Vale pega carona na demanda histórica de Itabira para também fazer uso da água do Rio Tanque
Carlos Cruz
A decisão da alta direção da mineradora Vale de bancar o custo da transposição de 600 litros por segundo (l/s) do rio Tanque, para o abastecimento da população de Itabira, foi motivada por duas outras questões, além da pressão da sociedade itabirana e da ação do Ministério Público.
A primeira, que foi uma espécie de xeque-mate, veio da constatação de que a água, prometida pela mineradora, para reforçar em 100 l/s a ampliada Estação de Tratamento de Água Gatos (ETA), que seria captada no rio Jirau, encontra-se imprópria para consumo humano.
Análises realizadas pela própria mineradora e o Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae) revelaram que a água, que seria captada da barragem de Santana, se encontra com alto teor de manganês.
“A partir do terceiro trimestre de 2019, constatou-se o aumento dos índices de manganês, nas águas do córrego Jirau, acima dos limites legais, o que poderia impossibilitar a utilização da vazão de 100 l/s da captação de tais águas para o abastecimento público de Itabira”, esse foi um dos argumentos finais apresentado pelo Ministério Público – e que levou a alta direção da Vale aprovar a assinatura do TAC.
O manganês é uma substância mineral encontrada em pequeno volume incrustado ao minério de ferro, e que, separado nas plantas de concentração, segue com os demais rejeitos para as barragens. E, também, vem sendo agora dispostos, com o licenciamento recente, nas cavas exauridas de Periquito e Onça, nas Minas do Meio.
O Ministério Público está atento à essa questão e já firmou um TAC com a Vale a esse respeito. Por meio da Aecom Engenharia, empresa de consultoria indicada pelo Ministério Público como sendo de auditoria independente, será acompanhada a disposição nas cavas, assim como será monitorada a qualidade das águas dos aquíferos e de todos os cursos d’água de Itabira. Leia aqui.
“Água nova” para beneficiar minério nas usinas
Já a segunda questão a pesar na decisão da Vale talvez é a que tenha tido mais peso. Vem de uma necessidade operacional da própria empresa para continuar beneficiando minério de ferro, ainda a úmido, nas suas três usinas de concentração de Itabira.
Por incrível que pareça, mesmo com a mineradora propagandeando que recircula 90% da água que demanda no processo de concentração de minério, ela ainda tem muita sede de “água nova”.
Pelo TAC que irá assinar com o Ministério Público, a Vale assegura que, enquanto o município não necessitar de todos os 600 l/s, ela poderá fazer uso do “excedente” para suprir a sua demanda operacional no complexo de Itabira.
Atualmente, o consumo de Itabira é de cerca de 400 l/s. Diferentemente do projeto de PPP original do Saae/Prefeitura, com o novo projeto de PPP, agora com a Vale, os poços profundos das Três Fontes e do Areão, assim como a ETA Pureza, não serão desativados.
Ou seja, mesmo diminuindo a captação de água no córrego da Pureza, limitando-se à sua outorga, com a transposição do rio Tanque a disponibilidade de águas superficiais em Itabira pode ultrapassar, com segurança, 800 l/s.
“O excedente, tendo como prioridade o consumo humano”, poderá ser disponibilizada para as operações da Vale”, confirma a promotora Giuliana Talamoni Fonoff, curadora do Meio Ambiente na Comarca de Itabira.
Segundo ela, é o que consta do item 7 do TAC da captação e transposição de água do rio Tanque até a ETA dos Gatos.
“Desde que não prejudique a quantidade de vazão necessária para o terceiro interveniente (a Prefeitura) suprir a demanda hídrica para consumo humano no município de Itabira, o que deverá ser previamente constatado pelo estudo de demanda hídrica previsto na cláusula I, 1, “d”, o terceiro interveniente (o Saae) fornecerá a vazão excedente, até o limite da vazão total instalada da ETA rio Tanque, para uso da compromissária (a Vale) em suas atividades operacionais no município de Itabira.”
