Vale contesta direito de pesquisa de terceiros em sua barragem de rejeito do Itabiruçu

Carlos Cruz

A Vale tenta impedir na justiça, e junto à Agência Nacional de Mineração (ANM), órgão regulador do setor mineral, o pressuposto direito de a empresa Itabiriçu Nacional Pesquisa Mineral realizar prospecções geológicas em área da barragem do Itabiruçu e também em uma pilha de itabirito duro, existente no complexo Conceição (leia aqui).

Alega, inclusive, fatores de segurança, por temer que a movimentação de pessoal e equipamentos possa colocar em risco a estabilidade da estrutura de contenção de rejeitos.

O alvará de pesquisa da Itabiriçu Mineral inclui pilha de itabirito compacto existente no complexo Conceição (Fotos: Reprodução)

A barragem Itabiruçu está sendo alteada – última etapa até que seja descomissionada (fechada com medidas de segurança e mitigadoras ambientais), o que deve ocorrer com o fim das reservas da mina Conceição, previsto para 2028.

Além disso, a mineradora entende que as chamadas reservas antropogênicas, geradas como resíduos (rejeitos) das usinas de concentração, já são de sua propriedade – e integram a concessão de lavra do complexo, outorgada no passado.

Em sua defesa, apresenta resoluções anteriores e outras decisões que asseguram esse direito de explorar os recursos minerais depositados em suas barragens (leia mais aqui, aqui).

Vale já reaproveita rejeito de minério na barragem Rio de Peixe, no braço próximo do antigo clube Real (Foto: Carlos Cruz)

Entretanto, não parece ter sido esse o entendimento do órgão regulador do setor mineral. Tanto que abriu o processo de licitação para concessão do alvará de pesquisa na barragem do Itabiruçu. O projeto de pesquisa já foi aprovado pela ANM,

Para que esse direito seja exercido, uma perícia técnica teve início na quinta-feira (9). Foi autorizada pela desembargadora Mariângela Meyer, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, ao julgar improcedente, em 22 de março, o recurso interposto pela Vale, na tentativa de impedir a realização da perícia.

Com o imbróglio entre a Vale e a Itabiriçu Mineral está instalada uma controvérsia jurídica do tamanho do maior trem do mundo. Para a Vale, as reservas contidas em suas barragens são suas por direito de lavra previamente existente.

Já para a Itabiriçu, essas reservas voltam a pertencer à União, como ocorre com todos os recursos minerais. Mas a empresa outorgada não informa como pretende processar e comercializar esse minério, caso obtenha o direito de lavra.

Mineradora apresenta quesitos para que sejam respondidos pelo perito

Por meio de seus advogados, do escritório Sérgio Bermudes, nos autos da ação de alvará judicial para pesquisa mineral, a Vale formula 19 perguntas para que sejam respondidas pelo perito. São elas:

1) Queira o Perito descrever a área objeto desta ação, informando a sua exata localização, matrículas, os limites com as coordenadas que definem a área de pesquisa mineral, suas dimensões, tipo de vegetação, condições de acesso, recursos hídricos, características de solo e relevo;

2) Queira o Senhor Perito informar o titular dos direitos minerários inseridos na área objeto da ação. Queira ainda, esclarecer se a autora possui alvará para pesquisa mineral, bem como, qual o prazo de vigência destes relativos aos direitos de pesquisa minerária;

3) Queira o Sr. Perito esclarecer quais as atividades serão realizadas para a pesquisa mineral, descrevendo minuciosamente o plano de pesquisa apresentado ao DNPM, incluindo o seu cronograma e orçamento, bem como, informar onde serão efetuados os furos de sondagens, acesso e praças de serviços;

4) Queira o i. Perito esclarece, se, na referida área, existe alguma servidão e/ou estrutura indispensável para as operações de lavra e beneficiamento de minério de ferro exercida pela VALE S.A. no Complexo Minerário de Itabira ou relacionada com a proteção da biodiversidade. Em caso afirmativo, favor informar, qual o tipo de atividade e quando foram iniciadas;

5) Queira o Sr. Perito esclarecer se, na área objeto abrangida pelo alvará de pesquisa detido pela ITABIRIÇU NACIONAL DE PESQUISA, há alguma barragem ou pilha de estéril do complexo minerário da VALE e, caso positivo, esclarecer qual é a origem do material contido nessas estruturas;

6) Queira o Sr. Perito esclarecer se é tecnicamente possível realocar essas estruturas para outro local durante a realização da pesquisa mineral e, caso positivo, qual é a estimativa dos custos para a realocação;

7) Queira o Sr. Perito informar qual é custo anual incorrido pela VALE para o monitoramento e manutenção dessas estruturas, bem como, se o plano de pesquisa da autora possui em seu orçamento alguma previsão de gastos com o monitoramento e manutenção das estruturas;

8) Queira o Sr. Perito esclarecer se as estruturas de barragem e pilha de estéril estão abandonadas ou se recebem manutenção e monitoramento pela VALE, bem como se a interrupção da manutenção e do monitoramento dessas estruturas para a realização da pretendida pesquisa minerária pode interferir nas condições estruturais da barragem;

9) Queira o Sr. Perito informar qual é o volume de rejeito contido na barragem e na pilha de estéril, bem como se existe previsão de reaproveitamento desse material no plano de lavra para o complexo minerador de Itabira;

10) Queira o Sr. Perito informar qual é o volume médio anual da produção de minério de ferro e estimar o faturamento anual do complexo minerador de Itabira;

