As mais valias do Estado ou a grande tempestade global

Veladimir Romano*

 

Pela terceira vez em sete meses visitamos território norte africano e, novamente, nos deparamos com visitas [coincidentes] de responsáveis do Estado chinês. Marrocos está vivendo importante reviravolta na sua economia e nas suas infraestruturas; para quem conheceu Casablanca [antiga capital] desde maio do ano 1969, se impressiona no bom sentido pelo crescimento, modernismo e ordem. Porém, se deve a intervenção estatal as ideias que agora agentes privados aproveitam.

Quem por curiosidade ou obrigação profissional leu história chinesa, não fica surpreso da nova liderança internacional; pois, no século XIX, durante a dinastia Xing, também dominaram politicamente em três séculos toda uma boa parte da geografia asiática.

Em 1820, a China era então a maior economia mundial; pelo mundo, se assentavam as primeiras vias férreas, o Brasil marcava sua independência, gregos expulsavam turcos das suas terras e Portugal vivia momentos instáveis entre a monarquia e liberais, disputando o poder.

Com a revolução popular, avanços e recuos, decisões, mitos e ansiedades, faminta, noções essenciais; foram desafios entre quanta lição severamente aprendida. Ora, a grande diferença marcante dos asiáticos, particularmente chineses, contra o pensamento ou comportamentos ocidentais confrontando idênticos problemas e situações; orientais, nunca serão esmagados pelo tempo nem se deixarão enganar por futuros vendidos em leilão ocasional.

Enquanto o Ocidente investiga origens do perigeu, supondo cogitações abstratas; orientais, aplicam-no ao saber ancestral, arrastam ao longo de gerações valores filosóficos muito bem guardados, por serem respeitadores do que mais particular existe na sua cultura. Cultura essa rigidamente protegida pelo Estado e promovida.

Na década de setenta, a China era apenas mais um país pobre, com renda igual a muitas das piores nações africanas ocupando o final da cauda financeira. No entanto, durante o período de 1979 até 2014, 800 milhões destes pobres habitantes da China, saltavam de uma renda com números rondando 155 dólares/ano per capita, para 7.590 dólares anuais. Longo este caminho foi validado no esforço depois da árdua luta absorvendo 35 anos com planificação estatal, aplicando espiráculo desta sabedoria aplicada na prática.

Com 18% da população mundial, a exemplo: bem se podem juntar aqui habitantes da Nova Zelândia, Austrália, América do Norte, América Latina e ainda sobra espaço para as nações da Europa ocidental ocuparem esta geografia populacional chinesa. Dizendo que não são semelhantes; realmente, na China, nada é simples.

Aliás, o adjetivo “fácil”, escrito com apenas um carater simples; em “facilitado”, já se aplicam quatro carateres complexos demais, como “facilmente”: onde se volta ao carater inicial de “facil” mas acrescentando apenas mais um pormenor. Com três mil carateres já podemos realizar escrita, mas aplicando uma boa ginástica mental… se estás na China, sê chinês!

O tanto interesse na criação dos BRICS, junto a economias em fase crescente como Rússia, África do Sul, Índia, Brasil; entre outras nações entretanto aderentes, vai dando maior liberdade na economia chinesa, quando norte-americanos não aceitaram a moeda yuan, como veículo financeiro na ordem internacional, a ideia foi criar a pequena união de países lançados numa economia desenvolvendo outros valores.

Acumulando benefícios financeiros em 21 trilhões de dólares, em 2016, a China mostra como se constrói a primeira economia mundial [União Europeia é a segunda com ganhos de 18 trilhões enquanto os EUA não ultrapassou os 15 trilhões e meio… o que deixou em pânico o presidente Donald Trump; pois a China detém 29% da dívida pública norte-americana equivalente a 1.14 trilhões de dólares.

Alguns países ainda sofrem da grande crise; mas a China, logo arrancou com programa em 2008 onde o Estado ao invés de proteger bancos falidos, injetou 580 bilhões de dólares [20% da economia chinesa] procurando estimular o mercado. Foi criar baixa renda em habitação, infraestruturas nas áreas rurais, rodovias, caminhos de ferro, baixou taxas para maquinarias, subiu subsídios aos cereais, abriu créditos com baixo juro, eliminou quotas bancárias, mas fazendo subir microempresas combinando público-privado.

Depois, numa segunda fase, foi fazendo cair juros especuladores nas bolsas de Pequim, Xangai, Cantão e Hong Kong, até 2015, três vezes a cada dois meses. Na China, qualquer colapso, nunca será político, antes social. A todos os níveis, a China anda criando uma tempestade que sendo primeiramente local, vai passando a nível global.

Olhando para o futuro, o Estado planificou combate à corrupção, melhorou responsabilidade ecológica favorecendo processos ambientais e reformando indústrias; alterna agora o carvão com programas de usinas nucleares de quinta geração. Assim deste impacto chinês, nações como Angola, Moçambique, Cabo Verde e mais recente também Marrocos; vão recebendo aragens dessa tempestade global, igualmente desde que estes Estados aprendam da existência de tempestades positivas.

 

* Veladimir Romano é jornalista e escritor luso-caboverdiano

 

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