Judeus e cristãos-novos na criação e colonização do Sul do Brasil

3ª parte

Por Mauro Andrade Moura

 As Bandeiras

”Vê os Pires, Camargos e Pedrosos,

Arengaras, Godóis, Cabrais, Cardosos,

Lemos, Toledos, Pais, Guerras,

Furtados.

 

E os outros que primeiro assinalados

se fizeram no arrojo das conquistas

ó sempre grandes e imortais

Paulistas!

 

Embora vós, ninfas do Tejo, embora

cante do Lusitano a voz sonora

os claros feitos do seu grande Gama

dos meus paulistas honrarei a

fama. 

Vila Rica/Cláudio Manoel da Costa

“de Alvarenga” 

Passado esse período obscuro, um dos filhos do clã dos Pires, já com muita idade (teria perto de 65 anos), inicia uma grande bandeira para o sertão de onde conhecemos hoje por Minas Gerais, acompanhado por dois filhos e um genro. Era o descendente de cristão-novo Fernão Dias Paes Leme e também casado com uma descendente de cristã-nova, a Maria Roiz Betinik (Beting), sendo ela também uma das descendentes do Garcia Roiz e Isabel Velho.

Saindo de Taubaté – SP, a Bandeira de Fernão Dias – 1674-1681 – (presumo que o mesmo buscava um novo local para sair da pressão das famílias de São Paulo), subiu e transpôs a Serra da Mantiqueira, desceu pela depressão da garganta do Embaú na passagem para as minas em busca das verdejantes esmeraldas, as quais não teve tempo de encontrar.

Cemitério do Cruzeiro, obra empreendida em 1855 por Cassemiro Carlos da Cunha Andrade, descendente dos Alvarenga, Lemes, Bueno e Godoy Moreira, casado com a prima Senhorinha dos Santos Alvarenga, neta de Francisco da Costa Lage e Senhorinha Maria Clara de Andrade, também ela Alvarenga, Lemes, Bueno e Godoy Moreira dentre outras famílias paulistas. Na entrada do cemitério do Cruzeiro notamos quatro colunas e um arco, as quais me leva a supor uma homenagem às quatro matriarcas judias – Sara, Rebeca, Lea e Raquel. Na foto em destaque, Pico do Itacolomi, Ouro Preto – MG (Fotos: Mauro Moura)

Fernão Dias e os seus comandados, inclusivamente Matias Cardoso de Almeida, seguiram o roteiro feito pela Bandeira de André de Leão de 1600 e 1601. No caminho formaram as cidades de Pouso Alto e Baependi, findando bem no centro do Quadrilátero Ferrífero na outrora Sabarabuçu (em tradução aliterada ELDORADO) e hoje Sabará/Belo Horizonte –MG.

Essencialmente, Minas Gerais surgiu a partir desta inigualável Bandeira e no seu trajeto foram sendo criados vários lugarejos além dos citados acima. E, posteriormente, vilas que serviam de rancho de parada, bem como de locais para o plantio do necessário alimento.

Uma parte dessa Bandeira foi dar no ribeirão entre Itabirito, Ouro Branco e Cachoeira do Campo, tendo esses bandeirantes faiscado lá algumas pepitas de ouro por volta de 1680.

Igreja do Rosário dos Pretos de Itabira, reformada e ampliada em 1790 por Francisco da Costa Lage, era também Tavares, sendo este casado com Senhorinha Maria Clara de Andrade, ambos Alvarenga dentre outras famílias.

No entanto, a grande descoberta de ouro nessa região se deu entre 1694 e 95, no Ribeirão do Carmo, hoje a cidade de Mariana, primeira capital de Minas Gerais, bem como primeira Comarca e Diocese.

Cachoeira do Campo não ficou de fora desse processo exploratório que culminou em grande migração dos que buscavam o Eldorado. Mas, certo, é que esses primeiros que chegaram, em sua maioria eram cristãos-novos.

O próprio Fernão Dias seguiu mais ao norte com sua Bandeira até Araçuaí, que passado algumas décadas da abertura deste caminho, em 1727 chegou ao local que na altura foi denominado como Minas Novas do Fanado; sendo esse grupo guiado por Sebastião Leme do Prado, o qual era neto do cristão-novo e sertanista João do Prado e de Filipa Vicente.

Sabido é que, com o descobrimento das muitas lavras de ouro no centro de Minas Gerais a partir de 1693 com a bandeira de Antônio Arzão, descendente do cristão-novo Martim Fernandes/Tenório de Aguilar e do genro Cornelius Arzão, tendo este sofrido com a inquisição católica, chegando em Cataguases, financiado pelo Carlos Pedroso da Silveira.

