Vale retira pedido de flexibilização da norma da poeira, mas Codema deve manter Grupo de Trabalho para acompanhar medidas mitigadoras
Foto: Carlos Cruz
Errata
Após o fechamento desta reportagem, o secretário municipal de Meio Ambiente, Denes Lott, pede primeiramente para retirar os nomes das pessoas da Vale da informação, dizendo que a empresa reclamou com ele “sobre a menção de nomes de pessoas dela na matéria. Agradeço se puder retirar”, solicitou.
A resposta deste site para o pedido foi que informação seria mantida, por ser de interesse do leitor e de relevância. Para surpresa, Denes Lott insiste para que fosse excluído o nome do gerente-geral da Vale. “Daniel Daher não veio aqui ontem (no gabinete do prefeito)”, desmentiu Lott a confirmação da presença que ele havia dado peremptoriamente à reportagem. “Eu te dei uma resposta automática.”
Então, fica o dito pelo não dito, embora não acredite que a correção corresponda a verdade dos fatos. Segundo pede Denes Lott para corrigir, participaram da reunião com o prefeito em que foi comunicada a retirada, pela Vale, do pedido ao órgão ambiental municipal para flexibilizar a norma municipal da poeira “os representantes do Codema, o gerente de meio ambiente, Luiz Augusto Moysés e Éder Medina”.
Pedido esdrúxulo
O pedido da Vale que estava em discussão no Grupo de Trabalho (GT), nomeado para esse fim, era para suspender por três anos alguns dos parâmetros da deliberação normativa número 2 (DN-2), que é mais restritiva em relação à norma do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), a ser revista em 2024 para se adequar às novas recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS).
Segundo Denes Lott, com a desistência da flexibilização, fica adiada a reunião do GT, agendada para esta terça-feira (24), quando seria deliberado sobre o pedido da Vale para que alguns dos novos parâmetros somente passassem a valer daqui a três anos.
Isso para que fosse dado tempo, conforme argumentaram os representantes da Vale, “de as novas medidas de controle da poeira surtirem efeitos”. “Nova reunião do GT será agendada oportunamente para continuar os entendimentos para elaboração do inventário de fontes emissoras de agentes poluidores”, informa o secretário de Meio Ambiente.
Posicionamento
Perguntado pela reportagem deste site sobre qual era a sua opinião sobre a proposta da Vale de flexibilizar a deliberação normativa do Codema em troca de uma Central de Resíduos, o secretário respondeu que como presidente do órgão ambiental municipal vinha mantendo uma “posição equidistante entre o empreendedor, seus interesses e os da sociedade, representada com diversidade no conselho”.
“Minhas colocações nas reuniões do GT estão devidamente registradas em atas. Busco a legalidade e a legitimidade das deliberações, garantindo a máxima liberdade e independência dos conselheiros para deliberarem”, disse ele em resposta ao questionamento da reportagem.
Procurando pelo seu posicionamento nas atas das reuniões do GT, no dia 3 outubro o secretário deixa claro o seu posicionamento, ao afirmar “que a Central de Resíduos não contribuirá para a melhoria da qualidade do ar”.
Pois foi justamente para forçar a mineradora investir muito mais na melhoria da qualidade do ar na cidade o que orientou os conselheiros do Codema na aprovação da norma mais restritiva em relação à última resolução do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama).
O órgão ambiental federal tem prazo até 2024 para tornar a norma nacional também mais restritiva, conforme determinou o Supremo Tribunal Federal (STF), para ser adequada às novas diretrizes mais duras da Organização Mundial de Saúde (OMS).
Vale recua e deixa de ser “gulosa”, pelo menos momentaneamente

Com a desistência de flexibilizar a norma ambiental no município, a Vale deixa de ir na contramão dessa determinação do STF – e promete enfim adotar medidas de mitigação da poeira que já deveriam ter sido implantadas desde que fez corte raso da floresta de Mata Atlântica que existia na Serra do Esmeril para extrair itabiritos nas Minas do Meio, na metade da década de 1980.
Para isso, precisa a começar a reabilitação desde já da Serra do Esmeril e de demais áreas mineradas com o replantio de espécies nativas, dentre outras medidas mitigadoras, inclusive com a imediata implantação, onde for possível, do cultivo de plantas medicinais como está previsto no Plano Regional de Fechamento Integrado das Minas de Itabira (PRFIMI), de 2013.
Nesse PRFIMI consta a proposta do Ecoparque Cauê, cujo “driver indutor” deve ser a produção de insumos terapêuticos para hospitais e indústria farmacêutica, com cultivo de plantas medicinais nas pilhas de estéril dispostas nas cavas exauridas – e também no platô da pilha Convap.
Com a desistência, a mineradora terá que se submeter à norma municipal. Por ela, as PTS, que compõem a poeira visível que sai das minas da Vale encobrindo a cidade em diversas situações de ventos fortes no período de estiagem, fica valendo o índice máximo admitido de 150 microgramas por metro cúbico (µg/m³), não podendo extrapolar mais de uma vez ao ano.
