No Brasil, 3 a cada 4 pessoas vivem em municípios com mais risco de desastres causados por chuvas; Santa Maria está incluída e Itabira tem risco de ruptura de barragens

Chuvas em Santa Maria de Itabira, em 21 de feverereiro de 2021: o triste saldo da “cabeça d’água” foram seis mortes, 2.476 pessoas atingidas, sendo que 1.085 foram desalojadas de suas casas. Situações de risco permanecem na cidade, sem que fossem adotadas medidas de prevenção

Foto: Reprodução/
Internet

Levantamento do governo federal mostra que um terço das cidades brasileiras tem alto risco para desastres; 142 delas estão no RS; Minas Gerais é o estado com maior risco de rompimento de barragens e deslizamentos, como é o caso de Itabira

Por Anna Beatriz Anjos

Infografista: Matheus Pigozzi

Edição: Bruno Fonseca

Agência Pública – Cerca de três a cada quatro brasileiros – 73% da população – vivem nos municípios mais suscetíveis a passar por algum episódio de alagamento, inundação, enxurrada ou deslizamento de terra.

Esses são os tipos de desastres relacionados a eventos extremos de chuvas, como as que atingiram o Rio Grande do Sul no início do mês e causaram a maior tragédia ambiental da história do Brasil em termos de infraestrutura e áreas afetadas.

GIF animado mostra que 73% da população do Brasil vive em municípios com alto risco de desastres causados por chuvas, como deslizamentos, enxurradas, alagamentos e inundações

Esses municípios, 1.942 no total, representam um terço (34,9%) das cidades brasileiras. Os dados são de um levantamento do governo federal, publicado em outubro de 2023, ao qual a Agência Pública teve acesso.

O estudo foi produzido sob a coordenação da Casa Civil da Presidência da República para orientar, entre outras ações, a escolha das cidades a receberem recursos do Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), uma das bandeiras do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O programa tem o critério “prevenção de riscos”, no qual é prevista a construção de contenção de encostas, sistema de macrodrenagem, barragens de regularização de vazões e controle de cheias, entre outros.

Essa não é a primeira vez que o governo federal desenvolve uma lista do tipo. Uma primeira versão foi feita em 2012, durante o primeiro mandato de Dilma Rousseff (PT), no âmbito da segunda edição do PAC. Na ocasião, foram identificados 821 municípios críticos a serem priorizados. Do primeiro levantamento para o segundo, mais que dobrou a quantidade de cidades mais suscetíveis a casos de alagamento, inundação, enxurrada ou deslizamento de terra.

Por que isso importa?

  • Além do Rio Grande do Sul, que enfrenta tragédia sem precedentes em decorrência das chuvas, outras regiões do país apresentam histórico preocupante de alagamentos, inundações, enxurradas e deslizamentos de terra.

O estudo mais recente detectou 142 municípios vulneráveis no Rio Grande do Sul. O número coloca o estado como o quarto com mais municípios listados, atrás de Minas Gerais (283), Santa Catarina (207) e São Paulo (172).

Em termos de população afetada, o Rio Grande do Sul ocupa a 12ª posição entre 27 estados, com 4,1% de seus habitantes vivendo em áreas de risco para desastres.

O percentual é calculado com base na quantidade de pessoas morando nesses locais em cada cidade, mas o dado está disponível para apenas 825 das 1.942 listadas. À medida que a estimativa for feita para novos municípios, as proporções estaduais podem ser alteradas.GIF animado mostra que desastres causados por chuvas como inundações, alagamentos, deslizamentos etc, já deixaram 8 milhões de desalojados

Regina Alvalá, diretora do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), órgão vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação que ajudou a elaborar o levantamento, explicou à Pública que a metodologia foi construída com base na combinação de séries históricas de diferentes indicadores – como registros de desastres e óbitos e desalojamentos relacionados a desastres – referentes ao período de 1991 a 2022.

Por isso, precisa ser constantemente atualizada, já que as mudanças do clima aumentam de modo progressivo a frequência e intensidade de eventos extremos, como as chuvas que assolaram o estado gaúcho.

Após a tragédia sem precedentes ainda em curso, é provável que aumentem os números de pessoas vivendo em municípios de risco no estado.