VELHOS TRONCOS MINEIROS – I

Autor Cônego Raymundo Octávio da Trindade

Página 47

13 – COSTAS CABRAES

(S. LEME, VIII – 343 a 396)

Foi progenitor desta família na Capitania de São Paulo o Capitão Manoel da Costa Cabral, nat. Da Ilha de São Miguel,

e

Página 48

Descende da ilustre casa do Senhor de Belmonte (Álvaro Gil de Carvalho), como se vê no Brasão de Armas passado em Lisboa, em 1709, a seu sobrinho Gaspar de Andrade Columbreiro, nat. Da Ilha de Stª Maria, e que foi registrado, em 1762, na Câmara de São Paulo. Casou o Capitão Manoel da Costa Cabral duas vezes: 1ª na Vila de Moji das Cruzes, com Francisca Cardoso, N3 de Vaz Guedes;

C2; mas este não interessa à Genealogia Mineira

Do seu 1º matrimônio, teve nove filhos, dos quais inscrevo a filha:

Francisca Romeiro Velho Cabral c.c. o Capitão Antônio Bicudo Leme, de alcunha Via Sacra, filho de Brás Esteves leme e Margarida Bicudo de Brito (S.Leme, 2º, 209; 6º. 298, em TÍTULOS LEMES E BICUDOS).

Dos filhos deste casal registro os dois seguintes, nascidos em Pindamonhangaba.

VELHOS TRONCOS MINEIROS – III

Autor Cônego Raymundo Octávio da Trindade

Página 24

ARZÃO

4 – “Em 16 de Março de 1763 requisitou-se huã Requisitoria de Genere pª o Arcebispo de Braga a favor de Antº Alves Ferreira e seus irmãos José Alves e outros naturais e baptizados na Fregª de Nª Sª da Conceição e Guarapirª, filhos legítimos de Capitam Antº Alves Ferreira e de sua mulher D. Anna Cabral, ele nº e baptº na Fregª de Ferreira, concº de Coura, comª de Valença, Arcebº de Braga, e ella baptª na Cathedral de Marª, netos pela parte patª de Jacinto Ferreira e de Luzia Fernandes, naturais e baptizados na Fegª de Ferreira, e pla materna netos de João Cardoso Gago e de Maria Velho Cabral, naturais da Villa de Mogi, Bispado de São Paulo…” Reg. Geral do Arceb. De mariana, a fls. 112 que servia em 1763.

e

páginas 24 e 25

BUENOS DE RIBEIRA

5 – Batismo do Capitão João Correia da Silva

“João Inocente, filho de Domingos de Castro correia e sua mulher Isabel da Silva, batizei e pus os Santos Oleos: Padrinhos Gaspar Leite e Maria Buena, aos dois de Julho de Seiscentos e Oitenta e Cinco anos, João da Rocha Moreira”. Nos autos de Genere do Padre João Correia da Silva, certidão extraída dos livros paroquiais de Santos, Bisp. De São Paulo.

 

PUBLICAÇÃO:

1955

Empresa Gráfica da “Revista dos Tribunais” Ltda.

Rua Conde de Sarzedas, 38 – S.Paulo

Cônego Raymundo Octávio da Trindade

Diretor do Museu da Inconfidência

Obs: -transcrito por Mauro Andrade Moura na Biblioteca Luís de Bessa, Praça da Liberdade, Belo Horizonte – MG, em 1º de Fevereiro de 2018.

Muitos foram as famílias paulistas, os ditos “quatrocentões”, que tiveram grande descendência no Quadrilátero Ferrífero em Minas Gerais, principalmente em Itabira, Nova Era e Rio Piracicaba.

Anotamos algumas famílias paulistas, de origem judia sefaradita, com vasta geração nesta região:

-Alvarenga, Bueno, Castilho,Tavares, Garcias Velhos, Pires, Moreira Godoys, Prado, Bicudo, Baião, Costas Cabraes, Lemes, Vaz Guedes, Nunes, Motta, Tenório, Arzão, Freitas e Nunes de Siqueira. 

Demais livros e teses consultados:

-História da Capitania de São Vicente, de Pedro Taques de Almeida Paes Leme;

-Dicionário de Bandeirantes e Sertanistas do Brasil, de Francisco de Assis Carvalho Franco;

-Cristãos-novos Jesuítas e Inquisição, do Prof. José Gonçalves Salvador;

– Os Cristãos-Novos povoamento e conquista do solo brasileiro, do Prof. José Gonaçves Salvador;

-Vozes da História, do Prof. José Gonçalves Salvador;

– Velhos Troncos Mineiros, do Cônego Raymundo Octávio da Trindade;

-A Inquisição, da Prof. Anita Noviskiy;

-Bandeirantes Paulistas no Sertão do São Francisco, autor Márcio Santos;

-A Inquisição em Minas Gerais no século XVIII, autora Prof. Neusa Fernandes;

Cristãos-novos em São Paulo (séculos XVI-XIX): assimilação e nobilitação, de Marcelo Meira Amaral Bogaciovas;

-dentre várias outras teses de doutorados e mestrados registradas nas universidades brasileira.

