e realizar audiências das barragens após o simulado de autossalvamento (Fotos: Carlos Cruz)

Noronha promete também agendar a audiência pública das barragens para depois da realização do simulado de autossalvamento, previsto para o dia 17 deste mês, caso não seja novamente adiado. A audiência foi aprovada em fevereiro, pouco depois do trágico rompimento da barragem da Vale em Brumadinho.

“Vamos agendar esses audiências e nomear os membros da CPI das condicionantes. Estamos devendo isso à sociedade itabirana”, promete o presidente da Câmara.

Outra audiência, já aprovada pela Câmara, irá debater o futuro de Itabira sem a mineração, quando se espera a participação de autoridades municipais, da Vale e da população itabirana.

Já é tempo, para não dizer que passa da hora, uma vez que a evolução da mineração em Itabira caminha para o descomissionamento das minas (fechamento com as medidas corretivas, compensatórias e ambientais necessárias). Essa nova e preocupante realidade precisa ser debatida à exaustão, sem trocadilho, com a sociedade itabirana.

Remoção de moradores

André Viana adianta que a CPI deve dar atenção especial às condicionantes que tratam da questão da água em Itabira (11 a 15). E, pelo momento atual, outra prioridade será dada à condicionante de número 46, que trata do reassentamento populacional de moradores em áreas de risco, no caso de rompimento de uma das barragens existentes na cidade.

A condicionante prevê o reassentamento como “medida preventiva a toda intervenção futura que implicar riscos às famílias ou deslocamento compulsório da população”.

André Viana quer priorizar na CPI das condicionantes a questão da água e a segurança de moradores vizinhos das barragens

Trata-se de uma reivindicação de muitos moradores – e que foi endossada pela Diocese de Itabira/Fabriciano e pelo Comitê Popular dos Atingidos pela Mineração em Itabira e Região.

Entretanto, a empresa Vale e a Defesa Civil do Estado de Minas Gerais não veem essa necessidade. Isso por considerarem que todas essas estruturas não apresentam riscos de colapso.

Segundo sustenta o tenente-coronel Flávio Godinho, com base em informações da gerência de Geotécnia da Vale, as barragens de Itabira estão com as declarações de estabilidade em ordem.

“Não houve alteração do nível de segurança, não há que se falar em evacuação de moradores. As barragens permanecem com a mesma situação de normalidade”, assegura.

Outra condicionante que pode não ter sido cumprida é a de número 45, que determina que a mineradora apresente estudo de impacto decorrente da desapropriação e remoção de moradores da Vila São José, Santana, Belo Vale e Camarinha. E que sejam apresentadas as medidas mitigadoras e compensatórias para as famílias remanescentes.

Ao que se sabe, esse estudo não foi apresentado. No caso dos moradores da antiga comunidade da Camarinha, cuja mina foi vendida à Vale pela extinta empresa municipal Extracomil, na década de 1980, eles foram reassentados no bairro Nova Vista, ao lado de uma estação de tratamento de esgoto, já desativada.

Poeira e doenças respiratórias

“Também devemos investigar a questão da poeira e as doenças respiratórias, assim como as medidas que estão sendo adotadas, ou não, para diminuir o lançamento de fino de minério na cidade”, adianta o vereador André Viana.

Nesse caso, a Vale apresentou relatório de um estudo epidemiológico sobre os impactos da poluição do ar na saúde da população itabirana. Esse estudo foi realizado, em 2005, pelo Laboratório de Poluição Atmosférica, da Universidade de São Paulo (USP), sob a coordenação do médico patologista Paulo Saldiva.

No entanto, o resultado desse estudo não foi conclusivo. O próprio professor Saldiva, em apresentação na Câmara Municipal, em julho daquele ano, sugeriu a continuidade da pesquisa para melhor avaliar a relação de causa e efeito da poeira sobre a incidência de doenças respiratórias, inclusive as cardiorrespiratórias. Mas esse estudo, entretanto, não teve continuidade.

