Incêndio florestal na região do Barreiro assusta moradores; Itabira precisa preparar para os dias piores que virão com as mudanças climáticas
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Carlos Cruz
Embora a Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMMA) sustente que o número de queimadas e incêndios florestais neste ano não tem sido maior que nos anos anteriores, não é o que se observa nesta estiagem severa e prolongada em Itabira, nos bairros e também na zona rural.
Na tarde desse domingo (15), um grande incêndio chegou próximo de residências no bairro Barreiro, assustando moradores também da região de Candidópolis. O incêndio atingiu duramente a vegetação na bacia do manancial da Pureza, que ainda abastece mais de 40% da população itabirana.
Um morador do bairro, que pede para não ter o seu nome publicado, conta que viu o fogo chegar próximo e temeu pelo pior. ”A situação teria sido pior se o Corpo de Bombeiros não combatesse o incêndio auxiliado por brigadistas”, conta.
Mas ele lamenta que esse combate só chegou quando o fogo já havia se alastrado com força. “Se o combate tivesse iniciado em menos ou mesmo em pouco mais de meia hora, certamente não teria tomado a proporção que tomou”, acredita esse morador.
Ele vê também falta de empenho da Prefeitura, das polícias Civil e Militar, extensivo ao Ministério Público de Minas Gerais, em apurar a autoria desses incêndios que são criminosos.
“Essas ocorrências devem ser investigadas com rigor, tanto pela polícia como também pelos fiscais da prefeitura que precisam sair do conforto das secretarias e irem aos bairros fiscalizar os absurdos que andam ocorrendo na cidade, a exemplo dessas queimadas, que seguem impunes todos os anos”, cobra.
“Tem que multar quem põe fogo em lotes vagos e até prender esses criminosos. Só assim o número de queimadas pode ser menor na cidade e no país nos próximos anos”, cobra o morador, que desabafa:
“O ar que respiramos aqui é da pior qualidade. Itabira é uma cidade doente pela poeira e pelas queimadas. Há 50 anos que eu não tinha doença respiratória, hoje estou sofrendo com sinusite, minha mulher está com bronquite”, diz ele.
De acordo com esse mesmo morador, os fiscais da Prefeitura de Itabira precisam sair da zona de conforto em que estão, passando a agir com mais firmeza diante desses sinistros que degradam a qualidade de vida e ambiental na cidade.
“Não tem um dia que não deparo com focos de incêndios que começam pequenos e depois ganham grande dimensão na cidade. E nada se faz para prevenir essas ocorrências e punir os responsáveis, o que seria possível se houvesse investigação logo após os sinistros, ouvindo testemunhas”, observa esse mesmo morador.
Brigadistas e Plano de Contingência
Como novidade para combater as queimadas na cidade e na zona rural, a SMMA fez parceria com o Instituto Bromélia para recrutar e treinar sete brigadistas, número que certamente será ampliado, pois é pequeno diante das demandas crescentes.
Esses brigadistas irão atuar sob a supervisão do Corpo de Bombeiros Militar, informa o secretário municipal de Meio Ambiente, Denes Lott. Com as mudanças climáticas, as previsões são de mais estiagens severas e prolongadas e, consequentemente, mais proprietários irresponsáveis e piromaníacos colocando fogo no mato seco.
Lott informa que os brigadistas serão recrutados entre agentes de parques, por meio de contratação via Instituto Bromélia, que já atua no povoado da Serra dos Alves, onde administra o Parque Natural Municipal Alto do Rio Tanque. “Eles passarão a atuar em todo município de Itabira, inclusive no combate às queimadas no perímetro urbano.”
Além disso, é preciso também repensar a legislação e as ações desenvolvidas no município para enfrentar essa nova realidade, com restruturações nas secretarias de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano, principalmente nos setores de fiscalização de posturas e impactos ambientais, na defesa dos interesses difusos e coletivos.
Conforme admite o secretário Denes Lott, a Prefeitura de Itabira não dispõe de um plano de contingência para enfrentar as queimadas urbanas e os incêndios florestais, com ações planejadas e eficazes para minimizar os danos causados por esses sinistros que tendem a agravar nos próximos anos.
Pois é urgente elaborar e aprovar esse plano de contingência, no qual devem constar ações preventivas e de combate para proteger a fauna e a flora, como também a vida das pessoas. É obrigação constitucional do município, e dos demais entes federados, proteger a população contra a degradação ambiental.
É o caso em Itabira da deterioração da qualidade do ar pela poeira da Vale, como também pelas queimadas e incêndios florestais, que vêm ocorrendo muitas vezes próximos das residências, como se viu nessa noite de domingo (15) no Barreiro, como também na noite do dia 22 de agosto, em terreno da Vale, próximo da mina Periquito.