Entrevista Deolinda Alice dos Santos – A história de Minas Gerais, citando um festejo popular em Minas Novas com influência judaica.

Sendo a entrevistada do programa “Conheça os aspectos culturais das cidades mineiras, os costumes e as histórias de cada região de Minas Gerais”.

Breve comentário da historiadora Deolinda Alice dos Santos a respeito de Ouro Preto a partir do minuto 14:00=

https://www.youtube.com/watch?v=0fRucmnCSBA

continua… Aguarde

 

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23 Comentários

  1. Caro Mauro ou melhor, Andrade, o memorialista, não me é possível calar diante das riqueza de suas pesquisas, sua insistência, teimosia como caçador obstinado de documentos em arquivo merece consideração. A minha consideração é convidar vc para criar uma plataforma digital da memória da Cidadezinha. De minha parte tenho ideias, tenho informações e gostaria de contribuir. São várias pessoas que poderiam contribuir. Pense e se vc se interessar podemos acertar um coletivo pra discutir as ideias e tudo mais. O seu trabalho é muito valioso e não pode ficar restrito ao agora é preciso impulsioná-lo para o passado, única maneira de comprrender o presente e criar um futuro mais inteligente. Beijoca, Mauro Aníbal.

    1. Prezada Cristina, “Alvarenga” também, gostei muito dessa sua ideia de criar uma plataforma digital. Passei mais de ano dentro do Arquivo Histórico de Itabira e um bom tempo na secretaria da Cúria Diocesana daqui, além de registros de Ferros (está o seu “avô” Manoel da Costa Lage em vários dele) que recolhi.
      Não contei, não tive essa paciência e nem coragem (rs), mas devo ter pelo menos quase dez mil fotografias de documentos variados, principalmente inventários e testamentos diversos.
      No mais, prezada também “Procópio”, é conseguirmos colocar tudo no ar para todos terem acesso franco, a exemplo, já disponibilizei os livros do Pe. Pedro Vidigal, dentre outros, para quem quiser pesquisar os nomes familiares no http://www.issuu.com

  2. Parabéns Mauro Andrade Moura pela sua matéria.
    Te pergunto todos esses nomes foram citados eram Cristãos Novos (Judeus Sefarditas). Bicudo, Leme, Moreira Godoy, Antônio Rodrigues Etc…
    Obrigado
    Carlos Carvalho

    1. Bom dia, Carlos.
      Os nomes citados e o foram exatamente por terem origem sefaradita.
      Acontece de algum dos antigos não ser, porém era casado com quem o era e, assim, a geração passou a ser.
      Esses nomes fazem parte de uma pesquisa extensa.
      Grato pela leitura,
      Mauro

  3. Escusas, Fernão Dias Paes Leme, sertanista citado por V.Senhoria, não tinha o sobrenome “Leme”. Seu filho, sim, era Fernão Dias Paes Leme. O velho casou com Maria Leme, dai ter seu filho dito sobrenome, e foi o velho que adentrou os sertões de MG.

    1. Prezado António Claret, pois, exatamente o Fernão que citei era o grande Bandeirante governador das Esmeraldas e de nome Fernão Dias Paes leme e casado com a Maria Betting ou Betim.

      Essa repetição de nomes sempre provoca alguma confusão mesmo.

      Grato pela leitura,
      Mauro

      1. Meus caros, boa tarde!

        Acho que este site pode ajudar:
        https://pt.rodovid.org/wk/Pessoa:41271.

        Não localizei dois Fernão dias Paes (Leme, ou não).

        Pelo site que indiquei, há um avô do Bandeirante, chamado Fernando Dias Paes.

        Mauro, uma pergunta, por gentileza: “descendente de cristã-nova, a Maria Roiz Betinik (Beting)”. Onde você conseguiu esta informação? Pelas buscas que fiz, não encontrei documento, somente relatos. Qualquer informação é mais do que bem vinda!

        Agradeço se puderem me dar esclarecimentos.

        Alexandre
        alexandre.s.b@uol.com.br

  4. Sr Mauro.
    Como todos acima, tbem gostaria de expressar nossa apreço pelo seu trabalho.

    Poderia, por favor, me indicar quais dos nomes abaixo eram realmente criatao novos??

