Com concentração na paróquia Santo Antônio, no bairro Gabiroba, Itabira promove carreata do Grito dos Excluídos neste sábado

Neste sábado (5), será realizada uma carreata em Itabira para marcar o tradicional Grito dos Excluídos, com concentração às 9h, na Paroquia Santo Antônio, no bairro Gabiroba. Como subsidio para reflexão, o Comitê Popular dos Atingidos pela Mineração de Itabira e Região publica o texto abaixo, em que trata do valor da vida e as ameaças à sua integridade e plenitude em Itabira. Leia e participe da carreata, mantendo o necessário distanciamento social.  

Grito dos Excluídos 2020 – Vida em Primeiro Lugar! Queremos Terra, Trabalho, Teto e Participação

Por Alan Piter Oliveira

      Carolina Peixoto Magalhães

      Ir. Sílvia Aparecida Batista, fscj

      Leonardo Ferreira Reis

      Mariane Reis Gomes

      Tuani Guimarães de Ávila Augusto*

   

Em Itabira, terra onde nascemos ou que escolhemos para viver, trabalhar e criar nossas famílias, temos resistido cotidianamente para que a vida seja prioridade! Berço da Companhia Vale do Rio Doce, mineradora estatal, hoje, privatizada, Itabira sofre com os impactos ambientais e sociais da extração mineral.

Cercada por cavas enormes e barragens maiores ainda, itabiranas e itabiranos são submetidos aos caprichos da empresa Vale, responsável pela dependência econômica, que nos transforma em reféns dos interesses empresariais. Assim ela tira nosso direito à terra e suas águas, ao trabalho digno, a um teto que nos acolha e, principalmente, à participação nas decisões sobre o destino da nossa região.

A Vale, em Itabira, emprega quase 10 mil trabalhadores, entre diretos e terceirizados, além de ser responsável por grande parte da arrecadação municipal através da Contribuição Financeira pela Exploração Mineral (Cfem) e de outros impostos.

Longe de ser um benefício para a cidade, todo este poder econômico é usado pelo poder público, submisso à empresa, para fortalecer o domínio da mineração na cidade, impedindo esforços eficientes para a diversificação econômica e a preservação do meio ambiente.

Apesar da resistência e luta por dias melhores, o povo itabirano sofre com as chantagens usados pela mineradora para atender suas vontades, como quando ameaçou de demissão seus trabalhadores e, assim, conseguiu a licença ambiental para o alteamento da barragem de Itabiruçu, em 2017.

Agora, esta ameaça é retomada, com a tentativa de impor a alteração dos turnos de trabalho de seis para 12 horas, aumentando o risco de acidentes, eliminando postos de trabalho e agravando a situação da cidade.

Outro exemplo recente foi o terrorismo causado pela pandemia da COVID-19, pois a empresa colocou seus trabalhadores e toda população em risco ao manter as operações sem qualquer cuidado. Tanto que a justiça teve que intervir e obrigá-la a tomar medidas responsáveis.

Esta pandemia tem afetado nossa região de forma muito perversa, e quem tem sentido mais são as pessoas no grupo de risco, idosos e quem possui outras doenças respiratórias e de baixa imunidade. Um olhar cuidadoso precisa ser dado a essas pessoas.

O povo negro, historicamente excluído, primeiro pela escravidão, depois pela pobreza, é aquele que está mais vulnerável, pois não tem a possibilidade de parar de trabalhar para cumprir o isolamento social ou vive no desalento por não conseguir emprego neste momento de crise econômica grave.

Os crimes que o governo Bolsonaro tem cometido nesta pandemia, tratando-a como gripezinha, tentando impedir quem mais precisa de acessar o auxílio emergencial e nos deixando à mercê da própria sorte, sem um ministro da Saúde no momento em que mais precisamos, têm agravado nossa situação, levando mais de 100.000 brasileiros e brasileiras a perder suas vidas.

O medo gerado pela pandemia desgovernada é ainda maior quando se vive embaixo de barragens, pois se saímos de casa podemos nos contaminar, se ficamos não podemos descansar com medo da lama que sempre nos ameaça.

As mais de 15 barragens em volta da área urbana de Itabira fazem com que mais de 20.000 itabiranos, moradores das áreas de alto risco de morte, vivam diariamente sob terror e não tenham um sono tranquilo preocupados com suas famílias.

Como nem a empresa Vale e muito menos a Defesa Civil de Itabira apresentou qualquer plano de emergência para o caso de rompimento da barragem de Itabiruçu, a justiça obrigou a retirada das pessoas encarceradas no presídio da cidade para áreas mais seguras.

Se por um lado é uma medida preventiva, por outro as famílias dessas pessoas estão desesperadas, pois não sabem pra onde seus entes irão e todas as famílias que moram abaixo dessa barragem passaram a se perguntar: porque nós também não somos reassentados para áreas seguras e nas condições que decidirmos coletivamente?

