Artistas de Minas Gerais, e de outros estados, expõem obras no 38º Panorama da Arte Brasileira do MAM São Paulo

MEXA (criado em São Paulo, SP, Brasil, 2015) – A última ceia (abertura), 2024

 Foto: Werner Strouven

A próxima edição da bienal do MAM São Paulo, que será inaugurada em 5 de outubro, apresenta obras de Advânio Lessa, Marcus Deusdedit, Maria Lira Marques e Solange Pessoa

O Museu de Arte Moderna de São Paulo inaugura, em 5 de outubro, o 38º Panorama da Arte Brasileira: Mil Grausprojeto bienal e fundamental na história do museu, com tema que reflete as urgências do tempo presente.

A proposta curatorial do 38º Panorama da Arte Brasileira é elaborar criticamente a realidade atual do Brasil sob a noção de calor-limite — conceito que alude à uma temperatura em que tudo derrete, desmancha e se transforma.

O projeto busca traçar um horizonte multidimensional da produção artística contemporânea brasileira, estabelecendo pontos de contato e contraste entre diversas pesquisas e práticas que, em comum, compartilham uma alta intensidade energética.

A curadoria de Germano Dushá e Thiago de Paula Sousa, e curadoria-adjunta de Ariana Nuala, traz 34 artistas de diversas gerações, com pessoas nascidas na década de 1940 até chegar em outros nascidos no fim dos anos 1990 e no início dos 2000.

Dentre os 16 estados contemplados na mostra, Minas Gerais está representado por 4 artistas: Advânio Lessa, Marcus Deusdedit, Maria Lira Marques e Solange Pessoa.

A diversidade de mídias e linguagens derivadas desse corpo artístico é reflexo final da pluralidade que orientou a formulação do projeto: há artistas que trabalham com matérias orgânicas e mídias tradicionais, alguns com práticas espontâneas ligadas a conhecimentos tradicionais e outros mais vinculados a formações acadêmicas.

A esse conjunto se somam artistas que trabalham experimentações com novas mídias, tecnologias que são pouco convencionais ao circuito artístico, recursos e imagens digitais, equipamentos industriais e materiais artificiais.

Dentre os motivos que baseiam os trabalhos do grupo de artistas, estão questões como a espiritualidade, a noção de ecologia expandida, os paradoxos da tecnologia, o erotismo dos fluxos de energia e corpos pelas cidades.

Saiba mais sobre os artistas de Minas Gerais:

Advânio Lessa 

Advanio Lessa, de Lavras Novas-MG -Energia 2015-2024 (Foto: Lucas de Godoy)

Advânio Lessa nasceu e vive até hoje em Lavras Novas, distrito de Ouro Preto (MG). Tanto a sua terra de origem, marcada pela herança quilombola, quanto os ofícios de seus pais – tropeiro e cesteira -, são partes fundamentais do universo que irriga a sua poética.

Realizando esculturas de grande escala a partir de troncos de madeira de árvores mortas, raízes e trançados de cipó, o artista vincula os conhecimentos da cestaria e da marcenaria com as madeiras e fibras encontradas nas matas da região de Ouro Preto: Cipó Alho, Cipó São João, Candeia, Jacarandá, Folha Miúda e Alecrim.

É em estreito diálogo com esse repertório que Lessa, que também é agricultor, realiza suas peças. Nesse sentido, não parece enganoso afirmar que a natureza aqui é uma espécie de co-autora de suas obras.

A produção do artista ganha o mundo munida, a um só tempo, de uma intensa  eloquência formal e de uma relevante conotação discursiva. Suas esculturas, cujas escalas se aproximam àquela do corpo humano, atestam uma relação de reciprocidade entre nós e tudo aquilo que é vivo ao nosso redor.

Nesse sentido, ressoam uma tendência importante da atualidade: no lugar de epistemologias caras a um modo Ocidental de conceber o mundo, para as quais nós humanos estamos sempre em posição superior, entram em cena cosmologias onde testemunha-se uma relação não hierárquica entre todos os seres vivos.

Como proposição para o 38º Panorama, Lessa construiu uma série inédita de esculturas que aludem a uma rede formada por diferentes polos e conectadas em diferentes espaços: o MAC USP, o Museu Afro Brasil Emanuel Araujo e o Caserê.

