Mercado de pelotas de ferro cresce e Itabira pode agregar a produção dessa commodity ao seu complexo minerador

Carlos Cruz

O mercado de pelotas, minério de ferro com maior valor agregado, negociado pela Vale com prêmio que, no segundo semestre, foi superior a US$ 10 por tonelada em relação a 2017, vem ganhando cada vez mais peso no portfólio de vendas da mineradora no mundo, como também no mercado interno.

A pelotização é um processo de aglomeração de partículas de minério de ferro. Pelotas são pequenas bolinhas de minério, obtidas a partir do itabirito, minério com menor teor de ferro – inclusive com o itabirito compacto, predominante nas minas de Itabira. Esse produto depois de concentrado e aglomerado tem-se revelado a melhor matéria-prima para fabricar aço.

No segundo semestre deste ano, a produção de pelotas da Vale registrou um recorde de 12,8 milhões de toneladas (Mt). Isso se deve à crescente demanda pela commodity, o que levou a empresa reativar as plantas de pelotização de Tubarão I e II, em Vitória (ES).

Pelotas são aglomerados de minério de ferro com grande procura pelos mercados interno e externo (Fotos: Divulgação/Vale)

Com isso, a mineradora dá continuidade ao projeto de expansão de sua produção de pelotas, que havia sido interrompido com a crise. Antes, em 2014, já havia dado início à operação de sua oitava usina de pelotização, a maior de Tubarão. O investimento foi de US$ 1,3 bilhão e a usina tem capacidade para produzir 7 Mt de pelotas por ano.

Em Minas Gerais, em setembro de 2009 a Vale inaugurou uma usina de concentração acoplada a uma pelotizadora com capacidade nominal para produzir 10 Mt de minério de ferro e 7 Mt de pelotas por ano – um investimento de US$ 2,3 bilhões. A usina beneficia itabiritos das minas de Vargem Grande, em Nova Lima, e Pico, no município de Itabirito.

Com o reinício da operação da planta de pelotização de São Luís (MA), a produção da Vale de pelotas deve atingir 55 Mt no início do próximo trimestre, com incremento considerável na produção dessa valorizada commodity que gera prêmios substanciais – um objetivo que a empresa busca obstinadamente como diferencial de mercado e para a geração de caixa.

A Vale tem ainda duas usinas pelotizadoras em Omã, na costa sudeste da Península Arábica. E participa de joint ventures na China também para produção de pelotas.

“O mundo não quer mais sinter-feed, quer pelotas. Isso por causa do problema do meio ambiente”, já anunciava em 1994 o ex-superintendente da Vale Ricardo Dequech, em entrevista ao jornal O Cometa.

“A tendência para o mercado de pelotas é de crescimento, inclusive no mercado interno. E Itabira pode se beneficiar com isso”, anunciou na mesma entrevista o ex-superintendente, para quem o melhor lugar em Minas Gerais para se instalar uma usina de pelotização para suprir o mercado interno é Itabira. “A pelota vai direto para o alto-forno e polui menos.”

Descomissionamento

Com a recuperação do mercado global de minério de ferro, o viés é também de crescimento da produção de pelotas. Com essa perspectiva, é hora de ser  pautada, assim que tiver início as negociações com a Vale em decorrência do descomissionamento (fechamento) de suas minas, previsto para 2028, a possibilidade de se instalar em Itabira uma usina de pelotização.

De acordo com Dequech, essa usina de pelotização pode ser instalada no complexo Conceição, utilizando-se do próprio circuito fechado de circulação da água que atualmente supre as usinas de concentração. “Não haverá necessidade de acréscimo de água ‘nova’, o que também implica em redução de custos”, acrescentou.

Portanto, senhores e senhoras, negociadoras e negociadores do que virá a ser feito para o fim das minas de Itabira não ser mais uma derrota incomparável: está aí mais uma alternativa, entre tantas, para que a Vale perenize a sua permanência no complexo de Itabira, para que aqui fique por muito mais tempo além do já próximo ano de 2028.

Empregos e controle ambiental

Usina 8 de pelotização, em Tubarão, Vitória (ES), emprega alta tecnologia de produção e controle ambiental

Na oitava e última planta de pelotização instalada pela Vale em Vitória são gerados cerca de 400 empregos diretos. Conforme foi anunciado pela empresa por ocasião de sua inauguração, a usina emprega a mais eficiente tecnologia de controle ambiental.

Reutiliza a água necessária no processo de beneficiamento, além de ter instaladas barreiras de vento (não é invenção da ex-presidente Dilma Rousseff, assegura-se), que impedem de ser lançada no ar a poeira gerada pela movimentação das pelotas.

No complexo Conceição pode ser instalada uma usina de pelotização, segundo anunciou Ricardo Dequech na década de 1990

Além disso, precipitadores eletrostáticos capturam gases e partículas poluidoras, liberando gás limpo para a atmosfera.

Uma usina semelhante a essa poderia ser acoplada às usinas de Conceição – quem sabe até mesmo uma segunda, a ser instalada junto a já renovada usina Cauê.

Não se trata de ideia esdrúxula, como podem imaginar os desinformados dessa tendência.

