Lobos cinzentos atacam em Ancara

Veladimir Romano*

Muitas voltas na campa andará dando o general Mustafá Kemal Ataturk, depois de tanta golpeada, prática política recheada de ilegalidades, declarado abuso do poder, perseguições cruéis, censura a todo o transe somente ultrapassado piores dias de ditadura em outras paragens do mundo que muitos de nós já conhecemos.

Ancara, capaital da Turquia (Foto: Google)

Nos últimos tempos o governo turco ultrapassou imaginários de um sistema totalmente montado numa das maiores levianas amostras prepotentes. De convivência difícil, perpetuando-se no poder, foi de primeiro-ministro a presidente e, com vergonhosa votação referendada, se prepara ainda maior monopólio político. Agora sim, a ignorância dos votantes junto ao cambalacho de 2 milhões e meio de votos brancos caírem direitinho na conta dos vencedores [forçados], ganhando assim a farsa do referendo pela margem mínima.

Dizem que o Diabo quando chega, chega com tudo na mão. Assim parece com Recep Tayyip Erdogan, vai conseguindo mesmo tudo quanto deseja; numa votação aparentemente limpa do “Sim” em 51,3%, contra o “Não” com 48,7%; de 47,5 milhões de votantes onde mais de 80% votou.

No entanto, com dúvidas declaradas pelos observadores internacionais acusando a Comissão Eleitoral de “limpar” 2,5 milhões de votos brancos, validando estes para o AKP [Adalet ve Kalkinma Partisi] Partido da Justiça e Desenvolvimento, tomando conta da Turquia faz dez anos, chegou deste modo a uma vitória fraudulenta, tudo para mudar uma Constituição turca, impedindo o presidente de acumular mandatos e dominar leis.

Recep T. Erdogan, islâmico e conservador; do mal teria gosto e aptidão, não fosse o caso tendencioso, absolutista, homem forte comandante dos lobos mais cinzentos que a Turquia está conhecendo desde faz muito tempo com golpes e truques palacianos.

Com mais de 78,5 milhões de habitantes dispersos em quase 800 mil quilômetros quadrados, fazendo fronteira com oito nações, o general Mustafá Kemal Ataturk, em 1923, transformou um país decadente e analfabeto numa nação moderna e reformista, criando escolas públicas obrigatórias a todos, elevando o estatuto feminino, inclusivamente, um dos primeiros países europeus onde as mulheres passaram a votar, eliminando o véu entre outros aspetos menos abonatórios duma sociedade secular, republicana, particularmente laica.

Contudo, golpes de Estado e perturbação social, não tem faltado: 1960, 71, 80 e 97; sobraram governos repressivos. Com isso, certa instabilidade afastou a Turquia da Comunidade Econômica Europeia (CEE), quando em 1963, pediu adesão; retificando em 2005 a mesma, agora para a União Europeia (UE), onde emigraram desde 1946, mais de 7 milhões de turcos, nota com apreensão entrada turca na União.

Agora, com fanáticos religiosos e adornados moralistas da mentira; sim, verdadeiramente, começou a destruição das instituições democráticas que o referendo [adulterado] está consagrando. A primeira ação [e ainda não foi o referendo aprovado pelo parlamento como manda a lei], será então aprovada pena capital, quando direitos fundamentais da sociedade otomana já foram ao lixo.

O Governo fechou o “Wikipedia”, censura na “internet”, prendeu de maneira cirúrgica centenas de jornalistas enquanto se fecham jornais, emissoras, companhias televisivas, revistas; professores, funcionários de todos os quadrantes sociais, militares, até estrangeiros considerados “espiões”; tal é a cruel paranoia do governo liderado por conservadores, candidatos a ditadores.

Com 96% da população islamita, a Turquia, não deixa de ser um aglomerado multicultural onde ainda 30% da população representa uma variada multitude de etnias, como a curda, judeus, gregos, assírios, arménios, georgianos e búlgaros.

Istambul [hoje com 15 milhões] é mostra fabulosa da pujança turística de um país com sua geografia dividida entre Europa, Oriente Médio e asiático. Culturalmente forte, mas atravessando muitos desafios, instabilidade e teimosia do governo agora nas mãos de Recep Tayyip Erdogan, presidente guloso usando a Democracia para criar uma ditadura fundamentada no fanatismo religioso.

* Veladimir Romano é jornalista e escritor luso-caboverdiano

 

 

Posts Similares

1 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *