Etarismo é o preconceito silencioso que desrespeita os idosos, enfraquece os laços familiares e a vida em sociedade
Foto: Agência de Notícia/ IBGE
Em um país que envelhece rapidamente, o etarismo, que vem a ser o preconceito baseado na idade, se revela como uma das formas mais insidiosas de discriminação.
Embora pouco discutido, ele se manifesta em todos os cantos da sociedade: nas empresas, nas mídias, nas políticas públicas e, de forma ainda mais dolorosa, dentro das próprias famílias.
É um preconceito que, assim como a misoginia e homofobia, permanece profundamente enraizado na cultura brasileira e exige enfrentamento urgente.
Etarismo nas relações familiares: exclusão disfarçada de cuidado
O desembargador Jones Figueirêdo Alves, em artigo publicado no Consultor Jurídico, denuncia o que chama de “exclusões etaristas dentro dos confinamentos familiares”, que ele define como situações em que os idosos permanecem em casa, mas são privados de voz, autonomia e afeto.
São tratados como “peças de decoração”, presentes apenas para cumprir um papel simbólico, enquanto suas opiniões são ignoradas e suas necessidades negligenciadas.
Esse tipo de violência se apresenta muitas vezes de forma invisível, mas causa impactos profundos. A convivência familiar deveria ser espaço de acolhimento e respeito, mas se transforma em palco de conflitos geracionais alimentados por estereótipos.
O idoso é visto como ultrapassado, frágil ou incapaz, quando na verdade carrega uma bagagem de vida, um background, que enriquece a convivência e fortalece os vínculos familiares.
Expectativa de vida em alta, respeito em baixa
Segundo dados do IBGE, a expectativa de vida no Brasil chega a 76,4 anos em 2023, e a população acima dos 60 anos cresce aceleradamente.
Entre 2012 e 2022, a proporção de brasileiros com menos de 30 anos diminui, enquanto os mais velhos aumentam. Isso mostra que o país envelhece – e precisa se adaptar a essa nova realidade.
No entanto, o etarismo continua a marginalizar os idosos, como aponta a Organização Mundial da Saúde: um em cada seis idosos sofre algum tipo de violência, sendo o preconceito etário uma das formas mais comuns.
Essa exclusão fere os direitos garantidos pelo Estatuto da Pessoa Idosa e compromete o desenvolvimento de uma sociedade mais justa e igualitária. E torna os idosos “invisíveis” para a família e em sociedade.
O valor da experiência: por que precisamos dos idosos
O etarismo ignora um fato essencial: os idosos têm muito a contribuir. São pessoas que vivenciam transformações históricas, enfrentam crises, criam famílias, trabalham duro e acumulam conhecimentos que não se encontram em livros ou algoritmos.
Em um mundo cada vez mais acelerado e superficial, a escuta ativa dos mais velhos funciona como antídoto contra a intolerância e o esquecimento.
Assim como o combate à misoginia exige uma mudança cultural profunda, o enfrentamento ao etarismo demanda uma revisão de valores.
É preciso parar de associar valor humano à produtividade econômica ou à aparência jovem. Envelhecer é um privilégio e respeitar quem envelhece é um dever coletivo.
Envelhecer com dignidade é um direito
O etarismo representa um problema social grave, que afeta não apenas os idosos, mas toda a estrutura familiar e comunitária.
Ao excluir os mais velhos, a sociedade perde sabedoria, afeto e história. Ao desrespeitá-los, viola leis e princípios éticos fundamentais.
Valorizar os idosos significa valorizar nossa própria trajetória como sociedade. É construir um Brasil onde todos, independentemente da idade, recebem respeito, acolhimento e escuta.
Porque uma sociedade que não cuida de seus idosos negligencia seu próprio futuro.
*Ana Cristina Ribeiro Fraga é escritora bissexta, jornalista e educadora social.