Copa Mundial de Futebol de 1954 ou a Batalha de Berna
Foto: Reprodução/ Revista O Cruzeiro Pesquisa: Cristina Silveira
Seleção Brasileira de Futebol, em 1954. Em pé: Djalma Santos, Gérson, Brandãozinho, Nilton Santos, Veludo e Bauer Agachados: Julinho Botelho, Humberto Tozzi, Baltazar, Didi e Maurinho.
Por José Amádio
Cine-Revista – O ridículo é contagiante: três semanas de manchetes nos jornais para suprimir três elementos da seleção brasileira à Copa do Mundo. Às vezes me pergunto em que terra nós estamos. Depois recordo. E admito. Mais ridículo ainda é o novo problema que o nosso selecionado encontrou para justificar possíveis fracassos: a saudade. Já se viu!
Uns marmanjos que durante quatro meses foram tratados com requintes que fariam inveja à própria Pompadour, que teriam tomado banho de leite das mais puras cabras se alguém descobrisse que tal higiene era aconselhável para coceira no dedão do pé, uns cavalheiros que dispõem de manicures, pedicures, nutrólogos, dermatologistas, traumatologistas, que paparam pitéus dignos de filhas de rei, que tomaram banhos de ultravioleta, de infravermelho, duchas escocesas, ditos turcos e utilizaram todos os recursos da moderna hidroterapia, que dormiram em colchões de penas, que ocuparam hotéis dos melhores, que só viajam em aviões especiais, que além disso ganham dinheiro, publicidade, que dispõem de cozinheiro especial, de roupeiro especial, de barbeiro especial – esses cavalheiros vão passar dois meses na Europa (qualquer mortal, que não tiver a suprema aventura de ser jogador de futebol, precisa gastar pelo menos duzentos contos para gozar temporada idêntica), ocupando hotéis de primeira, e vêm falar em saudade! Isso é o fim!
Seleção Brasileira de Futebol, em 1954, com o esplendoroso Mané Garrincha e Pelé
O que dizer então dos nossos pracinhas, que durante tanto tempo enfrentaram os inimigos, suportando o frio italiano, as granadas, os canhões e os aviões, que dormiam em trincheiras, em pântanos e que travavam batalhas particulares contra as muquiranas?
Ridículo tudo isso! Vocês vão ver como daqui a duas semanas sai manchete assim: “Nossos rapazes sofrem à falta do feijão preto!” E logo no dia seguinte, outra manchete: “Avião especial transporta para a Suíça 5 sacos de feijão preto para os nossos bravos rapazes”.
Bem, se depois de tudo isso os rapazes conseguirem vencer os iugoslavos, os húngaros, a saudade, a falta de feijão e levantarem a Copa, ofereço a mão à palmatória. Mas se isso não acontecer, creio que eles vão precisar, de fato, é de um bom taxidermista.
Nota: esqueci que esta página é de cinema. Vide legendas.
[Revista O Cruzeiro (RJ), 5/6/1954. BN-Rio]