Poluição do ar por partículas mais finas, incluindo fuligem de queimadas e poeira das minas, já é monitorada em Itabira
Após a forte poluição do ar por partículas de minério e sílica em suspensão, vindas das minas e que cobriram a cidade no fim da manhã e início da tarde de uma sexta-feira, em 5 de julho de 2019, a Curadoria do Meio Ambiente, do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), sugeriu – e foi acatada pela mineradora Vale – a inclusão da medição de partículas respiráveis no monitoramento da qualidade do ar em Itabira.
Partículas respiráveis são as de menor espessura, provenientes da poeira das minas, da construção civil, fuligem de descarga de automóveis, chaminés de carvoarias, de usinas siderúrgicas, queimadas. Elas têm dimensões menores que 2,5 micrômetros (PM-2,5), equivalentes a 0,0025 milímetro.
Até então, a rede automática instalada pela Vale em 2002, em cumprimento de condicionante da Licença de Operação Corretiva (LOC), do Distrito Ferrífero de Itabira, vinha monitorando apenas as chamadas partículas totais em suspensão (PTS) e as partículas inaláveis, menores que 10 micrômetros (PM-10), equivalentes a 0,01 milímetro, que, teoricamente, não chegam aos pulmões.
Mas ficavam de fora do monitoramento as partículas respiráveis (PM-2,5), que podem chegar aos pulmões, causando mais danos à saúde, como sustenta a Curadoria de Meio Ambiente do MPMG.
“As partículas respiráveis, quando comparadas às partículas PTS e PM-10, possuem uma capacidade de penetrar nos sistemas respiratórios e cardiovascular e ocasionar danos mais severos à saúde”, sustenta a promotora Giuliana Talamoni Fonoff, que propôs à Vale um termo de ajustamento de conduta (TAC), no inquérito que investiga a intensa poeira de julho de 2019. Leia aqui.
A sugestão foi acatada pela Vale, que importou os equipamentos. Desde dezembro do ano passado, esses aparelhos já medem a poeira mais fina. Estão instalados nas estações de monitoramento na Vila Paciência/Chacrinha, nos bairros Major Lage de Cima/Areão, Fênix/26º BPM e 12 de Março/Premem.

Deliberações
Os dados desse monitoramento são compartilhados, simultaneamente, com a gerência de Meio Ambiente da Vale, Secretaria Municipal de Meio Ambiente/Codena e Fundação Estadual de Meio Ambiente (Feam).
Para o monitoramento e controle da poeira, a mineradora diz seguir o que está prescrito na resolução Conama 491/2018. Mas há legislação municipal mais restritiva, que a empresa deve também observar em Itabira.
Trata-se da deliberação nº 1 do Conselho Municipal de Meio Ambiente (Codema), de 4 de outubro de 2007. Essa resolução estabelece normas e padrões mais restritivos para a qualidade do ar.
Por essa deliberação, o índice máximo de concentração, que pela resolução Conama é de 240 microgramas por metros cúbico (µg/m³), caiu para 150 µg/m³. Diz ainda a legislação que esse parâmetro não pode ser superado mais de uma única vez no ano.
Parâmetros superados

Entretanto, nenhuma dessas resoluções tem sido observada na cidade, seja pela empresa, como também não era pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente, que tem a obrigação de fiscalizar o cumprimento da norma. A expectativa é para que possam ser cumpridas daqui para frente.
Na fatídica sexta-feira de 5 de julho de 2019, uma ventania de 53 quilômetros por hora, segundo registro da estação meteorológica da Vale, localizada no Pousada do Pinheiro, bairro Campestre, levantou a poeira das minas e poluiu toda cidade.
A forte ocorrência relembrou o que acontecia em Itabira na metade da década de 1980, quando foi suprimida a vegetação da serra do Esmeril para dar início à exploração das Minas do Meio.
Resultado: naquela sexta-feira, só na estação do Areão o índice máximo foi superado quatro vezes pela resolução municipal e em pelo menos duas, pelo índice máximo Conama de concentração geométrica. Foram registrados 326 µg/m³ às 10h30, 701 µg/m³ às 11h30, 342,6 µg/m³ às 12h30 e de 216,2 µg/m³ às 13h30. Leia aqui.
Nem mesmo multa foi gerada pela Prefeitura. E a Vale sustentou, junto ao Ministério Público, que a poeira estava de acordo com a lei. Leia também aqui.
“Os resultados dos monitoramentos da qualidade do ar indicaram que os parâmetros estavam em consonância com o disposto na legislação vigente, corroborado pela manifestação apresentada pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente, bem como diante da ausência de comprovação da ocorrência de qualquer dano ambiental”, sustentou a gerente jurídica da Vale, a advogada Fernanda Guimarães César Marques.
Toda essa omissão ocorreu quando a Prefeitura deveria ter, no mínimo, decretado estado de alerta, que é previsto sempre que o índice máximo de 240 µg/m³ é ultrapassado. Serviria, pelo menos, para que os moradores fechassem as janelas, cobrissem os narizes, diminuindo o impacto da poluição provocada pela incômoda e impactante vizinhança.
Doenças respiratórias