11) Queira o Sr. Perito informar qual é o número de empregados direta e indiretamente envolvidos na produção de minerário de ferro no complexo minerador de Itabira, bem como a massa salarial dos empregados diretos da VALE;

12) Queira o Sr. Perito esclarecer se, na área abrangida pelo alvará de pesquisa detido pela ITABIRIÇU NACIONAL DE PESQUISA, há alguma reserva particular do patrimônio natural (“RPPN”) da VALE, bem como se a pretendida pesquisa minerária pode ocasionar alguma degradação ambiental da RPPN;

13) Queira o Sr. Perito esclarecer se é tecnicamente possível realocar a unidade de conservação para outro local durante a realização da pesquisa mineral e, caso positivo, qual é a estimativa dos custos para a realocação;

14) Queira o Sr. Perito esclarecer se, para as atividades de pesquisa minerária, serão realizadas análises de riscos de segurança do local, descrevendo, pontualmente, os possíveis riscos quanto aos trabalhos a serem desenvolvidos no local;

15) Queira o Sr. Perito esclarecer se a pesquisa minerária pretendida causa algum dano à propriedade da VALE, em caso afirmativo, queira descrever minuciosamente todos os possíveis danos e mensurar os prejuízos;

16) Queira o Sr. Perito informar se a pesquisa minerária pretendida impacta as atividades minerárias da VALE, de modo a obrigar a sua interrupção. Queira, ainda, mensurar os valores e prejuízos que a VALE deixará de auferir em decorrência de eventual interrupção das atividades minerárias do complexo minerador de Itabira diante da pesquisa minerária pretendida pela autora;

e 17) Queira o Sr. Perito informar, com base no balanço patrimonial da empresa, se a autora possui faturamento compatível para o pagamento da indenização e renda avaliada nos autos dessa ação; Num. 63717957 – Pág. 5 Assinado eletronicamente por: CAETANO FALCAO DE

18) Queira o Sr. Perito informar se há uma área coberta pelo alvará de pesquisa da ITABIRIÇU NACIONAL DE PESQUISA que não converge com terreno de propriedade da VALE, e se a autora já realizou alguma pesquisa mineral nessa área, desde a outorga do alvará;

 19) Queira o Senhor Perito prestar quaisquer outros esclarecimentos que julgue necessários ao completo esclarecimento da lide.

Itabiriçu Mineral quer saber se a Vale tem explorado minério nas áreas da pesquisa

Por meio de seus advogados Carlos Alberto Arges Júnior e associados, a empresa Itabiruçu Nacional Mineral apresenta as suas questões e dúvidas para que sejam respondidas pelo perito, a seguir:

  • Queira o sr. Perito especificar o objeto da perícia e a área/poligonal a ser periciada;
  • Quais são os critérios que o sr. Perito irá utilizar na avaliação indenização (a ser paga) a proprietária do solo superficial, pelos eventuais danos e prejuízos que sejam causados?
  • Para uma futura exploração da jazida, a pesquisa mineral, incluindo a avaliação e renda, como fase antecedente à extração e como meio de mapeamento dos recursos minerais passíveis de exploração, torna-se imprescindível?
  • Sabendo-se que todo e qualquer minério faz parte do subsolo, que é de propriedade da União, mas que a Requerente no momento atual está autorizada a realizar os estudos e trabalhos comprobatórios de averiguação da existência de minério de ferro na área autorizada, a avaliação da sua quantidade, qualidade e economicidade da reserva. Dito isso, durante a etapa de avaliação, poder-se-á extrair e comercializar qualquer minério de ferro existente na poligonal da área outorgada?
  • Queira o perito dizer se está ocorrendo ou recentemente ocorreu alguma atividade de extração mineral na área da poligonal do processo DNPM n. 831.930/2013, ora sob a responsabilidade de pesquisa da requerente? Caso esteja ocorrendo ou ocorreu a extração de minério de ferro ou outra substância mineral, pode o Perito informar a área de extração e o respectivo volume de minério já extraído na poligonal da área de pesquisa, e quem a executou?
  • Queira o sr. Perito informar se existe alguma benfeitoria que possa ser afetada pelos trabalhos de pesquisa na poligonal outorgada, bem como atividade agropastoril na área em que se trata de área improdutiva e destinada à mineração? Queira informar, ainda, se a propriedade está devidamente registrada em nome da requerida junto ao INCRA e se a área é tributada, ou devido suas características de ambiente mineral é isenta?
  • Se afirmativa a resposta ao quesito anterior, quais são as benfeitorias e atividades agropastoril  e se pode afirmar se são novas ou não?
  • Queira o sr. Perito informar se os trabalhos de pesquisa que serão executados, incluindo a presente avaliação, servirão apenas para averiguação e comprovação da existência de minério de ferro e se tais serviços causam danos ao terreno?
  • A Constituição Federal, em seu artigo 176, diz que “as jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário a propriedade do produto da lavra.” Diante desta distinção entre a concentração de recursos minerais e o produto de lavra, queira o sr. Perito informar quais são as substâncias e/ou produtos minerais existentes/encontrados no solo e subsolo que constituem a poligonal?
  • Queira o sr. Perito informar, após a realização dos trabalhos de pesquisa qual é, detalhadamente, o valor da eventual indenização devida ao proprietário por danos causados e se este dano excede o valor venal da propriedade da extensão da área efetivamente ocupada pelo trabalho de pesquisa/
  • O que mais o sr. Perito pode informar ou esclarecer sobre os trabalhos realizados.

A derradeiro, a autora protesta pela apresentação de quesitos suplementares, nos termos do art. 469 do Código de Processo Civil.

 

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