Pela resolução Conama 491, de 19 de novembro de 2018, esse índice máximo ainda é de 240 µg/m³, válido como referência nacional até março de 2024, quando deve cair para os mesmos 150 µg/m³, conforme recomendação da OMS.
Mas tudo isso ainda não basta para a Vale obter o certificado social e ambiental, candidatando-se ESG, que é a sigla em inglês para Ambiental, Social e Governança, os três principais fatores considerados imprescindíveis ao medir a sustentabilidade e o impacto ético de um investimento em uma empresa. É preciso fazer muito mais do que simplesmente desistir da flexibilização, adotando novas medidas mitigadoras da poeira.
Rede de monitoramento obsoleta
Ao responder o secretário de Meio Ambiente, que considerava pouco provável a aprovação pelo Codema da troca da flexibilização da norma por uma Central de Resíduos, o analista Eder Medina, representante da Vale do GT, e responsável pelo acompanhamento do monitoramento da qualidade do ar pela mineradora, indiretamente admite que a rede automática da qualidade do ar se encontra obsoleta, como bem disse no passado a ex-secretária de Meio Ambiente Priscila Martins da Costa.
Leia aqui:
Tanto é assim que recorrentemente algumas estações deixam de funcionar em períodos críticos, coincidentemente nos dias de poeira mais intensa com ventos fortes soprando em diferentes direções, conforme se tem observado já há algum tempo na cidade.
Está na referida ata da reunião do GT do dia 3 de outubro: “Eder (Medina) questionou se é interessante haver a troca entre a Central de Resíduos por uma nova estação de monitoramento.”
Ou seja, só de levantar essa possibilidade, o representante da Vale no GT admite a obsolescência dessa rede de monitoramento, operada pela própria mineradora, em funcionamento desde outubro de 2001, tendo custado um investimento de US$ 220 mil, conforme informa o jornal Vale Notícias.
Portanto, se a rede de monitoramento está defasada, dispondo de equipamentos obsoletos, que seja substituída como ação permanente em cumprimento das condicionantes 20, 21, 22 e 26 da LOC.
Lei de Gerson
Com a desistência da flexibilização, é preciso que a mineradora faça muito mais para reduzir os impactos de sua atividade minerária no município. Isso para – que sabe? – em um futuro próximo deixar de ser a “gulosa”, como a ela se referia o cronista Drummond no Correio da Manhã.
Historicamente, a Vale tem agido em Itabira seguindo a tristemente famosa Lei de Gerson, assim chamada depois que canhotinha de ouro da Seleção Brasileira de 1970 fez propaganda de cigarro Vila Rica, em 1976, terminando dando um trago profundo no cigarro, dizendo gostar “de levar vantagem em tudo”.
Tornou-se péssimo exemplo de um princípio nada ético de uma pessoa, ou empresa, que obtém vantagens de forma indiscriminada, sem se importar com questões éticas ou morais, desrespeitando as regras de convívio, e até de parcerias, para obtenção de vantagens muitas vezes inconfessáveis.
É o que vai acontecer com a transposição de 600 litros de água por segundo (l/s) do rio Tanque, com a cidade ficando inicialmente com 200 l/s e o restante servindo para a empresa empregar como água nova em seu empreendimento minerário.
Ou seja, a Vale tira proveito de uma demanda real da cidade, que deveria ter sido equacionada com a LOC de 2000, adiada por mais 20 anos pela mineradora, sob a justificativa de que sobraria água dos aquíferos com as cavas das minas exauridas se transformando em imensos reservatórios.
Pois nessa transposição, seguindo a Lei de Gerson, a mineradora leva vantagem, ficando com 400 l/s até a cidade crescer e demandar todo esse volume de água.
Por certo, a proposta da Central de Resíduos, que Itabira deve brigar por ela, segue essa mesma lei. Como se sabe, e em sociedade tudo se sabe, como dizia o colunista social Ibrahim Sued (1924-95), trata-se de uma necessidade da própria mineradora.
Com a instalação da Central de Resíduos, a empresa terceirizando para o município uma demanda que é sua na gestão de seus resíduos, dando destinação correta às sucatas metálicas, plástico e de outros inservíveis de seu processo produtivo.
A implantação de uma Central de Resíduos está prevista na condicionante número 1 da LOC. É também compromisso de fazer da mineradora em decorrência de medida compensatória pelo empréstimo junto ao BNDES para a implementação do projeto Itabiritos.
A respeito dessa central de resíduos, leia o que publicou a Vale no informativo Minas Sul, em fevereiro de 1999, um documento elaborado pela Gerência de Meio Ambiente da CVRD – Sistema Sul, encaminhado ao órgão ambiental estadual como parte do detalhamento dos projetos e condicionantes da LOC do Distrito Ferrífero de Itabira, aprovada em 2000.
