A líder indígena que defende o seu povo e o meio ambiente
Rafael Jasovich*
Nesta quarta-feira (15), continua o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) do Marco Temporal, que definirá o futuro das demarcações das terras indígenas em todo país.
Amigos me recomendaram conhecer a história de uma líder indígena. Trata-se de Simone Karipuna. Ela vive em uma aldeia em Oiapoque, município popularmente lembrado como o local “mais ao norte no Brasil”.
A Terra Indígena Juminá fica na fronteira com a Guiana Francesa, cortada pelo rio Oiapoque.
Nas palavras de Simone, a reserva remete a um paraíso com animais, árvores e rios fartos de peixes que desembocam no mar.
“As pessoas viveriam por um bem maior se tivessem tido a infância maravilhosa que eu tive e tenho com meu povo”, diz. Tal paraíso não é um cenário imune a problemas, no entanto.
Durante a pandemia, lideranças indígenas do Oiapoque morreram contaminadas pela covid-19.
Quando a vacina chegou, as fake news se espalharam. Segundo Simone, correu o boato de que as vacinas introduziam microchips e provocavam doenças. “As informações falsas nos tiraram vidas”, diz.
Quem é o culpado? Todos sabem quem é e turma de negacionistas e de negócios obscuros que o seguem, nem mencionar seu nome porque é óbvio.
A líder que se encantou com movimento indígena por influência dos pais articulou campanhas de conscientização, monitorou casos e organizou barreiras para quem entra e sai do território indígena.
A maré contrária foi forte, mas todos os indígenas do Oiapoque estão vacinados.
Outra batalha esteve no horizonte: no final de agosto, Simone esteve em Brasília, participando do maior protesto indígena realizado no Brasil desde 1988.
Eram 6 mil “parentes” de diversas etnias protestando contra a possível revisão e destruição de terras indígenas em curso na capital federal, com a votação do Marco Temporal.
“Eu espero que nossas vidas indígenas possam viver sem que outros suguem a nossa terra. Quero respeito pela Mãe Terra, que consigamos ver as florestas em pé e que as políticas públicas fortaleçam nossas organizações e nossos territórios”, é o que ela reivindica como direito natural dos povos originários.
O marco temporal
O ministro Edson Fachin, do STF, confirmou seu voto contrário à tese do marco temporal das terras indígenas, que limita a demarcação dessas áreas no Brasil.
Segundo Fachin, a Constituição garante aos indígenas o direito às terras tradicionalmente ocupadas por eles.
Por essa razão, não se pode restringir esse direito apenas àqueles que estavam nas áreas à época da promulgação do texto, em outubro de 1988, como defendem entidades ligadas ao agronegócio que acompanham o julgamento.
“Autorizar, à revelia da Constituição, a perda da posse das terras tradicionais por comunidade indígena, significa o progressivo etnocídio de sua cultura, pela dispersão dos índios integrantes daquele grupo”, afirmou o ministro em seu voto.
Por enquanto o placar está 1×0. Fica a esperança de que prevaleça um Brasil que respeite os povos originários e o meio ambiente. Vai ser uma luta árdua contra podres poderes poderosos.
*Rafael Jasovich é jornalista e advogado, membro da Anistia Internacional