Nas mãos de D´us – Alfama e o Museu Judaico de Lisboa
Mauro Andrade Moura
Coisas do destino, seria inexplicável não fosse a Mão de D´us.
Estando eu em Damaia, seguia firme a primavera ensolarada lusitana de 2016. Apanho o trem, mais próprio é o comboio, com o pensamento de descer na estação do Rocio, em Lisboa.
Passa alguns minutos e percebo que, como bom caipira mineiro, apanhei o comboio no sentido contrário e iria sair diretamente em alguma estação do Ribatejo, totalmente ao oposto das minhas intenções naquele terceiro dia que havia chegado a Portugal.
Como quem tem boca vai a Roma, perguntei a um outro passageiro e o mesmo de pronto e com total cortesia me dá as direções precisas para um lugar próximo ao rumo pretendido.
De acordo com a informação, desci na estação Braço de Prata, mudei para o outro lado da linha, melhor dizendo caminho de ferro, para apanhar o comboio que me traria de volta a Lisboa.
Aproveitei o interlúdio para ligar ao amigo professor António Maria de Assis e comunicar a minha chegada à “terrinha”. O tempo era solto e o dia corria lentamente e já com a temperatura indo às alturas.
Subo no vagão, ops, carruagem, e sigo meu novo rumo, um destino conduzido pelo inesperado.
Passado um bom tempo e chego à estação de Santa Apolónia, pouco menos majestosa que a do Rocio, porém imponente aos olhos pouco acostumados a grandes estações de trem, por conta que no Brasil são muito poucas, apesar do meu costume de muitas viagens pela Vitória-Minas.
O Sol já se pondo a pino, o peso do fuso-horário já mandando notícias e um certo gosto de ressaca por conta desta diferença de horário e também por ter saído do costumeiro 800 metros de altitude e passar aqueles dias a zero metro – e o Tejo a correr suavemente.
Na saída da Apolónia aproveito para saborear uma bica; apesar de Minas Gerais ser a terra do café, o café expresso é pouco usual nas terras altas.
Já na rua e a apreciar o movimento bem agitado dos transeuntes, dou de cara com um enormes navios de turistas, daqueles que levam 2.000 e tantas almas a navegar e em paragens definidas pelo Atlântico.
Aproveito e vou ao Museu Militar a apreciar todo o acervo de obras de artes e antigas armas, passando pelo período medieval, a era do colonial e até bem próximo ao tempo atual. Muita diversidade e bem apresentado. Ficava ali mais tantas horas além das duas que passei perambulando de obra em obra.
Ao sair, seria para matar a saudade da minha terra, mas aqui não tem e em Lisboa tem de sobra. São os jacarandás, e como era primavera estava lá algumas espécimes bem floridas em tom roxo. Magnífico!
Bem estou já com o corpo um tanto desgastado provocado pela aventura do engano e, como conhecia bem aquela praça, resolvi caminhar e seguir sentido ao antigo Bairro da Alfama. O Museu do Fado, as tabernas e o alarido dos transeuntes e visitantes.
Vou subindo a rua, como diz o caipira, “zoiando” cada porta, cada cardápio de restaurante que já avizinhava a hora da boia/almoço.
Lisboa, época dos Santos Populares, não tinha como deixar de procurar a saborosa sardinha, quer fosse com legumes, quer fosse com pão.
Em zigue-zague, uma rua, uma viela, uma praceta e uma saudade infinda de outros dias transcorridos ali naquele bairro medieval. As bandeirolas e a lembrança das festas juninas de Minas Gerais. Sigo subindo e, eis que surge um largo maior em meio a muitas tabernas apresentando-me o inesperado.
Valeu o antigo ditado popular de “se deixar levar pelas mãos de D´us”.
Já na estação Braço de Prata deixei o dia correr, estava de férias longe, e me pus mesmo nas mãos de D´us.
Tinha a pretensão de chegar àquele largo, o Largo de São Miguel, mas alguns dias para frente e com mais calma, porém, como estava nas mãos de D´us, foi o Senhor encaminhando meu rumo até dar de frente àquele local.
Após três anos de pesquisas e dois de estudos ininterruptos da genealogia de minha família, não necessariamente em busca dos antepassados, mas em busca de quem foram eles. E a pesquisa continua.
Vários parentes mantêm o costume do estudo da genealogia, temos pelo menos oito livros publicados relacionando a maioria das pessoas, informando de alguma maneira o trajeto que fizeram de Portugal e Espanha até firmarem-se no Brasil Colonial.
Seria essencial encontrar o que os antigos antepassados foram. Qual era cristão-velho e qual era cristão-novo, pois ao determinar isto o direito à cidadania portuguesa e espanhola é desde 2015 garantido por lei aos descendentes de judeus sefaraditas.
Entretanto, como bom lusófono, prefiro ser português, pero non, hablo solamente um poquito de portuñol. Daí a necessidade de saber qual daqueles tantos me concederia esse direito de ser um “portuga de carteirinha”.
O inusitado ocorrido é que exatamente naquele Largo de São Miguel, no antigo Bairro da Alfama, será construído o MUSEU DO JUDAÍSMO DE LISBOA e para lá levou-me “certo por caminho tortuoso” o nosso Senhor D´us.
Em 2018 completam exatos quatrocentos anos da prisão de minha décima primeira avó “Maria da Costa” nos Estaus de Lisboa e do pai dela, “João d´óculos de Elvas”, nas masmorras da santa inquisição católica de Évora.
Foram presos por seis anos, espoliados e martirizados por serem cripto-judeus, não aceitaram a conversão forçada ao catolicismo e continuaram em sua religião ancestral, o judaísmo.
Que bacana, Mauro! Uma crônica sobre o Alfama e o futuro Museu Judaico.
Abs
Marcelo
Bacana mesmo foi o percurso nas “mãos de D´us”… rs
Grato pela leitura.
Estou pensando na próxima crónica: “Curral do Del Rey”
Bom dia, Moura
Grande parte da sua historia coincide com as minhas em busca das origens, e tenho algumas pesquisas feitas para o sobrenome “De Moura”…gostaria de trocar informações sobre a “Família Moura”…
Abs
Carlos José De Moura
11-977601092
Bem, Carlos José.
O meu Moura ficou bem definido quando o portuense José Luís Rodrigues de Moura veio diretamente à Itabira ainda em 1818.
Grato pela leitura,
Mauro
Adorei a leitura, a espontaneidade criativa me fez reler com prazer e senti pena de terminar tão breve.
Escreva muito mais, talento para contar histórias não se pode esperdiçar
Muito legal o texto e muito bem escrito! Uma aventura e tanto por terras lusitanas em busca das origens das quais recentemente descobri que compartilho!!
Muito bem, Antonio.
Com certeza você também descende da judia Maria da Costa.
Grato pela leitura,
Mauro
Mauro, adorei ler seu texto! Continue escrevendo e nos brindando com histórias e fatos da nossa genealogia! Um abraço, Gláucia.
Muito bem, Gláucia.
Vou tentando, o tempo é que anda escasso.
Grato pela leitura e comentário.
Mauro, que beleza de crônica! Amei a mistura de Minas com Portugal. Sensacional ver a sua dedicação e talento pela genealogia. Parabéns!