Se não fosse a ação rápida do Corpo de Bombeiros e de brigadistas da Vale, o fogo poderia alcançar as residências vizinhas, colocando não só a vida dos moradores e animais domésticos em risco, como também as propriedades.
Um plano de contingência municipal para esses tipos de ocorrências deve ser sobretudo preventivo, com procedimentos claros e coordenados, com todos os envolvidos, brigadistas e com a população bem informada sobre como agir de forma eficiente, cuidadosa e preventiva nessas situações.
Mapeamento e treinamentos
Pelo plano de contingência há de se ter também um mapeamento de áreas mais vulneráveis, para que possam ser desenvolvidas ações preventivas e mesmo de esclarecimento à população.
Em Itabira, a região do bairro Gabiroba é a que se apresenta com o maior número de ocorrências de queimadas. É preciso desenvolver uma campanha de esclarecimento dirigida mais fortemente à essa região sobre as consequências e os riscos das queimadas em lotes vagos, inclusive denunciando quem assim age. Isso é defender os interesses difusos e coletivos da comunidade.
São respostas que a Prefeitura fica devendo à sociedade itabirana para este fim de estiagem e próximos anos. Tudo isso visando minimizar as consequências, sobretudo, das queimadas urbanas que tendem a aumentar daqui para frente. Isso se nada for feito em larga escala para mudar esse triste quadro de degradação da qualidade de vida e ambiental no município.
O que não pode é continuar como está, sem um monitoramento eficaz dessa degradação ambiental, com postos de observação de larga visão, instalados em pontos estratégicos nesta época do ano, para que os bombeiros militares e brigadistas possam agir rapidamente no combate desses sinistros.
Ações preventivas e educativas com mais fiscalização
Os agentes de fiscalização precisam também agir preventivamente e corretivamente, por ação própria e não apenas mediante denúncias, como tem sido até então, conforme confirma o secretário Denes Lott.
“Temos poucos fiscais, que atuam mediante denúncias, quando vão até o local do sinistro e notificam os proprietários com advertência”, diz o secretário, que acha difícil identificar quem provocou a queimada, quando essa não ocorre para limpeza de terreno pelo próprio proprietário e sim por ação criminosa.
Assegura também o secretário que feitas campanhas de conscientização sobre os malefícios e consequências das queimadas, mas isso praticamente só ocorreu pelas redes sociais. Foram tímidas e ineficientes por não atingir o maior número de pessoas.
Para os próximos anos é preciso desenvolver campanhas mais incisivas e por todos os meios disponíveis – e mais agressivas, apontando os ilícitos penais e penas cabíveis, inclusive pecuniária e detenção do piromaníaco, como do também do proprietário que age ilegalmente ao fazer queimadas em lotes vagos e quintais.
Denes Lott reconhece que tudo isso precisa ser repensado. Mas isso deve ser urgentemente, tanto para esse fim de estiagem, com mais de 160 dias sem chuvas significativas em Itabira, como também para os próximos anos, já prevendo que dias piores virão – e muito piores serão se nada for feito preventivamente, com ações eficazes que precisam ser desencadeadas imediatamente após a constatação de queimadas e incêndios florestais.
Se é fato que a fiscalização preventiva da Prefeitura não tem como detectar incêndios com antecedência, por razão óbvia, é preciso agir posteriormente com maior rigor e eficácia, saindo às ruas e dirigindo-se aos locais das ocorrências, identificando o proprietário, advertindo-o e autuando na forma da lei.
A Prefeitura sustenta que desenvolve campanhas educativas contra as queimadas. Mas se fato fez, essas campanhas foram insuficientes, embora possam ter ocorrido nos últimos quase quatro anos por meio de “atividades presenciais (palestras, blitz educativas etc.), peças publicitárias (cartazes, vídeos, spots, dentre outras) e divulgadas em todos os meios de comunicação utilizados pela Prefeitura”.
Se são de fato, e não de ficção, se essas campanhas ocorreram, elas foram pouco vistas e tiveram pequena repercussão. Precisam ser ampliadas daqui para frente.
Atribuições comuns e colaborativas
É preciso também acabar com esse jogo de empurra de responsabilidades entre os órgãos ambiental e de urbanismo, como se observa pela resposta da Prefeitura à reportagem:
“Segundo a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano (SMDU), o tema combate a incêndio florestal – ‘colocado de maneira ampla, como foi apresentado pelo jornalista’ – está enquadrado dentro da legislação ambiental. Nesse sentido, casos de monitoramento (das queimadas), por exemplo, não estão dentro das atribuições das equipes de servidores da SMDU”.