Com os dados do monitoramento da partículas respiráveis, a expectativa é que se dê continuidade aos estudos prospectivos das doenças respiratórias em Itabira.
Foi o que sugeriu, inclusive, o professor Paulo Saldiva, que coordenou os estudos retrospectivos sobre os impactos da poluição do ar na saúde da população itabirana, realizados em 2005 pelo Laboratório de Poluição Atmosférica, da Universidade de São Paulo (USP).
“Não sei se esse estudo prospectivo já foi feito, mas se foi, não o encontrei”, afirma o secretário municipal de Meio Ambiente, Denes Lott Martins da Costa, para quem a continuidade desses estudos deveria ter ocorrido por volta de 2010/12.
“Se não foi feito, precisa ser realizado para se saber quais são os danos que essas partículas causam à saúde da população, agora tendo como referência, também, as partículas mais finas”, admite o secretário municipal de Meio Ambiente. “Isso está previsto na condicionante do ar da LOC.”
Transparência

Outra proposta do secretário de Meio Ambiente, e que vem sendo cobrada desde 2017 por este site Vila de Utopia, é criar um portal eletrônico específico para divulgação, em tempo real, de todos os parâmetros da qualidade do ar. Leia aqui.
“Está sendo avaliada a proposta de firmar uma parceria com a Unifei para aprimorar a leitura desses dados, para que possam ser divulgados em linguagem acessível, além de aprimorar as medidas de controle das fontes de poluição atmosférica, que não estão só nas minas da Vale”, adianta o secretário.
Denes Lott conta que quando assumiu a secretaria de Meio Ambiente, nem mesmo o computador da Prefeitura que recebe os parâmetros de hora em hora do monitoramento da qualidade do ar foi encontrado em funcionamento.
É assim que, conforme explica a diretora de Planejamento Ambiental, Flávia Alvim, somente a partir desta semana, os dados gerados pelos novos equipamentos medidores das partículas respiráveis (PM-2,5) serão conhecidos pela Prefeitura, devendo serem divulgados na primeira reunião do Codema, em maio.
“As medições do monitoramento PM 2.5 possibilitará um estudo mais abrangente por avaliar o impacto das micropartículas, que até então não foram consideradas, na saúde da população”, explica a diretora.
São partículas mais finas que podem chegar aos pulmões e provocar doenças mais graves. “Vamos ter uma planilha com todas as fontes fixas de emissão atmosférica, que é para se ter uma gestão integrada da qualidade do ar na cidade”, adianta.
“Outras fontes devem ser monitoradas, não só as da Vale”, acrescenta, citando as emissões da usina de ferro-gusa no Distrito Industrial, como também a poluição de siderúrgicas vizinhas do Vale do Aço e de João Monlevade – e que chega a Itabira.
“Cada poeira tem uma espécie de DNA pela qual é possível identificar de onde vem”, acredita Denes Lott. “Pretendemos ter instrumentos de comando e controle que não visem apenas punir eventuais infrações, mas gerar novas medidas de redução da poluição, melhorando a qualidade do ar em Itabira”, promete o secretário de Meio Ambiente.
Tempo real
“Nosso compromisso é divulgar os dados do monitoramento em tempo real no Portal do Ar que vamos criar, em respeito ao princípio da publicidade e do direito de acesso à informação”, compromete-se a diretora de Planejamento Ambiental da Prefeitura.
“Por meio de estudos multidisciplinares esperamos encontrar a melhor forma de implementar tecnicamente um programa de gestão do ar em Itabira”, diz Flávia Alvim. Ela conta que será incluída, também, o monitoramento e controle de queimadas na cidade, que aumentam nesse período de estiagem, e atingem a cidade com os mesmos ventos fortes que trazem a poeira das minas para encobrir a cidade.
Nessa gestão do monitoramento e controle, a Secretaria de Meio Ambiente espera envolver parceiros como a Itaurb, a Polícia Ambiental, o Corpo de Bombeiros, a Defesa Civil, a Vale e toda a comunidade itabirana.
“Vamos divulgar não só os índices da qualidade do ar em tempo real, mas também boletins interpretativos periódicos, em linguagem acessível à toda população”, promete a diretora.
“Um programa preventivo de queimadas não pode ficar fora dessa gestão integrada”, acentua Flávia Alvim, o que inclui, segundo ela, a formação de brigadas de incêndio, além de campanhas de esclarecimentos e educação ambiental.

Controle
A Vale diz realizar, rotineiramente, em suas operações, atividades de controle da poeira, como a aspersão de água nas frentes de lavra ativas, nas vias das minas e nas pilhas de homogeneização e de produtos.
“Como parte dessas ações, há o controle de velocidade nas estradas de acesso às minas e revegetação de taludes e áreas expostas para minimizar a produção de poeira”, informa a mineradora, por meio de sua assessoria de imprensa.
Mas por certo essas medidas terão de ser ampliadas e intensificadas, com novas medidas de comando e controle que a Secretaria Municipal de Meio Ambiente pretende adotar a partir deste ano. É esperar para ver os resultados práticos, para saber se irão refletir na melhoria da qualidade do ar que todos respiram na cidade.