    Antonio Vaz Guedes,
    Bras Teves
    Salvador Pires
    O casal Isabel Velho/Roiz Garcia
    Joao do Prado

    Grata pela ajuda e continue o com seu bom trabalho!!

    Elisa

    1. Prezado leitora de nome impronuciável… rs,
      todos os nomes acima eram de cristãos-novos, porém só temos documentos comprobatórios para o Antônio Vaz Guedes e a Isabel Velho.

      Grato pela leitura,
      Mauro

        1. Estes documentos estão entremeados em diversos livros e artigos de história e genealogia.
          Somente com prolongada e constante leitura é que encontrará.
          Grato pela leitura.

        2. Fabio, boa tarde!

          Através da fonte abaixo, podemos ver que a denominação de cristã-nova à Isabel Velho apareceu em 1662:

          “Um descendente da família, homônimo do vigário da matriz de São Paulo no início do século XVII, Garcia Roiz, recebeu em 1662 impedimento por impureza de sangue. A alegação costumeira de “raça infecta” recaiu na sua bisavó materna, mãe de Isabel Velho casada com Garcia Rodrigues.”

          O processo de genere de Garcia Roiz de 1662 pode ser encontrado no link a seguir: https://www.familysearch.org/ark:/61903/3:1:939F-KN1X-F?i=2&cc=2177299

          Portanto, este é o documento que “demonstraria” Isabel Velho ser cristã nova.

          Abs!

          1. Mauro, boa noite! Eu quem agradeço o compartilhamento de seus interessantes artigos.

            Poderia me enviar os documentos que possui para Antônio Vaz Guedes?

  5. Ola Mauro!

    Eu poderia usar algum (s) desses bandeirantes para o certificado da CIL. Quais seriam aceitos por eles??

    Bueno, Garcias Velhos, Pires, Moreira , Prado, Baião, Costas Cabraes, Lemes, Vaz Guedes, Nunes, Motta, Tenório, Arzão, e Nunes de Siqueira.

    Ainda tenho Manuel Preto, Goncalo Madeira, Borba Gatos, Joao Goncalves Zarco, Cosme Fetnandes Pessoa(o bacharel se Canananeia).

    Grata!!

    1. Olá, Elisa.

      Bueno e Tenório eram espanhóis e o Arzão era huguenote das Flandres/Bélgica.
      Dos demais e devido à dificuldade ou precariedade de documentos, Garcias Velhos há alguma possibilidade.
      Dos Borba Gato, Vaz Guedes e Motta ainda precisará de documentos mais específicos.
      Grato pela leitura.

  6. SR Mauro !
    Gostaria apenas dizer que os sobrenomes como leme que e de origem flamenca (lem), e outros que não constam nesse seu site que é muito bom… antigamente dizia que nomes como oliveira carneiro eram cistão novos …mas nehum sobrenome ou apelido foi criado para os judeos que se converteram! todos os judeus convertidos usaram nome de familias antigas ! enfim o bandeirante Fernao dias paes leme (podia nao assinar leme mais o era ) nao era de origem cristao novo …como foi revelado em algun tempo depois que varias familias de cristao novos eram perseguidas mesmo apos a conversão pois muitos nao acreditavam neles, uma forma de saber se a familia tem origem era nos ritos religiosos da familia!
    E que algumas pessoas pensam que a grande maioria dos portuguese emigrados ao brasil era de origem judeo/arabe! sobre esse assunto vou escrever aqui um artigo retirado da revista do colegio genealogico!

    1. Muito bem, Sr. Antônio.

      O primeiro Fernão Dias, avô do Fernão Dias Paes Leme, foi xingado certa vez por um padre de “cão judeu”, entretanto o Governador das Esmeraldas era casado com a cristã-nova Maria Betim.
      No mais, o mais é sempre por saber, pois todos sempre procuravam alguma maneira de esconderem da santa inquisição católica.
      Grato pela leitura.

  7. Olá, Mauro,
    Pertenço à família Pires, da região de Caratinga-MG. Meu pai (Augusto Pires da Luz) tinha em seu vocabulário, algumas palavras de origem espanhola (ou italiana). De onde poderia ter vindo essa família? Meu bisavô, que nem conheci, teve uma numerosa família com 14 filhos, e se chamava Jesuíno Pires da Luz. Se me der alguma informação, ficarei muito grato, obrigado.

      1. Mauro, nao consigo encontrar o nome dos pais do Isidoro Nunes de Siqueira.(meu tetravô) minha trisavó filha dele morou e faleceu em Xanxerê SC tenho o registro dos filhos e de obito dela e do marido dela. alguma dica de como posso encontrar alguma coisa sobre o isidoro?
        um abraço

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