Após execução judicial, Vale diz que vai pagar assessoria técnica independente aos atingidos pela descaracterização de diques no Pontal

A promotora Giuliana Fonoff reuniu com moradores para ouvir as violações de direitos e informar sobre a contratação da Assessoria Técnica Independente que vai dar assistência social e jurídica aos atingidos com a remoção de residências nos bairros Bela Vista e Pontal

Foto: Carlos Cruz

Embora a mineradora negue que esteja cerceando e dificultando a contratação da Fundação Israel Pinheiro (FIP), escolhida pelos moradores dos bairros Nova Vista e Bela Vista para prestar assessoria técnica independente (ATI), foi preciso que a promotora Giuliana Talamoni Fonoff ingressasse com ação de execução judicial, no bojo da ação civil pública que apura violação de direitos, para que a empresa enfim assumisse o pagamento dessa contratação.

A ATI é um direito dos mordores previsto na lei estadual 23.795, de 15 de janeiro de 2021. A lei instituiu a Política Estadual dos Atingidos por Barragens (PEAB), tornando obrigatória a prestação de assistência independente antes, durante e depois de instalação de novas instalações, como são os casos das duas estruturas de contenção de rejeitos (ECJ) na barragem do Pontal, principalmente em relação à segunda estrutura, entre o cordão Nova Vista, o dique Minervino e os dois bairros.

Para essa instalação será preciso remover moradores de suas residências, em número ainda não definido ou que ainda não foi divulgado pela mineradora.

Ainda de acordo com a PEAB, é direito dos moradores contarem com a assessoria técnica independente desde “as ações prévias, concomitantes e posteriores às atividades de planejamento, construção, instalação, operação, ampliação, manutenção ou mesmo desativação de barragens, sempre que sua presença possa apresentar risco (mesmo potencial) de danos às comunidades locais”.

A Vale, no entanto, vinha relutando no cumprimento dessa legislação, por entender que os moradores já contam com a assistência da Defensoria Pública de Minas Gerais, que se encontra, em decorrência dessa demanda, instalada na Comarca de Itabira, assim como estaria prestando “todos os esclarecimentos aos moradores”.

Moradores dos bairros Bela Vista e Nova Vista são historicamente impactados pela barragem do Pontal e agora ainda mais com as obras de descaracterização e com as futuras remoções para construção de uma estrutura de contenção de rejeitos

Execução

Não foi o que entendeu a curadora de Meio Ambiente do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). Daí que Giuliana Fonoff entrou com pedido de execução de sentença no bojo da Ação Civil Pública que apura a violação de direitos dos moradores com a instalação das ECJs, que a empresa considera medida de prevenção para conter rejeitos no caso de ruptura de uma dessas estruturas no processo de descaracterização em curso.

Segundo a promotora, mesmo após a realização de audiência no dia 27 de fevereiro, quando foi homologado judicialmente o Plano de Trabalho elaborado pela FIP, a empresa interpôs Agravo de Instrumento “com a pretensão de suspender os efeitos da decisão que homologou” a sua execução, recusando-se a realizar o aporte dos valores a serem pagos.

De acordo com a representante do Ministério Público, mesmo com a decisão judicial, “a Vale não pagou voluntariamente e já entrei com a execução”, disse a promotora em resposta à reportagem.

Isso mesmo depois de a Fundação Israel Pinheiro ter atendido à solicitação e apresentado, de forma pormenorizada, “qual seria o período melhor e mais viável (mensal, trimestral etc.) prazo para a devida prestação de contas acerca do trabalho realizado como assessora técnica independente, bem como a apresentação de um plano de pagamento a ser realizado pela Vale S/A, conforme plano homologado nos autos 5002708-51.2022.8.13.0317.”

Esse acerto, segundo esclareceu a FIP, deve ocorrer trimestralmente, mediante apresentação do desenvolvimento das atividades, de acordo com planilha detalhada da expectativa de gastos e o quantitativo da primeira parcela de R$ 4,8 milhões.

Foi requerida a disponibilização total desses recursos em duas parcelas semestrais, “com quitação imediata da primeira parte e previsão do segundo pagamento após seis meses, mediante a prestação de contas e declaração de conformidade de pelo menos 80% dos recursos utilizados da primeira parcela”.

Entretanto, até o ingresso do pedido de execução da sentença, em 20 de junho, a Vale não havia efetuado o depósito dos valores da primeira parcela na conta bancária da FIP. “Logo, resta claro que, embora plenamente ciente de suas obrigações, a executada deixou de cumpri-las.”

Com isso, no entendimento do MPMG, a mineradora estaria descumprindo a sentença na ação civil que reconhecu a “exigibilidade de obrigação de pagar”, de acordo com o artigo 515, inciso I, do Código de Processo Civil.

A promotora pediu também, na ação de execução, que o pagamento da primeira parcela fosse efetuado no prazo de três dias, contados a partir da citação da empresa, sob pena de penhora de bens da executada.

Outro lado

Procurada pela reportagem, a mineradora Vale disse que vem cumprindo todas as decisões proferidas pelo juízo da 1ª Vara Cível de Itabira, sem prejuízos da “interposição dos recursos cabíveis”.

“No que toca à contratação da Fundação Israel Pinheiro, a empresa esclarece que não há descumprimento da ordem judicial, na medida em que estão sendo seguidos os trâmites regulares para a contratação, inclusive com a participação do Juízo da 1ª Vara Cível e do Ministério Público. Nesse sentido, a companhia reforça que cumprirá as ordens judiciais vigentes, dentre as quais a que determinou o custeio de Assessoria Técnica.”

Para saber mais, acesse:

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