Marcus Deusdedit 

Marcus Deusdedit (Belo Horizonte, MG, Brasil , 1997) Sem título, da série Performance, 2024, instalação multimídia, estudo da obra (Foto: Divulgação)

Graduado na Escola de Arquitetura da UFMG e mestrando pela FAUUSP, atua como artista visual produzindo na intersecção entre arte, arquitetura e design. Em sua pesquisa, explora possíveis distorções e deslocamentos estéticos dos códigos desses campos a partir de uma perspectiva negra e periférica e do exercício do remix em diferentes linguagens.

Fruto desta investigação é o | re-lab.xyz | abrigo digital e virtual para os experimentos em torno desse processo. Em sua trajetória, participou da residência artística 8ª Bolsa Pampulha, foi premiado pelo 4º Prêmio Décio Noviello de Artes Visuais e participou de uma série de exposições coletivas nos últimos anos. Atualmente têm desenvolvido experimentos entre objetos tridimensionais as mídias digitais em diversas escalas.

No 38º Panorama, Marcus Deusdedit apresenta uma obra comissionada que desdobra sua investigação sobre a edição de objetos, reformulando um equipamento de exercício físico para discutir questões sociais e políticas.

Maria Lira Marques 

Maria Lira Marques (Araçuaí, MG, Brasil, 1945). Sem título, 2021. (Foto: Edouard Fraipon)

Filha de um sapateiro e de uma lavadeira, nasceu em Araçuaí, onde vive até hoje. Desenvolveu seu interesse por cerâmica e por trabalhos manuais diversos desde criança ao ver a sua mãe, Odília Borges Nogueira, construir presépios em barro cru. Mais tarde, aprendeu com sua vizinha, conhecida como Joana Poteira, técnicas de extração e cozimento do barro.

Realizou sua primeira exposição em 1975 no Sesc Pompeia, em São Paulo e, desde então, expôs em diversas instituições nacionais e internacionais na Bélgica, Holanda, Dinamarca, França e Estados Unidos.

Sua obra é caracterizada pela integração de uma linguagem gráfica decorrente dos pigmentos naturais com a paisagem sertaneja. Desde a década de 1990, dedica-se ao corpo de trabalho conhecido como Bichos do Sertão, pinturas de animais imaginários que compõem um vasto bestiário formal.

Em seus mais de 40 anos como artista, Maria Lira coloca-se também como pesquisadora, ativista e divulgadora dos artistas e artesãos do Vale do Jequitinhonha, sobre o qual desenvolveu um longo trabalho em colaboração com o Frei Xico, frade holandês radicado no Brasil.

Com ele, também esteve à frente do Coral Trovadores do Vale, cujo repertório era formado pelo cancioneiro da região. Em 2010, fundaram o Museu de Araçuaí, criado com o objetivo de abrigar um acervo de objetos e documentos que registram a religiosidade, os usos, costumes e ofícios que constituem a história de Araçuaí.

Sua obra foi estudada pela pesquisadora Lélia Coelho Frota, uma das principais autoridades em arte popular brasileira e, em 2007, sua trajetória foi homenageada em uma peça com seu nome dirigida por João das Neves.

Realizou também exposições no Programa Sala do Artista Popular e no Museu Casa do Pontal, no Rio de Janeiro, e no Centro de Arte Popular, em Belo Horizonte. Em 2021, realizou a exposição Maria Lira Marques: Obras recentes na Bergamin & Gomide, atual Gomide&Co.

No 38º Panorama, Maria Lira Marques apresenta uma série com mais de dez desenhos sobre pedras, marcadas por figuras feitas com tons ocres, marrons e amarelos, revelando uma ecologia expressiva de plantas e bichos em suas relações entre si e com o meio.

Segundo os curadores, “é como se os resquícios do calor da terra tivessem impregnado a superfície desses fragmentos minerais, convertendo-os em testemunhos imemoriais sobre os mecanismos pelos quais a vida incorpora e se desenvolve no mundo.”

