Vale é processada nos EUA por suposta venda ilegal de minério sem direito de lavra, em área de pesquisa da Itabiriçu Mineral

Carlos Cruz

Não é boa a notícia vinda dos Estados Unidos, mais precisamente da Comarca de Nuances, Texas, Estados Unidos, para a mineradora Vale S.A.

É que, pelo processo de número 2023CCV-61340-2, a empresa Itabiriçu Nacional de Pesquisa Mineral ingressou com ação investigatória pelo que seria uma “compra ilegal” de minério de ferro de baixo teor (itabirito compacto) pelas siderúrgicas norte-americanas Voestalpine Texas LLC e a Voestalpine US Holding LLC, extraído de área em litígio, em Itabira, no complexo Conceição.

Na ação, foram incluídas também as siderúrgicas ArcelorMittal Texas HBI LLC e ArcelorMittal Texas HBI Holdings LLC, subsidiárias da ArcelorMittal S.A. Pela “compra ilegal”, a Itabiriçu cobra indenização dessas empresas.

Os advogados da Itabiriçu sustentam na ação que os “réus conspiraram para converter, transportar e vender ilegalmente mais de 108 milhões de toneladas de minério de ferro de baixo teor pertencentes por direito a Itabiriçu”. Essa transação teria ocorrido pelo porto Corpus Christi, nos Estados Unidos.

Direito de pesquisa

Área com minério pobre (itabirito compacto) em agosto de 2008, em imagem do Google, postada em vídeo-relatório da Itabiriçu

A Itabiriçu Mineral é detentora, há quase dez anos de direito de pesquisa em uma área de 480,87 hectares de rejeitos na barragem Itabiruçu – e também em uma pilha de estéril (itabirito compacto) no complexo Conceição, em Itabira – e que agora, segundo a denúncia, estaria sendo extraído e vendido ilegalmente pela mineradora Vale às citadas siderúrgicas norte-americanas..

Entretanto, desde a concessão pelo Departamento de Recursos Minerais (DNPM) DNPM, a empresa briga na Comarca de Itabira para ingressar na área, para fazer valer o direito concedido pelo antigo departamento fiscalizador e regulador da mineração na referida poligonal.

A denúncia foi veiculada pela primeira vez neste site, em 12 de maio deste ano, pelo geólogo Everaldo Gonçalves, um dos proprietários da Itabiriçu.

A Vale contesta por não reconhecer o direito de pesquisa em sua área e também por alegada razão de segurança. A empresa não concorda com a entrada de pessoas estranhas ao seu quadro de empregados e contratados na barragem e na mina Conceição, para a realização das prospecções geológicas com furos de sondagens. Alega risco de segurança à estrutura.

“Esbulho minerário”

A mesma área do polígono em maio de 2013

Na reportagem publicada neste site, Gonçalves acusa a Vale de lavrar minério em pilha de estéril sobre a qual detém alvará de pesquisa na mina Conceição, onde foram depositados rejeitos contendo itabiritos compactos. “Lavrou minério de ferro in situ, por volta de 2005, em pilha na Mina Conceição, na poligonal do alvará de pesquisa da Itabiriçu”, disse ele.

“Depois lavrou, a partir de 2016, conforme o gerente da Vale confessa, e está nos autos, quando foram extraídos (da antiga pilha de estéril, contendo itabirito compacto) 70 milhões de toneladas de minério de ferro (com teor) de 40%, na escala de dez milhões de toneladas ano”, denunciou o geólogo, com a mesma acusação agora encaminhada para apuração na Comarca de Nuances, Texas, Estados Unidos.

“Isso é grave, não só por executar lavra ilegal, mas também por vender o minério que não está no ativo e na reserva mineral da empresa. A Vale invadiu a área (de pesquisa da Itabiriçu) e executou lavra ilegal fora da poligonal do Manifesto de Mina dela, ANM 000577/1936”, insiste Gonçalves na mesma reportagem.

Em decorrência, a Itabiriçu ingressou com ação cautelar pedindo liminar para paralisar o que chama de esbulho minerário.

A mesma reportagem neste site informa que o juiz André Luiz Alves, da 1ª Vara Cível de Itabira, determinou que a Vale forneça ao perito judicial, “no prazo de 20 dias, a contar do recebimento da intimação, todos os documentos necessários à realização da perícia para avaliar eventuais impactos de se realizar pesquisa geológica na barragem Itabiruçu e em pilha do que antes era considerado estéril (itabirito compacto) na mina Conceição”.