Documento
Central de Resíduos é proposta para Itabira
Resíduos sólidos da Vale e da cidade terão tratamento e disposição adequados, com gestão unificada
Subcomissão de Resíduos Sólidos
A subcomissão de Resíduos Sólidos foi estabelecida com vistas a desenvolver o Plano Diretor de Resíduos Sólidos gerados no município de Itabira. Conforme documento emitido pela Feam, a CVRD deverá elaborar o Plano Diretor de Resíduos gerados na CVRD.
No entanto, além do solicitado pela Feam, a Prefeitura Municipal de Itabira exigiu que a questão dos resíduos sólidos fosse avaliada para todo o município de Itabira, uma vez que a solução é de grande importância para a cidade.
Atualmente, Itabira conta com um “lixão” para promover o confinamento no solo, de cerca de 90% dos resíduos gerados na área urbana. Destaca-se que os 10% restantes da área urbana são atendidos pela coleta seletiva (coleta realizada de forma segregada dos resíduos sólidos potencialmente recicláveis).
Como forma de propiciar a Itabira uma gestão adequada de seus resíduos, a CVRD está fomentando a implantação de uma Central de Resíduos sólidos no município.
Considerando-se o exposto, a subcomissão de Resíduos Sólidos, atendendo às exigências impostas pela PMI, estabeleceu a necessidade da realização de uma série de estudos, os quais estão apresentados na sequência.
1ª Etapa – Identificação e seleção de área para implantação da Central de Resíduos Sólidos
Inicialmente foram avaliadas todas as alternativas locacionais de áreas potenciais para a implantação da Central de Resíduos Sólidos. Para tanto, considerou-se o estudo realizado pela PMI, que contemplava cinco áreas potenciais de propriedade da CVRD, perfazendo um total de sete áreas.
Para uma seleção da melhor área para a implantação do empreendimento em questão, foram considerados os seguintes critérios: localização geográfica, acessibilidade, distancias dos recursos hídricos, distância de núcleos urbanos, distância de assentamentos e ou equipamentos urbanos, proximidade do Distrito Industrial e sub-bacia a que pertence essa área, excluindo-se as áreas localizadas em sub-bacias onde é realizado o abastecimento de água do município.
A área que apresentou mias favorável à implantação da Central de Resíduos Sólidos localiza-se nas proximidades do Distrito Industrial de Itabira, em local estratégico em terreno de acesso, distância do centro urbano, condições ambientais e topografias da área.
Destaca-se que um dos objetivos dessa Central de Resíduos Sólidos é fomentar a implantação de empresas microprocessadoras de resíduos na região.
2ª Etapa – Licenciamento Ambiental da Área para a Implantação do Aterro Sanitário (em caráter emergencial) e da Central de Resíduos Sólidos
Para a obtenção do licenciamento ambiental da área para a implantação do aterro sanitário (em caráter emergencial, uma vez que o “lixão” deverá ser desativado imediatamente) e da Central de Resíduos Sólidos, torna-se necessária a elaboração de um documento que apresente as seguintes informações ao órgão ambiental competente:
*Informações gerais do empreendimento e da empresa responsável pelo mesmo;
*dados cadastrais do empreendimento;
*objetivos do empreendimento;
*descrição do empreendimento;
*localização do empreendimento;
*definição da área de confluência do empreendimento;
*diagnóstico ambiental das áreas de influência, considerando-se os meios físicos, antrópico e biótico;
*identificação e avaliação dos impactos ambientais e estabelecimento de medidas mitigadoras;
*plano de controle ambiental, que deverá conter o(s) projeto(s) para a execução das ações mitigadoras dos impactos ambientais propostas;
*Será agendada uma reunião com o órgão ambiental responsável pelo licenciamento, visando discutir o projeto conceitual da Central de Resíduos proposta pela CVRD.
3ª Etapa – Elaboração dos projetos executivos do Aterro Sanitário e da Central de Resíduos Sólidos.
Para a elaboração dos projetos executivos referenciados, torna-se necessária a execução das seguintes atividades:
*levantamento planialtimétrico das áreas envolvidas;
*realização de furos de sondagens;
*estabelecimento da forma operacional do Aterro Sanitário e da Central de Resíduos Sólidos, considerando-se a topografia da região.
*estabelecimento dos sistemas de tratamento do percolado e efluentes líquidos a serem gerados;
*estabelecimento dos planos de monitoramento e de controle dos empreendimentos a serem implantados.
#Página editada pela Gerência de Meio Ambiente da CVRD -Sistema Sul.
Deve ter sido por algum resquício de vergonha na cara de alguém lá da administração buscando um mínimo de bom senso para as atitudes nefastas desta porcaria de mineradora.
É bom ficar atentos e vigiar, não se confia em autores de crimes contra a população, crimes reiterados. Ficar de olho, a mineradora não é confiável
E devemos, este hiato de respeito por parte da mineradora/destruidora, a você, jornalista Carlos Cruz, que desde o século passado cuida dos interesses da cidade. Sei que são, a Vila de Utopia e o Diário de Itabira os únicos jornais a cuidar do assunto. Obrigada, bonitão!