Se é mesmo para valer o anúncio da Vale de que pretende permanecer por mais tempo em Itabira, utilizando-se de suas plantas industriais para processar minérios de outras localidades (Conceição do Mato Dentro, Morro do Pilar, Guanhães), a instalação de uma usina de pelotização pode perfeitamente virar realidade.

O trem que leva Minas pode também levar pelotas produzidas em Itabira (Foto: Eduardo Cruz)

Afinal, em Itabira estão os seus principais ativos da região Sudeste. Como já dizia Dequech, “a empresa não é boba de abandonar esses ativos”.

A instalação de uma ou duas usinas de pelotização agrega valor ao pellet-feed, cuja produção já é predominante nas plantas de concentração de Itabira. E gera mais prêmios na venda da commodity.

Para Itabira, pode representar a manutenção de centenas de empregos, impostos, serviços e oportunidades de negócios para o mercado local.

Conforme já anunciou Ricardo Dequech, o maior trem do mundo pode até deixar de levar minério de ferro. Mas pode perfeitamente transportar pelotas produzidas em Itabira para abastecer o mercado interno – e também para o mundo.

Leia a seguir trechos de uma entrevista com o ex-superintendente Ricardo Dequech, publicada no jornal O Cometa, em agosto de 1994, na qual ele fala sobre a possibilidade de a Vale instalar uma usina de pelotização em Itabira.

Entrevista

“Itabira é o melhor lugar em Minas para a Vale instalar uma usina de pelotização”, disse Dequech

Ricardo Dequech, ex-superintendente da Vale (Foto: Marcelo Prates)

O mercado de pellets tem melhorado muito, não?

Ricardo Dequech: De fato, tem melhorado. Isso em decorrência do problema do meio ambiente. Os países desenvolvidos como Alemanha, Japão, Estados Unidos etc., não querem mais a sinterização em função de que lança muita poluição na atmosfera. Para reduzir o problema da poluição em decorrência da sinterização, a pelota de minério supre muito bem, uma vez que vai direto para o alto-forno. E a tendência é a produção de pelotas ocorrer nos países produtores de matéria-prima.

Quer dizer, a poluição fica para o terceiro mundo, para Itabira, por exemplo?

Dequech: De forma alguma. A pelotização não provoca grande poluição, é insignificante perto da sinterização. A sinterização está sendo condenada e isso vai trazer benefício muito grande para o Quadrilátero Ferrífero, principalmente para Itabira, em função de que aqui temos minérios mais propícios à fabricação de pellets. É nesse contexto que estamos discutindo dentro da Vale a necessidade de encontrar um parceiro para montar uma usina de pelotização aqui em Itabira.

Por que a pelotização é menos poluente que a sinterização?

Dequech: Quando se produz o sinter, utiliza-se silo de carvão e toda a poeira que sobra da siderurgia. Tudo isso é colocado em uma esteira com um pouco de calcário, quando vai ser processada a queima do carvão junto com o minério, com exaustores violentos por baixo. Esse material fino é gerado em grande quantidade e acaba saindo pelas chaminés, lançando muita porcaria na atmosfera. Já com a pelota isso não acontece. Ela é feita em um disco com água. Utiliza-se um aglomerante para produzir a pelota, que depois é queimada no forno sem perda desses finos. Com isso, a quantidade de poeira que vai para a atmosfera é praticamente zero.

Para o caso dessa usina vir para Itabira, não haverá dificuldade em conseguir água para a pelotização?

Dequech: Não, isso não é problema. Hoje a dificuldade de água está em Vitória, onde ela é caríssima. Em Itabira a água seria a mesma do processo da usina de concentração de Conceição, onde a usina de pellets pode ser instalada. O minério viria em tubo com água, ganhando a etapa de filtragem, utilizando-se a mesma água já empregada no processo de concentração. Não haverá necessidade de acréscimo de água, o que também implica em redução de custos.

Minério de Itabira empobreceu, mas é propício à produção de pelotas (Foto: Eduardo Cruz)

Itabira apresenta então as melhores condições para aqui se instalar uma usina de pelotização?

Dequech: Se formos produzir para o mercado externo, a melhor localização é Carajás, que está jogando fora o fino de minério utilizado para produzir pelotas. Mas o mercado interno tem também uma demanda muito grande. E o que ocorre hoje é que estamos voltando com as pelotas do porto, em Vitória, para o interior de onde sai o minério. Então eu não tenho dúvidas de que cabe uma usina de pelotas no Sistema Sul para abastecer o mercado interno. E, nesse caso, a melhor localização é em Itabira.

A decisão de se instalar uma usina é política ou técnica?

Dequech: É técnica e econômica. Depende de encontrarmos um parceiro no mercado interno e para isso estamos conversando também com a Ferteco, que tem a única usina de pelotas em Minas, mas não atende à demanda. Assim como estamos conversando com a Acesita e a Usiminas.

Em termos de geração de empregos, o que significa?

Dequech: Isso vai depender do tamanho da usina. Se for com capacidade de produção de 4 milhões de toneladas/ano, vai gerar acima de 300 empregos diretos.

 

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