Prefeitura também tem comissão para avaliar as condicionantes

Uma comissão nomeada pelo prefeito Ronaldo Magalhães (PTB) já está concluindo levantamento das condicionantes consideradas não executadas, ou que só foram parcialmente cumpridas pela mineradora Vale.

“Já sabemos que pelo menos seis condicionantes não foram cumpridas”, adiantou a secretária municipal de Meio Ambiente, Priscila Braga Martins da Costa, na reunião do Codema, na quinta-feira (1).

Entre as condicionantes, ela também relaciona as que tratam dos recursos hídricos. “A condicionante da água eu tenho certeza que não foi cumprida, mas a Vale sustenta que foi. É uma condicionante que deve ser judicializada”, disse ela, já que a negociação com a mineradora não evolui para uma solução definitiva amigável.

A dívida da Vale com Itabira em relação aos recursos hídricos não precisaria nem mesmo de condicionantes para ser reconhecida. Para isso, basta ouvir o hino da cidade para saber que desapareceram as fontes do Pará, como também as nascentes da Camarinha, Borrachudo, Bicão – todas soterradas pela mineração.

O Poço da Água Santa só não secou com o rebaixamento do nível das águas para minerar nas Minas do Meio por pertencer ao aquífero Piracicaba, que não se comunica com o aquífero Cauê, que sofreu a intervenção, conforme  na ocasião explicaram hidrogeólogos da mineradora.

Segundo estudo do Serviço Autônomo de Água Esgoto (Saae), postado em seu site para justificar a transposição de água do rio Tanque para equacionar a permanente escassez de água na cidade, para minerar em Itabira é preciso bombear 1,2 mil litros de água por segundo dos aquíferos. Esse volume é três vezes maior que o consumo de água em toda cidade.

Pelo Código de  Águas, a prioridade no uso desse precioso líquido é para o consumo humano e de animais. Portanto, essa questão deve ser avaliada à luz do direito – e também das perdas do passado com a mineração.

Se a Vale irá mesmo trazer minérios de outras localidades para ser processado em Itabira, a questão da água precisa, mais uma vez, entrar na pauta de negociação. Afinal, trata-se de um insumo essencial para assegurar a sustentabilidade do município sem a mineração.

Além disso, é certo que, mesmo no caso de trazer minério de outras localidades para processar nas plantas industriais da Vale, será consumido o mesmo volume de água que hoje a empresa necessita para produzir pellet-feed com o itabirito de suas minas no municipio.

A diferença, em desfavor de Itabira, será o menor número de empregos após a exaustão de suas minas. E também dos impostos e royalties, que serão em montante bem menor do que hoje o município arrecada.

Outro lado

A Vale não reconhece essas pendências relativas às condicionantes. De acordo com a sua assessoria de imprensa, todas as condicionantes foram cumpridas, ou acordadas com a Prefeitura.

Para a Fundação Estadual de Meio Ambiente (Feam), órgão ambiental estadual de fiscalização, as condicionantes da LOC foram cumpridas. Portanto, não há pendências. Tanto que renovou a licença ambiental da Vale para continuar minerando no município até a exaustão de suas minas.

Isso mesmo depois de o ex-secretário municipal de Meio Ambiente Arnaldo Lage, em reunião da Superintendência Regional de Meio Ambiente do Leste Mineiro (Supram-Leste), no dia 24 de setembro de 2012, ter relacionado pelo menos três condicionantes como não tendo sido cumpridas, a saber: a implantação das unidades de conservação, alternativas para captação de água e a instalação da central de resíduos sólidos.

Na mesma reunião, o Ministério Público Estadual pediu vista ao processo, mas acabou não se posicionando a respeito. Em 16 de outubro do mesmo ano, o órgão ambiental ignorou as objeções do ex-secretário municipal. E renovou a licença ambiental para o complexo de Itabira.

 

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