Itabiranos ameaçam dinamitar ferrovia da Vale  – Mentira de Jânio subleva cidade mineira

Deu no Diário Carioca, Rio de Janeiro, sábado, 8 de abril de 1961

Dinamite para evitar mudança da “Rio Doce”

BELO HORIZONTE – MG – Sérios incidentes estão se desenrolando na cidade de Itabira, no interior do Estado, onde tôda a população está no firme propósito de evitar seja cumprida a determinação do sr. Jãnio Quadros de transferir a (sede) da Cia. Vale do Rio Doce para a capital do Espírito Santo, porque o presidente da República, dando como fiadores os srs. Magalhães Pinto e Milton Campos, prometera solenemente, durante um comício lá realizado, transferir para ali a sede da Emprêsa e não cumpriu a promessa.

Enquanto fortes contingentes militares estão se deslocando para a cidade, trabalhadores, estudantes e o povo em geral, liderados pelas autoridades, espalharam dinamite nas pontes da Estrada de Ferro Vitória-Minas, para evitar que sejam transportados os apetrechos necessários à mudança da sede da companhia para Vitória. A situação está tensa e a intervenção militar pode gerar, a qualquer momento, o derramamento de sangue.

MENTIRA DE JÂNIO

No seu discurso de posse como prefeito desta urbe, em 1959, Daniel de Grisolia reafirmou o compromisso de lutar pelos direitos de Itabira frente à mineração, fazendo cumprir o que dispõem os estatutos de criação da CVRD. No destaque, o ex-presidente Jânio Quadros em campanha em Itabira, ao lado da matriz, em 1960, Em seu discurso o presidente eleito naquela eleição prometeu, e não cumpriu, transferir a sede da Vale para Itabira (Fotos: acervo de José Caetano “Tobias” Belisário. Arquivo: Vila de Utopia)

O povo de Itabira está realizando concentrações e comícios, quando a promessa do sr. Jânio Quadros, feita no período eleitoral, é repetida para realçar que se tratava de uma mentira do então candidato e hoje presidente. Na ocasião, usam da palavra líderes agrários, sindicais e estudantis que, lembrando a “mentira de Jânio”, como está sendo chamada a afirmativa eleitoreira, concitam o povo a lutar até o fim, sejam quais forem as consequências, para que a economia da região não perca sua mola impulsionadora há muito esperada: a transferência da sede da Cia. Vale do Rio Doce para o município.

ESTATUTOS DA EMPRESA

Daniel em campanha, em 1959: críticas contundentes à Vale. Nesta foto, identificados da esquerda para a direita: Gil Sapateiro, Rosinha, Jody Machado, Daniel, José do Carmo Lage, Luiza Grisolia, Heber Nunes Coelho e o povo eleitor (Acervo: Tobias/Vila de Utopia

São também lembrados, nos movimentos de protesto, que a transferência da Companhia para sede municipal é matéria determinada pelos Estatutos da emprêsa. Assim, a determinação do sr. Jânio Quadros, além de não cumprir promessa feita por ele, não teria base legal e seria obra apenas de mais um capricho presidencial.

Êsse particular foi lembrado à reportagem pelas próprias autoridades de Itabira que estão estimulando e mesmo dirigindo o movimento que, segundo elas, depois de vitorioso significará a redenção econômica de tôda a região.

RESISTÊNCIA

Diário Carioca, Rio de Janeiro, sábado, 8 de abril de 1961 (Acervo: Cristina Silveira)

Face ao aparato militar que está se observando na cidade e nas suas proximidades, é esperada a qualquer momento a ocupação que, segundo os dirigentes do movimento, não impedirá seu prosseguimento, já que mulheres e crianças estão instruídas para, caso não haja outro recurso, deitar-se sôbre os trilhos da Estrada de Ferro Vitória-Minas para evitar a passagem das composições.

Outrossim esperam-se, caso se concretize a ameaça de intervenção militar, choques entre manifestantes e as tropas cujas consequências são totalmente imprevisíveis.

SEMANA DECISIVA

“A semana que começa amanhã será decisiva” – afirmaram à reportagem os dirigentes do movimento contra a transferência da sede da Cia. Vale do Rio Doce para Vitória. Segundo adiantaram ainda, ou o presidente Jânio Quadros voltará atrás na sua determinação ou a situação assumirá proporções de extrema gravidade. “Uma coisa é certa. Tôda a cidade e mesmo a região se uniu para essa luta e não deixaremos em hipótese alguma” – disseram ainda aquêles dirigentes. (Sucursal, pelo telefone).

(Diário Carioca, Rio de Janeiro, sábado, 8 de abril de 1961, BN-Rio/pesq.mcs1375])

 

 

 

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