Entre os documentos requeridos pelo perito Júlio César de Melo, consta a solicitação para que a Vale “ateste qual é o volume atual de rejeito contido na barragem (Itabiruçu) e na pilha de estéril (Conceição)”. Quer saber também se as respectivas reservas de minério contidos no estéril e rejeito estão sendo aproveitadas e averbadas na Agência Nacional de Mineração (ANM).

Por meio de um agravo de instrumento, impetrado no Tribunal Regional Federal, em Belo Horizonte, a Vale contesta esse direito – e pede também a não prorrogação da outorga do alvará de pesquisa da Itabiriçu.

A mesma área em 2022, agora sem o material estéril (itabirito compacto) já extraido, beneficiado e vendido pela Vale, segundo o mesmo vídeo-relatório

Produto da lavra

Por seu lado, a Vale sustenta que as pilhas de estéril e o rejeito da barragem Itabiruçu são de aproveitamento dela, ainda que descartados fora da poligonal do seu manifesto de lavra.

“A Vale não comenta ações judiciais em curso. A despeito disso, a Companhia reitera que todo o material foi aproveitado de forma regular, não havendo que se falar em lavra ilegal. A propriedade da Vale sobre o material já foi, inclusive, confirmada pela Agência Reguladora competente e em decisão judicial no Brasil”, é o que sustenta a mineradora, em resposta às indagações da reportagem

A mineradora sustenta ainda que todo esse material, tanto os itabiritos depositados em pilhas, como os rejeitos dispostos nas barragens, são produtos da lavra, portanto, pertencem à mineradora. Para isso, conta com o que dispõe a resolução número 85/21, da ANM.

De acordo com essa resolução, publicada no Diário Oficial da União em 7 de dezembro de 2021, a agência reguladora da mineração reconhece que os rejeitos e o material estéril fazem parte da mina onde foram gerados.

Isso mesmo que a lavra esteja suspensa ou que a poligonal de direito minerário esteja em “disponibilidade para novos interessados”, incluído o que foi depositado em barragens.

A Itabiriçu discorda dessa decisão, tendo ingressado com Mandado de Segurança na 13ª Vara Cível de Belo Horizonte, contestando a resolução da ANM, como detentora anterior à publicação do alvará de pesquisa em área da barragem do Itabiruçu e em pilha de estéril (itabirito compacto) na mina Conceição.

“Qualquer advogado, e até um leigo, sabe que (nenhum ato jurídico) é retroativo. Contestamos essa resolução, que fere direitos adquiridos da Itabiriçu”, é o que sustenta o geólogo Everaldo Gonçalves na referida reportagem publicada neste site.

A expectativa da Itabiriçu é que essa disputa com a Vale tenha agora celeridade, com a denúncia encaminhada à justiça norte-americana para ser apurado o envolvimento de grandes siderúrgicas norte-americanas na “compra ilegal desses ativos minerários”.

Interessante observar ainda que, na mesma reportagem deste site, a Vale sustenta também já ter realizado pesquisa mineral na área mencionada, tendo concluído pela “inexistência de potencial geológico por meio da apresentação de Relatório Final de Pesquisa negativo”, com o consequente descarte voluntário da área pela própria Vale.

Mas a mineradora reserva entretanto, se por ventura viabilizar a sua exploração econômica futura, o direito de exercer a exploração do que diz lhe pertencer. “Os materiais (rejeitos, estéreis e produtos) porventura depositados pela Vale são de sua propriedade, nos termos da legislação minerária. A Vale não reconhece quaisquer interesses especulatórios de terceiros sobre materiais de sua propriedade.”

Para saber mais, acesse:

Empresa ganha direito de pesquisar rejeito na barragem do Itabiruçu para futura exploração

Disputa por rejeitos de minério na barragem Itabiruçu continua. Vale contesta alvará de pesquisa da Itabiriçu Nacional

Vale contesta direito de pesquisa de terceiros em sua barragem de rejeito do Itabiruçu

ANM está para aprovar resolução que assegura o direito da Vale explorar rejeitos de minério das barragens e estéril das pilhas

Justiça Federal decide que portaria da ANM, que diz ser o rejeito e o estéril produtos da lavra, não se aplica à Itabiruçu. Vale contesta

Justiça dá prazo para a Vale informar à perícia quanto já lavrou de minério em área de pesquisa da Itabiriçu Nacional na mina Conceição

Vale rechaça no Codema acusação de geólogo de prática de lavra ilegal na mina Conceição, na poligonal de pesquisa da Itabiriçu

 

 

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3 Comentários

  1. Há cinquenta anos meu pai disse isto e ainda mostrou quais as áreas que a CVRD explorava sem o decreto de lavra do DNPM, daí quase tomou mais uma cadeia por conta disto.

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