Claro que estão também – ou se não estão deveriam estar, pois dizem também respeito às posturas municipais, que são o conjunto de regras e observâncias estabelecidas pelo município para regular o comportamento e as atividades no espaço urbano,portanto público, visando “garantir a ordem, a segurança e o bem estar da comunidade”.
As queimadas são exemplos claros de não observância das posturas municipais, como ferem também a legislação ambiental.
“Legislação é arcaica e está em desuso”, diz SMDU
Portanto, as ações fiscalizadoras e punitivas dessas ocorrências devem ser – e se ainda não são, devem passar a ser –, atribuições das duas secretarias em ações conjuntas. Se a legislação municipal assim não determina, que ela seja alterada.
Se a legislação municipal que rege as atribuições da SMDU é antiga, de 1978, e está em desuso, segundo a própria Prefeitura de Itabira, que seja então atualizada. O que não se pode é deixar de aplicar a lei que proíbe “atear fogo em matas, áreas de campo sujas e, até mesmo em lixo dentro dos quintais”.
Diz ainda ainda a Prefeitura de Itabira na nota enviada à redação: “A SMDU atua, por exemplo, na fiscalização de lotes no perímetro urbano que estejam sujos (braquiária, mato, vegetação mais alta e intensa etc.). Esta fiscalização não é relacionada diretamente a incêndios.” Pois então, que passe a ser também.
O que não se pode é continuar agindo a reboque das denúncias de ocorrências de queimadas, como sustenta a nota da Prefeitura: “Geralmente, quando o incêndio acontece no perímetro urbano, é porque um indivíduo colocou fogo em seu terreno ou no de alguém. Assim, é feita a notificação, auto de infração (quando há flagrante) e aplicação de multa”, diz, mas sem informar o volume de multas que foram aplicadas neste ano, embora isso tenha sido solicitado pela reportagem.
“É importante ressaltar que a legislação do Código de Posturas dispõe sobre as condições de salubridade e higiene dos lotes, ou seja, o proprietário deve manter o terreno capinado, limpo, livre de sujeira. Dessa forma, a atuação dos fiscais de postura não está associada diretamente a incêndio. A questão dos lotes sujos é bem conduzida pela SMDU.”
Pois é preciso ampliar as atribuições dessas duas secretarias, que são fundamentais para a observância das legislações ambientais e das posturas municipais.
Papel constitucional
Por atuarem nos territórios onde as pessoas vivem, as prefeituras têm o dever constitucional e papel fundamental nas atuações de prevenção mediante as mudanças climáticas.
Com elas, aumentam as ocorrências de queimadas e incêndios florestais, que destroem matas ciliares e seculares, provocam assoreamento de cursos d’água, secam nascentes.
É, pois, em nome da proteção à saúde da população, pelos danos causados, pela preservação ambiental e da biodiversidade, que as prefeituras devem agir preventivamente e punitivamente quando há infrações ambientais e do código de posturas, como são as queimadas e os incêndios florestais.
Tudo isso além de investir na instalação de hortos florestais nas “áreas verdes/institucionais”, que ficam muitas vezes abandonadas (a própria prefeitura deveria ser auto multada), como meio de melhorar a qualidade do ar e regular a temperatura, amenizando o forte e crescente calor que vem por aí.
Como a ciência comprova, “áreas verdes e ambientes públicos bem cuidados promovem o bem-estar físico e mental da população”. Assim como deixam as “cidades mais preparadas para enfrentar as mudanças climáticas, tornando-as mais resilientes a desastres naturais, reduzindo perdas materiais e humanas.”
São ações, repita-se à exaustão, que ajudam combater as mudanças climáticas, assim como promovem melhorias significativas da qualidade de vida para os cidadãos, tornando Itabira uma cidade mais sustentável e boa para se viver.
Sem isso, conforme bem salientou o morador do início dessa reportagem, “Itabira vai continuar sendo uma cidade doente, poluída e degradada”, nada boa para se viver como um dia foi a Itabira do Matto Dentro.
Serviço
Para saber mais sobre a poluição do ar em Itabira pelas queimadas, incêndios florestais e pela poeira carregada de minério, acesse o Portal do Ar.
E acompanhe o panorama de Itabira mais ou menos em tempo real, com a ressalva de que esse monitoramento é feito pelo principal agente poluidor, no caso a mineradora Vale.
https://meioambiente.itabira.mg.gov.br/custom/cfg_qual_ar.aspx
A propósito, a qualidade do ar em Itabira nesta segunda-feira (16), medida pelas quatro estações da rede automática de monitoramento, apresenta-se como “moderada”, acredite quem quiser.
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