Sem almoço grátis
Como se observa, mais uma vez, não existe “almoço grátis”, o que seria se fosse de fato despretensiosa, por parte da Vale, a busca de opções “definitivas” para o abastecimento público em Itabira.
O prefeito Ronaldo Magalhães anunciou, em coletiva de imprensa na sexta-feira (14) que, além do investimento, de cerca de R$ 160 milhões, a ser alocado em dois anos, que é o prazo para execução das obras de captação e adução, a Vale irá arcar com os custos de manutenção e de toda operação necessária para a água transposta chegar a ETA dos Gatos.
Mas a história não é bem essa. Como se constata pelo item 7 do TAC, a Vale irá bancar esse custo também por precisar dessa “água nova” para as suas operações em Itabira. Isso deve durar por muitos anos, até porque o crescimento da cidade não é tão exponencial como tem projetado os mais otimistas.
Com a transposição da água do rio Tanque, a Vale obtém assim um reforço hídrico de peso para manter as suas operações em Itabira para muito além da virada da próxima década, quando os recursos minerais do complexo deixarão de virar reservas, tornando-se economicamente inviável a exploração.
Até lá a Vale já terá viabilizado a extração de minério de ferro da mina Serpentina, em Conceição do Mato Dentro, e possivelmente de outras minas em Morro do Pilar e Guanhães, de onde sairão os minérios já britados para concentrar nas usinas de Itabira.
A transposição da água rio Tanque é, pois, um excelente negócio para a mineradora. Dessa forma, obtém mais “água nova” para manter os seus ativos (os maiores de Minas Gerais) em plena operação, produzindo pellet-feed de excelente qualidade para o mundo, com as águas dos aquíferos, das barragens – e daqui a dois anos, também do rio Tanque.
Pedras no caminho
Mas para tudo isso ocorrer, vai depender do licenciamento ambiental para a execução das obras e também da concessão de outorga para a captação e transposição, pelo Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam).
Para o caso de a transposição da água do rio Tanque não ser aprovada, ou mesmo de não ser concedida a outorga de 600 l/s pelo Igam, será incluída uma salvaguarda no TAC assegurando que os recursos serão buscados em outras fontes, dentro do município.
Entre as opções estão os aquíferos, sobre os quais o município não deve abdicar do direito de ter acesso à suas águas, como também nos ribeirões São José e Santa Bárbara, que fica próximo da ETA da Pureza, conforme aponta o estudo desenvolvido pela Fundação Christiano Ottoni, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Condicionantes
No caso de ser autorizada ambientalmente a transposição do rio Tanque, juntamente com a outorga necessária, várias condicionantes precisam ser postas pelos órgãos estaduais.
Dentre elas, a recuperação de mata ciliar em toda a extensão do rio Tanque até desaguar no rio Santo Antônio, em Ferros, assim como de seus afluentes no município de Itabira.
Outra condicionante deve contemplar a construção de fossas sépticas em todas as propriedades rurais que possam impactar o rio e os seus afluentes, no município de Itabira, como também estações de tratamento de esgoto nos povoados a montante.
Mas para isso acontecer, a sociedade civil itabirana precisa se mobilizar e cobrar essas compensações para salvar o rio Tanque.
Água Nova tanto bate tanto fura pra virar Água SUJA
A Vale poderia reativar o programa “ Preservar Para Não Secar” , já que Ronaldo atual prefeito deixou 93 proprietários rurais na mão. Gastou o dinheiro com pinturas de bicicleta e castrando cachorros. A represa precisa das nascentes ao longo do rio Tanque, pois só a vazão do rio e as chuvas em pouco tempo deixam a barragem sem água
E se o rio Jirau passa dentro de Santa Maria de Itabira, o povo de lá bebe qual água?
Sem contar que os animais bebem aquilo que têm disponível.