MPMG quer que a Vale cumpra a lei e contrate assessoria técnica independente para dar consultoria aos moradores do Bela Vista e Nova Vista
Reunião da Cimos com moradores Nova Vista Fotos: Carlos Cruz
Ainda sem acordo com a mineradora Vale, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), por meio da Curadoria de Meio Ambiente da Comarca de Itabira, abriu procedimento para fazer a mineradora cumprir a lei e arcar com custos da contratação de uma assessoria técnica independente para acompanhar os moradores dos bairros Bela Vista, Nova Vista.
A consultoria é para acompanhar as negociações em torno da remoção de residências para a construção de um segundo muro de contenção, chamado de estrutura de contenção à jusante (ECJ).
De acordo com a mineradora, a construção dessa estrutura é preventiva. Tem o objetivo de impedir que ocorra o arraste de material (rejeitos) para esses bairros, no caso de uma hipotética ruptura de uma das estruturas que estão sendo, ou que serão descaracterizadas, na barragem do Pontal.
A informação de que ainda não houve acordo com a mineradora para contratar a assessoria técnica independente é dos representantes da Coordenadoria de Inclusão e Mobilização Social (Cimos), órgão ligado ao MPMG.
Eles se reuniram na quinta-feira (3) com moradores dos dois bairros que serão mais atingidos pela construção da segunda estrutura. Há a possibilidade de a construção atingir também residências do bairro Jardim das Oliveiras, que também fica abaixo do Pontal.
Convocação
Mas mesmo não havendo acordo, o MPMG já publicou edital de chamamento público para selecionar organizações sociais, sem fins lucrativos, aptas e que se disponham prestar essa assessoria técnica.
A reunião da Cimos com moradores foi justamente para divulgar o edital e explicar os critérios para a contratação dessa consultoria. O prazo de inscrição das entidades teve início no dia 18 e se estende até a próxima sexta-feira (11).
Conforme o edital, para participar do chamamento a organização social precisa ter no mínimo três anos de experiencia, com atuação comprovada em assessoria às pessoas atingidas por desastres e em mobilização social.
Entre outros os pré-requisitos inclui também a independência técnica. Isso exclui consultorias que já tenham prestados serviços à Vale no país e no exterior.
Remoções
Segundo os representantes da Cimos, estudos já realizados pela própria Vale indicam que residências localizadas a menos de 13 metros da segunda estrutura de contenção à jusante, a ser construída, serão diretamente atingidas e terão de ser removidas. E as que estão a 140 metros serão impactadas por ruídos e vibrações no transcorrer das obras.
“Portanto, serão centenas de moradores expulsos de suas casas, o que já começou para 11 famílias”, afirma o engenheiro Leonardo Reis, ativista do Comitê Popular dos Atingidos pela Mineração em Itabira e na Região.
A empresa sustenta que esse número somente será conhecido após a conclusão do projeto executivo da segunda estrutura, prevista para meados deste ano.
“A empresa infringi a lei ao tentar negociar individualmente com os moradores”, disse ele, na reunião no bairro Nova Vista. “É a forma de assediar e aterrorizar os atingidos para que aceitem qualquer coisa que ela propuser”, acusou.
Segundo ele, a assessoria técnica independente deveria ter sido contratada desde que a Vale deu início à construção da primeira estrutura de contenção à jusante.
Conforme o ativista salientou, de acordo com a lei 23.795/21, que estabeleceu a Política Estadual de proteção aos atingidos, “todos que tiverem a sua vida afetada pelo risco das barragens, inclusive os quiserem permanecer nos bairros, têm direito à reparação integral.”
Antecedentes
Um antigo morador do bairro Nova Vista lembrou que ele mesmo foi vítima dessa tática de a empresa negociar individualmente com os atingidos.
Juntamente com a maioria das famílias do bairro Nova Vista, ele foi expulso pela Vale da antiga Camarinha, na Serra dos Esmeril, depois que a Prefeitura negociou o terreno onde estavam as residências, que pertencia a extinta empresa municipal Extracomil, para que fosse extraído minério de seu subsolo.
Com a conivência da Prefeitura, os moradores receberam apenas o material de construção das novas casas, que foram edificadas pelos próprios em mutirão.
“O advogado da empresa me disse que eu somente receberia o dinheiro (da indenização) depois que descobrisse a minha casa (retirasse o telhado para garantir que não continuaria no local). E viemos parar aqui, ao lado da barragem. Agora querem nos tirar novamente.”
Muitos moradores manifestaram na reunião que preferem que a empresa negocie coletivamente. E que construa um novo bairro, com padrão construtivo superior às atuais residências.
“Queremos permanecer próximos dos amigos e familiares, que é para não perder os vínculos de amizade”, acentuou outra antiga moradora do bairro, ela também ex-moradora da antiga Camarinha.