Por que Itabira merece o título – e as responsabilidades consequentes – de Cidade Educativa?
Carlos Drummond de Andrade*
Porque oferece condições excepcionais para o desenvolvimento da educação global, em virtude de sua própria constituição física. E a essa constituição se alia uma estrutura já montada para que a obra educacional aqui se realize plenamente.
O fato de possuirmos a maior reserva de ferro da América determinou o destino social de Itabira. Este destino foi melancólico e frustrado enquanto o imenso potencial de riqueza permaneceu inexplorado. A verdadeira vida do município começou, afinal, no dia em que se tornou positiva a exploração técnica de suas jazidas.
A partir de então, Itabira passou a ser a unidade produtiva de relevo nacional, pela soma de divisas que proporciona ao país, e de projeção internacional, como fornecedora, ao mundo, de matéria-prima essencial à civilização.
Desta maneira, pôde a cidade revitalizar sua tradição cultural e humanista, aplicando e atraindo recursos em proveito de um sistema de ensino que vai da escola pré-primária ao nível de universidade.
Este sistema acha-se em fase de expansão. Mas não se deve considera-lo apenas sob o prisma de um complexo escolar constituído de unidades convencionais que ministram informação e conhecimento em bases comuns a qualquer sistema clássico. O ensino e, mais amplamente, a educação em nossas comunidades, tem sentido muito mais abrangente.
Itabira atual, com suas instalações industriais, seu mercado de trabalho, sua variada mão-de-obra, seus interesses criados pela movimentação econômica, suas necessidades impostas por essa mesma movimentação, suas possibilidades de cidade-laboratório, é a própria imagem da escola integrada, ou cidade-educação.
Aqui se aprende como de um burgo quase arruinado se ergue uma cidade viva e participante nos negócios do mundo. Aqui se forma uma geração preparada para o desafio do homem contemporâneo, chamado a conciliar, em síntese criativa, desenvolvimento material e progresso moral, riqueza e beleza, segurança e alegria.
Em Itabira o passado deixou de ser coleção inanimada de restos para tornar-se elemento de incentivo à criatividade. Tivemos no século 19 uma imprensa liberal e uma escola agrícola pioneira, depois oficializada em Instituto Agronômico.
A iniciativa privada acionou duas fábricas de tecidos, quando o simples transporte do respectivo equipamento importado, em caminhos com o nome de estradas, no dorso de alimárias ou carros de boi, valia por uma aventura.
Estes, entre muitos outros exemplos, que encheriam página, ilustram a continuidade da linha cultural e empreendedora, que agora encontra recursos e estímulos para atingir o máximo de produtividade.
Tudo em Itabira presente é convite à realização da personalidade humana em termos de relação com o mundo e para o bem coletivo. Nossa maior riqueza já nem é o ferro, em processo dinâmico de utilização, mas a própria energia aplicada em tirar dele todos os benefícios sociais, e em diversificar cada vez mais o leque de oportunidades comunitárias.
Velha cidade nova – chamemo-la assim. Cidade do futuro, sem miragem. O que já se está fazendo, é bastante para inspirar confiança no projeto de uma Cidade Educativa, em que até a natureza colabora para o êxito, e cujo fator inapreciável é ainda a criatura humana, em sua fé no trabalho e seu ideal de paz geradora de um mundo melhor.
*Texto publicado originalmente na revista Nós Somos uma Cidade Educativa, Itabira, em fevereiro de 1975, especialmente editada como parte da campanha pelo título que a cidade dividiu com Itaúna – Acervo: Cristina Silveira.
Os sonhos não envelhecem

Em 1975, Itabira dividiu com Itaúna o título de Cidade Educativa, concedido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
Entretanto, enquanto Itaúna diversificou e ampliou as suas faculdades, transformando-se em uma verdadeira cidade universitária, Itabira mais uma vez parou no tempo – e viu a vida passar devagar.
Naquele ano, a cidade tinha uma única faculdade de Ciências e Letras – e assim permaneceu por muitos anos, mesmo depois de ter sido exaltada com o título que fez por merecer por méritos das cidadãs, e cidadãos, que se mobilizaram numa verdadeira gincana educacional e cultural.
Demonstraram, com obstinação, que Itabira era merecedora do título, embora pouco tivessem a apresentar, salvo a sua tradição histórica na área do ensino, por certo uma vocação natural que teve peso na conquista. Como teve também valor inestimável o apoio do poeta.
Naquele ano, Itabira dispunha de uma única Faculdade de Ciências e Letras, criada em 1969, por iniciativa do ex-bispo Marcos Antônio Noronha (1924/98). E assim permaneceu por muitos anos.
Só em 5 de outubro de 1993 foi instituída a Fundação Comunitária de Ensino Superior de Itabira (Funcesi), primeira parceria público-privada firmada entre a Prefeitura, Vale e Diocese de Itabira voltada para a educação superior no município. Uma iniciativa que tem a assinatura do bispo Mário Teixeira Gurgel (1921/2006).
E, novamente, há dez anos, e com a mesma parceria, só que agora com a participação do governo federal, a cidade obteve um campus avançado, ainda em construção, da Universidade Federal de Itajubá (Unifei).
Pode-se dizer que falta muito para virar uma cidade universitária, verdadeiramente educativa, com ensino de qualidade em todos os níveis. Mas não há dúvidas de que os passos agora são mais largos, embora ainda lentos.
Há projeto de diversificação dos cursos ofertados pela Unifei, inclusive de Medicina. Mas é preciso também investir em outras áreas, nas ciências humanas e sociais, para de fato Itabira dispor de uma universidade federal, pública e gratuita (antes que o governo federal acabe com essa modalidade).
Outras faculdades privadas também se instalam na cidade, que enfim começa a ganhar ares universitários.Que venham mais faculdades, públicas e privadas, para que transformem Itabira em verdadeira Cidade Educativa. Afinal, os sonhos não envelhecem.
Como escreveu Drummond, “Itabira, com as suas possibilidades de cidade-laboratório, é a própria imagem da escola integrada, ou cidade-educação”. Como dizia o professor Arp Procópio de Carvalho, que assim seja. Amém.
E impressionante a luta por Itabira que o poeta Drummond empreendeu e o triste é que Itabira não reconhece. Publiquei aqui na Vila as cartas de itabiranos ao poeta e se constata que, quando morreu a Maria Julieta, a bela, apenas duas pessoas enviaram carta ao poeta, nem a prefeitura, nem a FCCDA. No enterro do poeta compareceu a enfermeira Maria da Conceição Cruz, a única presente; a prefeitura mandou flores.