“O Rio Grande do Sul não era tão afetado [por desastres associados a eventos extremos] quanto passou a ser, os números do estado não eram tão ruins quanto os de outros”, destaca. “Havia histórico de desastres, mas não tão alarmantes quanto o de agora. E, nesta década, os eventos extremos estão realmente mais frequentes e intensos, por isso, acabam causando mais desastres.”

Mapa mostra municípios em Pernambuco com maior risco de desastre
Confira os municípios aqui
Afogados da Ingazeira
Agrestina
Água Preta
Águas Belas
Altinho
Amaraji
Araripina
Arcoverde
Barra de Guabiraba
Barreiros
Belém de Maria
Belo Jardim
Betânia
Bezerros
Bodocó
Bom Conselho
Bom Jardim
Bonito
Buíque
Cabo de Santo Agostinho
Cabrobó
Cachoeirinha
Camaragibe
Canhotinho
Capoeiras
Caruaru
Catende
Chã Grande
Correntes
Cortês
Cumaru
Cupira
Escada
Exu
Floresta
Gameleira
Garanhuns
Goiana
Granito
Gravatá
Iati
Ibimirim
Igarassu
Ilha de Itamaracá
Inajá
Ipojuca
Ipubi
Itaíba
Jaboatão dos Guararapes
Jaqueira
Joaquim Nabuco
Jurema
Lagoa dos Gatos
Lagoa Grande
Lajedo
Limoeiro
Macaparana
Maraial
Moreno
Nazaré da Mata
Olinda
Orocó
Palmares
Palmeirina
Panelas
Parnamirim
Paudalho
Paulista
Pedra
Pesqueira
Petrolina
Poção
Pombos
Primavera
Quipapá
Quixaba
Recife
Riacho das Almas
Ribeirão
Rio Formoso
Sanharó
Santa Filomena
Santa Maria da Boa Vista
São Benedito do Sul
São Bento do Una
São Caitano
São João
São Joaquim do Monte
São José da Coroa Grande
São Lourenço da Mata
São Vicente Férrer
Serra Talhada
Sertânia
Sirinhaém
Surubim
Tabira
Tacaimbó
Tamandaré
Timbaúba
Tracunhaém
Trindade
Venturosa
Vicência
Vitória de Santo Antão
Xexéu
Mapa mostra municípios na Bahia com maior risco de desastre
Confira os municípios aqui
Aiquara
Alcobaça
Amargosa
América Dourada
Anagé
Araci
Aratuípe
Aurelino Leal
Barra
Barra do Rocha
Belmonte
Bom Jesus da Lapa
Cairu
Camacan
Camaçari
Camamu
Campo Formoso
Canavieiras
Candeias
Capela do Alto Alegre
Cardeal da Silva
Carinhanha
Catu
Cícero Dantas
Coaraci
Conceição do Almeida
Conde
Coronel João Sá
Dário Meira
Entre Rios
Eunápolis
Feira de Santana
Filadélfia
Floresta Azul
Gandu
Gavião
Gongogi
Guaratinga
Ibicaraí
Ibicuí
Ibotirama
Igaporã
Ilhéus
Ipiaú
Irecê
Itaberaba
Itabuna
Itacaré
Itagi
Itagibá
Itagimirim
Itaju do Colônia
Itajuípe
Itamaraju
Itambé
Itapé
Itapetinga
Itapicuru
Itapitanga
Itaquara
Itiúba
Itororó
Ituberá
Jacobina
Jaguaquara
Jaguarari
Jandaíra
Jequié
Jiquiriçá
Jitaúna
João Dourado
Juazeiro
Jucuruçu
Laje
Lajedinho
Lapão
Lauro de Freitas
Macarani
Malhada
Maragogipe
Mascote
Medeiros Neto
Mirangaba
Morpará
Mucuri
Mundo Novo
Muquém do São Francisco
Mutuípe
Nazaré
Nilo Peçanha
Nordestina
Nova Canaã
Nova Itarana
Nova Viçosa
Olindina
Paratinga
Paripiranga
Pau Brasil
Porto Seguro
Prado
Presidente Tancredo Neves
Rafael Jambeiro
Remanso
Riachão do Jacuípe
Ribeira do Pombal
Ribeirão do Largo
Ruy Barbosa
Salvador
Santa Cruz Cabrália
Santa Inês
Santa Luzia
Santa Maria da Vitória
Santa Rita de Cássia
Santo Amaro
São Félix
São Félix do Coribe
São Sebastião do Passé
Saúde
Senhor do Bonfim
Serra do Ramalho
Serra Preta
Serrinha
Simões Filho
Tanhaçu
Taperoá
Teixeira de Freitas
Teolândia
Ubaíra
Ubaitaba
Ubatã
Uruçuca
Valença
Vereda
Vitória da Conquista
Wanderley
Wenceslau Guimarães
Xique-Xique
Mapa mostra municípios em Minas Gerais com maior risco de desastre
Confira os municípios aqui
Abadia dos Dourados
Abre Campo
Acaiaca
Açucena