Cidades como Santa Maria de Itabira, Nova Era e toda bacia do Rio Piracicaba podem ter suas vidas comprometidas caso alguma dessas barragens se rompa, acabando com a qualidade das águas e com toda a produção agrícola nas proximidades desses rios, como aconteceu com a Bacia do Rio Doce e a Bacia do Rio Paraopebas.

Ainda podemos citar os impactos causados pela poluição da poeira, trazendo doenças respiratórias, o sofrimento psicossocial, seja pelo medo do rompimento das barragens, seja quando a promessa de emprego na mineradora não vira realidade, afetando a saúde mental da população.

Apesar de ser um polo em saúde para toda a região, o poder público de Itabira não valoriza como deveria a atenção básica e a saúde da família, deixando agentes de saúde à própria sorte na caminhada pelos bairros mais vulneráveis, ou enfrentando longos trajetos em condições precárias nas comunidades rurais.

Em busca desta promessa muitos camponeses e pequenos agricultores da região vieram para a cidade, mas sem conseguir uma renda digna para sustentar suas famílias, acabaram tendo que construir suas moradias em ocupações e bairros periféricos, onde os serviços públicos são eficientes apenas para reprimir a população.

Enquanto isso os lucros da Vale só crescem, rendendo R$ 984 milhões no primeiro trimestre de 2020. Precisamos reafirmar o pacto pela vida no Brasil, e tratar nossa pátria como uma nação soberana, onde o povo tenha voz e vez, rompendo com o subdesenvolvimento e a dependência econômica que o agronegócio e a mineração nos impõe.

Mas não só de chagas vivem os itabiranos, nossa história também é marcada pela luta e resistência, a começar pelo poeta Carlos Drummond de Andrade, crítico ferrenho do roubo das riquezas naturais que a cidade sempre sofreu.

A resistência dos moradores da Vila Explosivo e Vila Paciência, Rio de Peixe, expulsos pela expansão das minas e barragens da Vale, também precisam ser relembradas.

Outro movimento histórico foi a greve dos trabalhadores da Vale em 1989, que paralisou a produção por cinco dias, mobilizando outras categorias de trabalhadores da cidade, conquistando a jornada de trabalho que hoje ainda está em vigor e que a empresa tenta derrubar!

Também foi com muita força que resistimos à privatização da empresa em 1996, mobilizando patriotas e nacionalistas de todo o país contra a venda a preço de banana da estatal brasileira.

Até hoje cobramos o cumprimento das condicionantes estipuladas pela população, no ano de 2000, para aprovar a Licença de Operação Corretiva (LOC) da Vale.

Com os rompimentos das barragens da Samarco em Mariana, em 2015, e a barragem da Vale, em Brumadinho, em 2019, destruindo o Rio Doce e o Rio Paraopebas e matando centenas de pessoas, outros movimentos de resistência surgem na cidade, como o Comitê Popular dos Atingidos pela Mineração de Itabira e Região, mostrando a força da itabirana e do Itabirano para termos transparência sobre o risco das barragens.

Para vencer esta situação, é preciso pensar alternativas, ouvir as comunidades, criar programas de debates, elevar a consciência da população, garantir o direito de todos os cidadãos e cidadãs a participação na vida política.

Devemos romper o monopólio que a Vale possui sobre a economia e, principalmente, sobre o uso dos aquíferos itabiranos, pois hoje essa empresa utiliza 90% de nossas águas no tratamento de minério, provocando desabastecimento em diversos bairros.

Destruir o rio Tanque com sua transposição e aumentar a tarifa da água pra população não é a solução para este problema, queremos ter água de qualidade e na quantidade que precisamos.

Não queremos uma diversificação econômica que beneficiem o mesmo Grupão que está no poder há décadas. Precisamos de propostas de economia popular e solidária, que envolvam os mais vulneráveis, criando renda e emprego por meio da força das associações de bairro e dos movimentos sociais.

Por isso,

Gritamos em defesa das nossas águas, em defesa do meio ambiente!

Gritamos em defesa do trabalho digno, com melhores salários e segurança!

Gritamos pelo respeito aos camponeses que produzem nossos alimentos!

Gritamos por moradia, saneamento, segurança e transporte nos nossos bairros!

Gritamos por uma diversificação econômica de base popular e solidária!

Nós atingidos pela mineração, que temos nossa tranquilidade, saúde, territórios e vida roubados pela Vale, gritamos em defesa da vida em primeiro lugar!

Nós, encarcerados de Itabira, gritamos pelo fim das prisões e da lógica punitivista!

*Ativistas do Comitê Popular dos Atingidos pela Mineração de Itabira e Região

                             

 

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