Justiça dá prazo para a Vale informar à perícia quanto já lavrou de minério em área de pesquisa da Itabiriçu Nacional na mina Conceição

Imagem: Reprodução

Segundo denúncia, a mineradora lavrou minério in situ na Mina Conceição fora do seu Manifesto de Mina e na poligonal do alvará de pesquisa da Itabiriçu. E sem licença ambiental

Carlos Cruz

Sob pena de pagar multa diária de R$ 100 mil no caso de descumprimento, limitado a R$ 1 milhão, a ser revertida em favor da Itabiriçu Nacional Pesquisa Mineral, o juiz André Luiz Alves, da 1ª Vara Cível de Itabira, determina à mineradora Vale que forneça ao perito judicial, no prazo de 20 dias, a contar do recebimento da intimação, todos os documentos necessários à realização da perícia para avaliar eventuais impactos de se realizar pesquisa geológica na barragem Itabiruçu e em pilha do que antes era considerado estéril (itabirito compacto) na mina Conceição.

No mesmo despacho, o juiz afirma que, “caso deseje, poderá ser atribuído sigilo aos documentos apresentados, com acesso somente aos sujeitos processuais”. Pena que possa ocorrer o sigilo, pois assim acontecendo, Itabira não terá acesso a essas informações importantes sobre o que acontece em seu território minerado.

A Itabiriçu Nacional é detentora de alvará de pesquisa de minério de ferro numa poligonal de 480,87 hectares na barragem Itabiruçu – e também em uma pilha de estéril na mina Conceição, em Itabira, Minas Gerais, obtido junto ao antigo Departamento Nacional da Produção Mineral (DNPM).

Entre os cinco documentos requeridos pelo perito Júlio César de Melo, esse solicita  que a mineradora “ateste qual é o volume atual de rejeito contido na barragem (Itabiruçu) e na pilha de estéril (Conceição). Quer saber também se as respectivas reservas de minério contidos no estéril e rejeito estão (sendo) aproveitadas e averbadas na ANM (Agência Nacional de Mineração).”

Por meio de um agravo de instrumento, impetrado no Tribunal Regional Federal, em Belo Horizonte, a Vale contesta esse direito – e pede também a não prorrogação da outorga.

Até então as sondagens geológicas na poligonal de pesquisa da Itabiriçu não foram realizadas, por impedimento da Vale, que não concorda com a entrada de pessoas estranhas ao seu quadro de empregados e contratos na barragem e na mina Conceição, para a realização das prospecções geológicas com furos de sondagens, alegando risco de segurança da estrutura.

Affair jurídico

Área requerida para pesquisa pela Itabiriçu, que acusa a Vale de extração ilegal de minério de ferro (Reprodução/Itabira Nacional/Google)

O imbróglio entre a Itabiriçu e a Vale é disputado em diferentes instâncias – e já teve vários capítulos, nenhum ainda conclusivo. Dentre eles, está a ação que corre na Comarca de Itabira para que seja permitido o ingresso na área da Vale para a realização da pesquisa mineral.

“A Vale, empresa que mais pesquisa subsolo alheio, até o presente momento, por meio de artifícios legais, dificulta o ingresso no terreno dela”, afirma o geólogo Everaldo Gonçalves, um dos proprietários da empresa detentora do alvará de pesquisa, professor aposentado da Universidade de São Paulo (USP) e ex-diretor do Centro de Geologia Eschwege, em Diamantina.

O geólogo Everaldo Gonçalves, em reunião pública na Câmara de Itabira, pediu o embargo do alteamento da barragem de Itabiruçu por afetar a poligonal requerida para pesquisa (Foto; Carlos Cruz)

Gonçalves também acusa a mineradora Vale de lavrar minério em pilha sobre a qual detém alvará de pesquisa na mina Conceição, onde foram depositados rejeitos contendo itabiritos compactos. “Lavrou minério de ferro in situ, por volta de 2005, em pilha na Mina Conceição, na poligonal do alvará de pesquisa da Itabiriçu”, diz ele, e acrescenta:

“Depois lavrou, a partir de 2016, conforme o gerente da Vale confessa, e está nos autos, quando foram extraídos (da antiga pilha de estéril, contendo itabirito compacto) 70 milhões de toneladas de minério de ferro (com teor) de 40%, na escala de dez milhões de toneladas ano”, denuncia o geólogo.

Reprodução/Itabiriçu Nacional/Google

“Isso é grave, não só por executar lavra ilegal, mas também por vender o minério que não está no ativo e na reserva mineral da empresa. A Vale invadiu a área (de pesquisa da Itabiriçu) e executou lavra ilegal fora da poligonal do Manifesto de Mina dela, ANM 000577/1936”, insiste Gonçalves.

Em decorrência, a Itabiriçu ingressou com ação cautelar pedindo liminar para paralisar o que chama de lavra ilegal. Por seu lado, a Vale sustenta na ação que as pilhas de estéril e o rejeito da barragem Itabiruçu são de aproveitamento dela, ainda que descartados fora da poligonal do seu manifesto de lavra.

Para isso, conta com a resolução número 85/21, da Agência Nacional de Mineração (ANM), que está sub judice, por força de um Mandado de Segurança impetrado pela Itabiriçu Nacional. “Qualquer advogado, e até um leigo, sabe que (nenhum ato jurídico) é retroativo. Contestamos essa resolução, que fere direitos adquiridos da Itabiriçu.”