Água Boa
Águas Formosas
Aimorés
Além Paraíba
Alfenas
Almenara
Alpercata
Alpinópolis
Alto Caparaó
Alto Jequitibá
Alvinópolis
Amparo do Serra
Antônio Dias
Araújos
Arinos
Astolfo Dutra
Ataléia
Barão de Cocais
Barbacena
Barra Longa
Belo Horizonte
Belo Oriente
Belo Vale
Betim
Boa Esperança
Bom Jesus do Galho
Bonfim
Brasília de Minas
Brumadinho
Buritizeiro
Cachoeira da Prata
Caeté
Caiana
Cajuri
Camanducaia
Campo Azul
Campo Belo
Cana Verde
Canaã
Candeias
Cantagalo
Caparaó
Capelinha
Capitão Enéas
Capitólio
Caputira
Caraí
Carandaí
Carangola
Caratinga
Carbonita
Careaçu
Carlos Chagas
Carmo de Minas
Carvalhos
Cataguases
Chácara
Chalé
Chapada do Norte
Cipotânea
Claro dos Poções
Coimbra
Conceição do Mato Dentro
Conceição dos Ouros
Congonhas
Conselheiro Lafaiete
Conselheiro Pena
Contagem
Coroaci
Coronel Fabriciano
Crisólita
Cristália
Descoberto
Diogo de Vasconcelos
Dionísio
Divino
Divinolândia de Minas
Divinópolis
Dom Cavati
Dom Silvério
Dona Euzébia
Dores de Guanhães
Elói Mendes
Engenheiro Caldas
Entre Folhas
Entre Rios de Minas
Ervália
Esmeraldas
Espera Feliz
Eugenópolis
Ewbank da Câmara
Fernandes Tourinho
Ferros
Florestal
Formiga
Francisco Sá
Franciscópolis
Frei Gaspar
Frei Inocêncio
Galiléia
Goiabeira
Governador Valadares
Guaraciaba
Guarani
Guidoval
Guiricema
Iapu
Ibirité
Inconfidentes
Inhapim
Ipanema
Ipatinga
Itabira
Itabirinha
Itabirito
Itacarambi
Itajubá
Itamarandiba
Itambacuri
Itamonte
Itanhomi
Itapecerica
Itueta
Jaboticatubas
Jaguaraçu
Jaíba
Jampruca
Janaúba
Januária
Jeceaba
Jequitaí
Joaíma
João Monlevade
Juatuba
Juiz de Fora
Ladainha
Lagoa Dourada
Lagoa Grande
Lajinha
Lambari
Lavras
Lima Duarte
Luisburgo
Machacalis
Machado
Malacacheta
Manga
Manhuaçu
Manhumirim
Mantena
Maria da Fé
Mariana
Materlândia
Mateus Leme
Matias Barbosa
Matias Cardoso
Matipó
Matozinhos
Mesquita
Miradouro
Miraí
Moeda
Monte Formoso
Montes Claros
Morro do Pilar
Munhoz
Muriaé
Mutum
Nanuque
Naque
Nova Belém
Nova Era
Nova Lima
Nova União
Novo Cruzeiro
Oliveira
Orizânia
Ouro Preto
Ouro Verde de Minas
Padre Paraíso
Palmópolis
Paraisópolis
Passa Vinte
Patos de Minas
Patrocínio do Muriaé
Pavão
Pedra Bonita
Pedras de Maria da Cruz
Pedro Leopoldo
Perdigão
Perdões
Periquito
Pescador
Piau
Pingo-d
Piranga
Pirapetinga
Pirapora
Piraúba
Poço Fundo
Pocrane
Ponte Nova
Porto Firme
Pouso Alegre
Pouso Alto
Presidente Bernardes
Presidente Olegário
Raposos
Raul Soares
Reduto
Resplendor
Ribeirão das Neves
Ribeirão Vermelho
Rio Acima
Rio Casca
Rio Espera
Rio Pardo de Minas
Rio Piracicaba
Rio Preto
Rubelita
Sabará
Sabinópolis
Salinas
Santa Bárbara
Santa Bárbara do Leste
Santa Cruz de Salinas
Santa Efigênia de Minas
Santa Luzia
Santa Margarida
Santa Maria de Itabira
Santa Rita do Sapucaí
Santana do Jacaré
Santana do Manhuaçu
Santana do Paraíso
Santana dos Montes
Santo Antônio do Itambé
Santos Dumont
São Francisco
São Gonçalo do Rio Abaixo
São João del Rei
São João do Manteninha
São João do Oriente
São João Evangelista
São João Nepomuceno
São Pedro do Suaçuí
São Pedro dos Ferros
São Romão
São Sebastião da Bela Vista
Sapucaí-Mirim
Sardoá
Sarzedo
Senador Firmino
Senhora de Oliveira
Seritinga
Serranos
Serro
Sete Lagoas
Simonésia
Taparuba
Teixeiras
Teófilo Otoni
Timóteo
Tocantins
Tombos
Três Corações
Três Marias
Tumiritinga
Ubá
Ubaporanga
Uberlândia
Unaí
União de Minas
Urucânia
Vargem Alegre
Várzea da Palma
Vespasiano
Viçosa
Virgolândia
Visconde do Rio Branco

