Justiça dá prazo de 12 meses para Incra regularizar território do quilombo Morro de Santo Antônio, em Itabira

No destaque, a matriarca Dona Tita, 100 anos, símbolo da sabedoria quilombola

A Justiça Federal determinou que a União e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) concluam, no prazo máximo de 12 meses, o processo de regularização fundiária da comunidade quilombola Morro de Santo Antônio, em Itabira (MG).

A sentença, que atende parcialmente à ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF), reconhece omissão administrativa e impõe também o pagamento de R$ 50 mil em danos morais coletivos, valor que pode ser revertido diretamente em projetos propostos pela comunidade.

Apesar do reconhecimento oficial como remanescente de quilombo desde 2011 pela Fundação Cultural Palmares, a titulação definitiva das terras segue pendente há mais de uma década. A sentença reconhece esse direito, uma vitória da comunidade frente à omissão do Estado.

Tradição, memória e resistência: os quilombos de Itabira

Dona Josefina, antiga matriarca do Morro Santo Antônio, falecida aos 108 anos, com sobrinhos, em foto de janeiro de 2000 (Foto: Taquinho)

Fundado há mais de três séculos, o quilombo Morro de Santo Antônio preserva práticas ancestrais e a liderança feminina como pilares históricos. A atual matriarca, Maria Gregória Ventura, a Dona Tita, completou 100 anos em 2024 e recebeu homenagens públicas como a criação do Ano Municipal do Centenário da Matriarca Quilombola.

Artesã e curandeira, Dona Tita é símbolo da sabedoria quilombola, retratada no documentário Tia Tita, 100 anos de luta e fé, exibido pela plataforma Vila de Utopia.

Antes dela, Dona Josefina Lucas Evangelista, a Tia Zefina, liderou a comunidade por décadas. Falecida aos 108 anos, é reverenciada por sua trajetória marcada pela resistência e sabedoria oral.

Recentemente, a Câmara Municipal aprovou a doação de um imóvel público à Associação Quilombola Morro de Santo Antônio, com cerca de 0,18 hectares, destinado à construção de sede comunitária. A comunidade também foi contemplada com ações ambientais como o plantio de ipês pelo programa Jardins da Minha Cidade.

Capoeirão

Moradores da comunidade do Capoeirão, fotografados ainda no final da pandemia, quando todos já estavam imunizados contra a Covid-19 (Foto: Reprodução)

Outro quilombo certificado em Itabira é o Capoeirão, localizado a cerca de 20 km do centro.

Reconhecido em 2019, preserva tradições como a produção artesanal de farinha, construção de casas de pau-a-pique, cultivo de sementes crioulas e artesanato em cabaça e taquara.

Seu processo fundiário segue em andamento administrativo iniciado em 2020.

Cultura e resistência

Com ações afirmativas, Itabira busca se destacar no cenário nacional como referência em práticas voltadas à igualdade racial (Foto: Acervo de Elizabeth Mendes)

A cultura quilombola tem ganhado protagonismo em Itabira por meio de ações públicas e iniciativas culturais que celebram a ancestralidade e a resistência. Desde 2021, o Festival Fala Quilombo mobiliza dezenas de comunidades da Bacia do Rio Doce com oficinas, apresentações artísticas e debates.

Em sua edição mais recente, realizada em 2024, o evento teve como tema Renda e educação para uma verdadeira abolição, reforçando o papel transformador da cultura afro-brasileira na construção de políticas públicas inclusivas.

Exposições como Identidade, Memória e Reexistência e Fala Quilombo: Uma palavra que tem história também têm contribuído para fortalecer a visibilidade das comunidades quilombolas locais. Ambas foram registradas em documentários e arquivos da Prefeitura, consolidando o compromisso com a valorização histórica e cultural dos territórios tradicionais.

Essas ações integram e reforçam a política pública em curso no município de tornar Itabira uma cidade antirracista. Entre as medidas já adotadas está a legislação municipal que institui reserva de vagas para pretos e pardos em concursos e processos seletivos da administração pública.

Com essas e outras ações afirmativas em expansão, Itabira busca se destacar no cenário nacional como referência em práticas voltadas à igualdade racial – além de ser reconhecida como a cidade natal de Carlos Drummond de Andrade.

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