Meu pai

Carlos Drummond de Andrade

Em decisão unânime, a Câmara Municipal deu a uma avenida de Itabira o nome de Carlos de Paula Andrade. O ato conforta o coração do último filho vivo desse itabirano, falecido em 1931. Representando os seus descendentes até a terceira geração, manifesto os agradecimentos da família aos dignos vereadores, especialmente a Nitinha Drummond Lage e José Braz Torres Lage, autores da iniciativa agora convertida em lei. Estendo a gratidão aos valentes redatores de O Cometa Itabirano, que deram ressonância pública ao projeto.

O fazendeiro e ex-vereador Carlos de Paula Andrade, pai de Drummond (Foto: reprodução Altamir Barros)

A colocação do nome do velho Andrade em placa de logradouro de sua cidade natal foi ato de justiça e resgatou um esquecimento de mais de meio século. Vários itabiranos do seu tempo e outros surgidos depois, igualmente merecedores, foram alvo dessa homenagem pública. Não competia a seus filhos pleitear tal medida, tanto mais quanto um deles, o Dr. Altivo Drummond Andrade, também exerceu mais tarde a vereança.

Fui surpreendido, em 1967, por generosa iniciativa de Renato Sampaio, então integrante da Câmara, que propôs fosse dado meu nome a uma rua. Embora comovido, fiz-lhe ver a inconveniência da idéia, que desobedecia ao preceito tradicional de se só se reverenciar com homenagens desse tipo a pessoas já falecidas que fizessem jus a tanto.

Apesar do meu pronunciamento, criou-se esta situação paradoxal: o filho, que, por circunstâncias da vida, não tivera oportunidade de servir à comunidade itabirana no dia-a-dia da convivência e do trabalho, recebia indevidamente o preito devido ao pai, que por longos anos se empenhara em contribuir com o seu esforço produtivo, e com sua atividade pública nessa mesma Câmara, para o ressurgimento de Itabira, então mergulhada em triste abandono.

Eu desejaria que a atual avenida do Carlos mais moço passasse a ter o nome do Carlos antigo. Isto não foi possível, mas, de qualquer modo, a ilustrada Câmara pesou os serviços de meu pai a Itabira e reconheceu-os através da lei aprovada em 2 de agosto de 1983. Deixo aqui registrado o meu, o nosso profundo reconhecimento.

Ilustração: Genin Guerra

Nota da redação

Esse  texto de Drummond foi publicado em setembro de 1983, na edição 52 do jornal O Cometa Itabirano, em agradecimento à homenagem que a Câmara Municipal e o então prefeito José Maurício Silva (1983-88) prestaram ao seu pai, o fazendeiro e ex-vereador Carlos de Paula Andrade (1860-1931).

Pelo projeto aprovado em 2 de agosto de 1983, e sancionado em seguida, a avenida Carlos de Paula Andrade se estenderia da praça Acrísio de Alvarenga, do trecho onde passou a findar a avenida Carlos Drummond de Andrade, até o bairro Praia, já na saída para Nova Era, cujo projeto de continuidade existia naquela época.

Drummond ficou satisfeito ao saber que a solução encontrada para homenagear o seu progenitor foi fatiar a sua avenida – sendo informado, inclusive, que o trecho em homenagem ao seu pai seria maior,  assim que concluída as obras de canalização do córrego da Penha, passando por vários bairros.  

Avenida Carlos de Paula Andrade: sem placas de identificação (Foto: Carlos Cruz)

Só que o poeta não ficou sabendo o que ocorreria em seguida. Na medida em que a avenida era construída, outros prefeitos foram fatiando-a ainda mais, homenageando aqueles que lhes eram próximos.

Jackson Tavares (1997-2000) deu nome ao trecho que construiu à Cristina Gazire, sua cunhada, que falecera durante a sua gestão, quando estava à frente da extinta TV Cultura.

E Ronaldo Magalhães, em seu primeiro mandato (2001-04), ao concluir a avenida, no bairro Praia, homenageou o seu padrinho político, o ex-prefeito Li Guerra (1993-96), falecido em 14 de novembro de 2003.

Atualmente, nas quatro esquinas desse importante logradouro público itabirano, endereço  onde a Prefeitura está instalada, não há sequer uma placa de sinalização indicando tratar-se da avenida Carlos de Paula Andrade.

 

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1 Comentário

  1. A desdrumondização da avenida foi uma causa do professor Arp Procópio, o primeiro e único embaixador do Principado Livre do Matto Dentro, uma vitória!
    Agora é preciso uma campanha para restituir a placa do Padre Ze Lopão.
    A ilustração do Genin é um colosso. Recentemente fui ao Theatro Municipal de Niterói – Sala Carlos Couto – apreciar a exposição Quem ti viu, quem ti vê, de caricaturas e charges, para homenagear o Chico Buarque, filho do Sérgio, e lá estava Genin; há muito eu não via o Genin de perto. Aquela visão me deu profunda satisfação, aquele friozinho na ponta da barriga que significa prazer. E voltei pra casa pensando no Genin como um dos mais importantes artistas de Itabira, dado que é a arte que move o prazer, a alegria é que abre a mente humana às perspectivas de futuro. E o Genin, assim como o poeta Drummond é fininho, levinho e com força para criar grandiosidades. Por último, venho conclamar uma estátua do Genin de mãos dadas com o poeta, para Itabira não esquecer. Obrigada Genin. E por último: o jornalista Carlos é um privilegiado de poder contar com o Genin, parabrabéns aos dois, um na arte e outro nas notícias. Viva o Genin!!!!

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