Quando os governos não se preparam para enfrentar os efeitos desses eventos – ao adaptar a sua infraestrutura, por exemplo –, a vulnerabilidade de seus territórios vai sendo ampliada. De acordo com Alvalá, esse pode ser considerado o caso do Rio Grande do Sul: nota técnica do próprio Cemaden demonstra que, de 2016 a 2024, pelo menos cinco estudos indicaram o estado como região crítica para inundações e enxurradas quando considerados cenários futuros de aquecimento do planeta.

Diante da velocidade na transformação dos padrões climáticos imposta pelas mudanças climáticas, é necessário um monitoramento ininterrupto das áreas mais expostas aos desastres, diz. O estado e suas cidades mais afetadas pela tragédia serão detidamente estudados a partir de agora e podem ser incluídos numa atualização da lista, de acordo com a pesquisadora.

Mapa mostra o número de municípios afetados por desastres em cada região brasileira

Ministério quer criar “UTI climática” para municípios vulneráveis

Com base na lista dos 1.942 municípios mais suscetíveis a alagamentos, inundações, enxurradas e deslizamentos de terra, o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima está preparando um plano de prevenção e enfrentamento dos eventos climáticos extremos.

A estratégia começou a ser gestada pela pasta em fevereiro de 2023, quando chuvas destruíram o município de São Sebastião, no litoral norte paulista, e deixaram um rastro de 64 mortes. De acordo com a ministra Marina Silva, desde então o plano está sendo construído em conjunto com outros ministérios. Sua promessa é, em breve, levar uma proposta à análise do presidente Lula.

A ideia, conforme Marina Silva, é viabilizar uma ação contínua de prevenção de desastres nas cidades mais vulneráveis, uma espécie de “UTI climática”, como tem dito em entrevistas. Isso deve envolver um conjunto de medidas, como liberação de recursos específicos com esse fim para os municípios, assistência técnica e novos marcos regulatórios que permitam, por exemplo, a liberação mais ágil de verbas sem prejudicar a fiscalização.

O plano deve funcionar como um acelerador para o desenvolvimento de planos de adaptação dos municípios às mudanças climáticas, relatou Regina Alvalá, que tem participado das discussões. A pauta é constantemente escanteada por outros problemas considerados mais urgentes diante das limitações de orçamento.

Reportagem originalmente publicada na Agência Pública

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