Itabiruçu, alteamento

Alteamento da barragem de Itabiruçu vem ocorrendo desde a liberação da licença ambiental, mesmo tendo sido embargado pela justiça: a justificativa era que se fazia o reforço da estrutura, quando na verdade já era a base para o aumento da capacidade de armazenamento (Reprodução/Vídeo/Vale)

A Itabiriçu fez denúncias também junto a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) em relação ao alteamento da barragem Itabiruçu, já em curso e a Vale prevê concluir ainda em outubro deste ano.

“O alteamento da Barragem Itabiruçu afeta a poligonal de pesquisa da Itabiriçu”, sustenta o geólogo Everaldo Gonçalves, repetindo o que disse em reunião pública realizada pelo Conselho Estadual de Política Ambiental (Copom), na Câmara Municipal de Itabira, em 28 de junho de 2018. Segundo ele, o alteamento da barragem Itabiruçu vai ocupar 164 hectares da poligonal requerida para pesquisa pela Itabiriçu Nacional.

Viabilidade econômica

Arte: Reprodução/Itabiriçu

Com a pesquisa, explica o geólogo, pretende-se comprovar a viabilidade econômica dos recursos minerais contidos na área requerida. Pelo seu entendimento, trata-se de um minério que passou a integrar o subsolo.

E que, portanto, pertence à União – e não mais à Vale, que evidentemente não tem esse entendimento, principalmente depois que a ANM editou portaria reconhecendo esses recursos como sendo produto de lavra.

A Itabiriçu contesta, não só pela não retroatividade da resolução, mas também por definição e preceitos legais anteriores.

“As áreas com rejeito são consideradas jazidas antropogênicas, que foram geradas pela ação humana no processo de mineração. É um minério como qualquer outro. Por lei, quem quiser reaproveitá-lo precisa requerer o direito mineral. E isso a Vale não fez. Ao deixar de requerer, perdeu o direito de explorá-lo para a nossa empresa”, argumenta Everaldo Gonçalves.

Perguntado sobre o real interesse em pesquisar minério de ferro em áreas da Vale, o geólogo responde:

“A Itabiriçu quer cumprir a sua obrigação legal de realizar as pesquisas geológicas, de acordo com o seu alvará, em terreno da Vale, que é a empresa que mais pesquisa em terreno alheio, mas quando é no quintal dela, faz tudo para impedir o simples acesso à sua propriedade”, critica.

“A Vale pesquisou mal, num vício de manter o subsolo, para evitar que outro o faça, tanto que apresentou, em duas ocasiões, relatório final de pesquisa negativo. Ambos foram negados pelo antigo DNPM por insuficiência de trabalhos de pesquisa, sendo que o último foi considerado ‘abaixo da crítica’”, acrescenta o geólogo.

Ainda segundo Everaldo Gonçalves, uma vez concluída a pesquisa de minério in situ (na mina Conceição) e antropogênico (na barragem Itabiruçu), a Itabiriçu Nacional pretende explorar economicamente os produtos obtidos com o futuro direito de lavra,

Isso no caso de ser viável a sua exploração, como ele acredita que seja, por haver mercado e teor de ferro acima de 20%, podendo chegar a 40%, nas áreas da poligonal que pretende pesquisar. “A localização é ótima, inclusive a própria Vale compra minério bruto de terceiros, como também podemos vender para outros clientes.”

Outro lado

Procurada pela reportagem, a Vale responde genericamente como sempre faz, sem esclarecer as dúvidas apresentadas. Preliminarmente, diz que “não tem como prática comentar processos judiciais em andamento”. Porém, “em relação a este assunto, esclarece que:

  1. A Vale já realizou pesquisa mineral na área mencionada, tendo concluído pela inexistência de potencial geológico por meio da apresentação de Relatório Final de Pesquisa negativo, com o consequente descarte voluntário da área pela própria Vale.
  2. Os materiais (rejeitos, estéreis e produtos) porventura depositados pela Vale são de sua propriedade, nos termos da legislação minerária.
  3. A Vale não reconhece quaisquer interesses especulatórios de terceiros sobre materiais de sua propriedade.”

Para saber mais, acesse:

Empresa ganha direito de pesquisar rejeito na barragem do Itabiruçu para futura exploração

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4 Comentários

  1. Que vergonha, Itabira está prejudicando, difamando a cia Vale. É inveja do grupo fenomenal de engenheiros, administradores, advogados do mais alto nível intelectual e filosófico do Brasil, quiçá do mundo. São também dotados de profundo conhecimento do sentido pleno de soberania nacional. São homens educados na classe média, um mérito.
    É claro que o povo de Itabira “a mina” está com inveja da cia Vale. “O que seria de Itabira sem a Cia” sem a grande mãe?
    O judiciário está, como sempre, correto ao colocar o sigilo no processo, porque o povo é ignorante e pode interpretar errado todo o bem que a cia Vale faz pelo povo obtuso desta cidade, que só tem um valor: o significante minério e ouro. Itabiranos, dêem graças ao céu pela presença da cia Vale na cidade.

  2. Marisa, a Vale não desrespeita, a Vale sustenta Itabira que não seria nada sem a sua gloriosa presença. Não seja ingrata, a brilhante mineradora só quer o bem da cidade. A Vale faz tudo por Itabira e o povo está feliz. Um simples proletário da Vale tem até carro, viaja de férias para o Espírito Santo, alguns tem sítio e crianças sadias com o futuro garantido. Não seja ingrata, Ame a Vale e você será feliz para sempre

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