Solange Pessoa

Solange Pessoa (Ferros, MG, Brasil, 1961). Sem título, da série Dionísias, 2017 (Foto: Estúdio em Obra)

Solange Pessoa é natural de Minas Gerais, lugar marcado pelo barroco colonial e hoje uma força industrial ‘graças’ às suas atividades de extração de ferro. O mundo natural, parte central da sua prolífica obra, encontra-se tanto nos temas representados como no processo criativo, especialmente com materiais encontrados na quinta da sua família.

A matéria orgânica (terra, musgo, couro, cera, penas, cabelos, sangue, gordura…) torna-se um meio cuja evolução natural transforma as obras que compõem – cheios de vida, crescem, e às vezes caem, morrendo ao ritmo do humano reinos animal e vegetal.

Seu trabalho sugere um colapso temporal, entre o presente e um passado distante, tendo em comum a libertação de energias primordiais. Para Solange Pessoa, cada fenômeno material tem uma forma de agenciamento, numa leitura animista do mundo. Suas esculturas em pedra-sabão evocam formas ancestrais (espirais, fósseis) ou interiores corpóreos (úteros, entranhas). Comunicam-se com a instalação monumental Catedral (1990-2003).

Solange Pessoa traz para o 38º Panorama reproduções de pinturas de sua série Soníferas I (2020 – 2020) e um conjunto de obras das séries de esculturas Caveiras (2016), Fontes e tanques (2016), Mimesmas (2016) e Dionísias (2017), além de outras peças.

Sobre o Panorama da Arte Brasileira do MAM São Paulo

A série de mostras Panorama da Arte Brasileira foi iniciada em 1969 e coincidiu com a instalação do MAM São Paulo em sua sede na marquise do Parque do Ibirapuera. As primeiras edições do Panorama marcaram a história do museu por terem contribuído direta e efetivamente na formação de seu acervo de arte contemporânea.

Ao longo das 37 mostras já realizadas, o Panorama do MAM buscou estabelecer diálogos produtivos com diferentes noções sobre a produção artística brasileira, nossa história, cultura e sociedade. Realizado a cada dois anos, sempre produz novas reflexões acerca dos debates mais urgentes da contemporaneidade brasileira.

Sobre o MAM São Paulo

Fundado em 1948, o Museu de Arte Moderna de São Paulo é uma sociedade civil de interesse público, sem fins lucrativos. Sua coleção conta com mais de 5 mil obras produzidas pelos mais representativos nomes da arte moderna e contemporânea, principalmente brasileira.

Tanto o acervo quanto as exposições privilegiam o experimentalismo, abrindo-se para a pluralidade da produção artística mundial e a diversidade de interesses das sociedades contemporâneas.

O Museu mantém uma ampla grade de atividades que inclui cursos, seminários, palestras, performances, espetáculos musicais, sessões de vídeo e práticas artísticas.

O conteúdo das exposições e das atividades é acessível a todos os públicos por meio de visitas mediadas em libras, audiodescrição das obras e videoguias em Libras.

O acervo de livros, periódicos, documentos e material audiovisual é formado por 65 mil títulos. O intercâmbio com bibliotecas de museus de vários países mantém o acervo vivo.

Localizado no Parque Ibirapuera, a mais importante área verde de São Paulo, o edifício do MAM foi adaptado por Lina Bo Bardi e conta, além das salas de exposição, com ateliê, biblioteca, auditório, restaurante e uma loja onde os visitantes encontram produtos de design, livros de arte e uma linha de objetos com a marca MAM.

Os espaços do Museu se integram visualmente ao Jardim de Esculturas, projetado por Roberto Burle Marx e Haruyoshi Ono para abrigar obras da coleção. Todas as dependências são acessíveis a visitantes com necessidades especiais.

Serviço: 

38º Panorama da Arte Brasileira: Mil graus 

Curadoria: Germano Dushá, Thiago de Paula Souza
Curadoria-adjunta: Ariana Nuala
Período expositivo: 5 de outubro de 2024 a 26 de janeiro de 2025
Realização: Museu de Arte Moderna de São Paulo
Exibição em: Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, MAC USP
Locais: térreo e terceiro andar
Funcionamento: terça a domingo, das 10h às 21h
Gratuito
Mais informações em: http://mam.org.br/38panorama

 

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