No carnaval de Zé Bandarra, o ziriguidum era no centro histórico
Itabira já não tem mais tradição de Carnaval, se é que algum dia teve. Perdeu o pouco que tinha, que eram os bailes carnavalescos nos clubes Atlético, Valério, Ativa, Grêmio e do Parente nas décadas de 1970/80, que movimentavam o tríduo momesco com deliciosas, ingênuas e bem-humoradas marchinhas, além dos pierrôs e colombinas. Também nessa época, talvez sob influência da vinda de uma ala da escola de Samba Portela à cidade de Drummond, trazida pelo carnavalesco ex-prefeito Daniel Grisolia, no fim da década de 1960, vieram as escolas de samba.
Com elas, o carnaval começou a se deslocar dos clubes para ganhar a avenida, mas só para quem participava das escolas de samba. O povão só assistia. Muitos anos depois, nem convém falar das bandas de axés-musics que estragaram o carnaval na avenida Mauro Ribeiro, uma moda passageira. E que assim seja, embora tenha que se pensar no carnaval para quem não tem como sair de Itabira nos três dias de folia.
Cidade sem um grande rio, o seu maior complexo de inferioridade, como dizia o itabirano Tonico Alvim, Itabira foi perdendo a pouca tradição que tinha de carnaval. Estagnou, desbotou, perdeu a cor.
É assim que, já no sábado de carnaval, bem cedinho a cidade se esvazia, com os foliões procurando outros carnavais pelo Brasil afora, principalmente onde existe água em profusão para refrescar o corpo e a alma do frenesi no tríduo momesco. E Itabira fica vazia.
Blocos carnavalescos
Pois é justamente para reunir os itabiranos que fogem do calor para outras paragens onde tem água, e carnaval, que ressurgem os blocos pré-carnavalescos.
Surgem inspirados nos até recentemente existentes blocos dos Sujos, com os homens se vestindo de Maria e as mulheres de João, uma fantasia bastante comum em todo país, mas que aqui ganhava um multidão de figurantes na sexta-feira de pré-carnaval. E que nos últimos anos deixaram de existir.
É assim que para deixar a tristeza de lado com tantas perdas incomparáveis, afinal é quase carnaval, registre-se que um bom exemplo desses novos blocos é o Madalena não Gosta de Poema (leia aqui).
Outro exemplo é o agora recém-criado República do Zé Bandarra da Rua de Baixo, que convida o folião itabirano de todos os bairros, e também o turista incidental, para um grande cortejo pré-carnavalesco pelo centro histórico, no primeiro sábado de fevereiro (3/2).
A concentração será a partir de 16 horas no Largo do Zé Bandarra (rua dos Operários) – e dispersão com grande carnaval no Largo do Batistinha. O cortejo será acompanhado por dois grandes bonecos que irão abrilhantar e alegrar a festa pré-momesca: um do Zé Bandarra e o outro representando um carnavalesco da Escola Mocidade Independente da Belinha, do bairro Bela Vista.
Os bonecos foram confeccionados pelo artista itabirano Sérgio Diaz, ex-Drummonzinho. Os abadás (camisetas) da República de Zé Bandarra podem ser adquiridos por módicos R$ 30 com Marconi Ferreira, Terezinha Souza ou Margareth Duarte, A proposta é colorir o centro histórico de Itabira com as cores do carnaval com os abadás.
“Nossa ideia é retornar com a folia momesca itabirana como era: botando os blocos na rua”, diz Maria Amélia Figueiredo, uma das organizadoras do bloco.
Quem sabe assim o espírito momesco baixe em todos os foliões e o bloco permaneça pelo centro histórico também durante o Carnaval? Com certeza, essa é uma boa ideia. Outra seria um encontro entre os carnavalescos dos blocos Madalena não Gosta de Poema com a República do Zé Bandarra da Rua de Baixo.
Personagem
Conforme conta Marconi Ferreira, Zé Bandarra foi um personagem itabirano divertido e carismático, que marcou época em Itabira fazendo sucesso nas décadas de 1930/40.
“Ele era um festeiro contumaz, morador da rua de Baixo (atual rua dos Operários0”, conta o escritor, poeta e carnavalesco itabirano, um dos organizadores do bloco.
“Zé Bandarra expressava aquilo que tem de melhor na festa momesca, que é a alegria e a vontade de se divertir com as coisas simples. Era uma pessoa de bem com a vida”, diz. Marconi foi também um dos fundadores da Escola Mocidade Independente da Belinha, do bairro Bela Vista.
“Bandarra vestia-se sempre alinhado. Ao subir a rua Santana, quando os moradores perguntavam aonde ele ia, dizia ir ver o alinhamento dos planetas no pico do Cauê. Era também um futurista. Ele olhava para a lua e dizia: ‘um dia o homem vai pisar em você, mas no sol ele nunca vai chegar’”, conta Marconi, descrevendo o perfil de seu parente não tão distante. “Ele é da família Reis, fundadores da banda Santa Cecília.”
No tempo de Bandarra, conta Marconi, o carnaval itabirano marcou época também na região onde viveu o carnavalesco. “Começava na rua dos Operários, onde era a zona boêmia da cidade. Os mascarados saiam de lá em cortejo até o bar do Mundico (ficava na mesma rua, já próximo de onde hoje é a avenida Daniel Grisolia). “Naquele tempo, quem era alegre e divertido era chamado de Zé Bandarra”, homenageia.
Com o cortejo, o bloco Zé Bandarra da Rua de Baixo irá relembrar todos os carnavalescos itabiranos: Dedé (ex-motorista de Daniel Grisolia), Tobias (Escola de Samba Gente Humilde de Itabira), Dona Dulce (Unidos de Itabira), TiMurilo (9 de outubro), Escola de Samba Mocidade da Belinha, Flor de Liz, Canto do Juriti.
“Vamos homenagear essas pessoas maravilhosas que fizeram o melhor carnaval de Itabira e que infelizmente acabou”, promete Marconi Ferreira.
Esquentando os tambores e atabaques
Para este ano, o bloco pré-carnavalesco Madalena não Gosta de Poema anuncia para o dia 13 de janeiro uma matinê para crianças e adultos (Madaleninha não Gosta de Poeminha), em frente ao bar do Raimundinho, no bairro Pará.
Na data chega triunfalmente em Itabira o boneco gigante da Madalena, vindo diretamente de Olinda (PE) para desfilar nas ruas da Cidadezinha Qualquer. “Madalena vai fixar residência em Itabira e daqui não sai mais”, assegura Herbert Rosa, criador do bloco.
E para o dia 27, Madá, como o bloco é carinhosamente chamado, promete um grande desfile carnavalesco saindo do adro da Catedral, passando pelo centro histórico, carnavalizando a tarde da cidade até o cair da noite com concentração também no bar do Raimundinho.
Uma semana depois começa a festa em homenagem a Momo. E a cidadezinha deve voltar à mesmice de sempre, torcendo para que pelo menos aconteça o carnaval nas pracinhas do Pará e Campestre. E que assim não se perca por completo as poucas tradições carnavalescas que ainda restam. Saravá, Evoé Momo.
Muito boa a matéria e o resgate da alegria e personagens do carnaval de Itabira. Que venham os foliões!!!!
Boa noite!
Em que ano o nosso grande canarvalesco Zeferino, também estilista, faleceu?
Obrigada.