Vale diz que poluição do ar em Itabira tem outras fontes, mas Codema mantem multas pela emissão de partículas de minério em suspensão

Fotos: Reprodução

A mineradora Vale foi derrotada na reunião do Codema nessa sexta-feira (14), quando apresentou recursos contra duas multas aplicadas pela Prefeitura por poluir o ar de Itabira por partículas de minério (e sílica) em suspensão, nos dias 19 e 28 de julho no ano passado, extrapolando o índice máximo – que não pode ser repetido mais de uma vez ao ano – de 240 microgramas por metro cúbico de ar (µg/m³), estabelecido pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama).

Por unanimidade os conselheiros decidiram pela manutenção das multas aplicadas, respectivamente, de R$ 2,2 milhões e de R$ 4,5 milhões, totalizando R$ 6,7 milhões.

Entretanto, como houve atenuantes com medidas mitigadoras adotadas pela Vale após as ocorrências, foi dado desconto, com o total caindo para pouco mais de R$ 5,2 milhões. A empresa vai recorrer à justiça para não pagar as multas, como historicamente tem feito.

O argumento tem sido recorrente e é no mínimo esdrúxulo, além de alegar a incompetência do município ao aplicá-las. Mas a tese não se sustenta diante da histórica omissão do órgão estadual licenciador, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) com as suas instâncias fiscalizadoras e técnicas.

Nos recursos, além de alegar a incompetência do município na aplicação das multas, a mineradora sustenta também que o alto índice de poluição atmosférica nessas ocorrências foi provocado por fortes ventanias e mudança da direção dos ventos que sopraram das minas para a cidade, quando geralmente ocorre da cidade para as minas.

Ou seja, a culpa foi da natureza. Alega ainda que contribuíram outros agentes poluentes além da mineração.

O monitoramento da qualidade do ar naqueles dias registrou, respectivamente, 247,9 µg/m³ na estação de Chacrinha e de 247 µg/m³ de Partículas Totais em Suspensão (PTS) na estação do bairro Fênix.

Poluição do ar na estiagem em Itabira sempre extrapola os parâmetros legais, mas Vale sustenta que não é a única fonte emissora, mesmo com todas provas fotográficas e constatações de quem vive na cidade

Sofismas

Mesmo com todas as provas de que a poluição do ar nesses dias foi proveniente das minas, por fotografias e testemunhos de moradores, além da atuação dos fiscais da Prefeitura, a Vale alega em sua defesa a existência de outras fontes poluidoras na cidade.

Com base nesse sofisma, a mineradora sustenta que a contribuição das minas da Vale, medida na estação Paciência (Chacrinha) foi de apenas 164 µg/m³ no dia 19 de julho do ano passado – ou seja, abaixo do limite definido pela resolução Conama, que é de 240 µg/m³ .

O mesmo sofisma é empregado em relação à extrapolação do limite ocorrido nove dias depois, em 28 de julho de 2021. “Se consideradas apenas as contribuições advindas da Vale, tem-se que a média diária para o parâmetro PTS na Estação Fênix foi de 204 µg/m³ – ou seja, abaixo do limite definido pela mesma resolução Conama.”

Poluição do ar pela usina de ferro-gusa no distrito industrial é outra fonte e precisa ser autuada. Mas não se compara com a poluição das minas da Vale

Procrastinação

Os argumentos da Vale não foram aceitos pelos conselheiros do Codema, que acataram os pareceres da área técnica da SMMA, mantendo as multas. Essas, entretanto, têm muito mais valores simbólicos do que eficácia, uma vez que a empresa recorre e não as pagas, como tem ocorrido historicamente.

Para isso a Vale vai recorrer à justiça para não pagar as multas, como tem feito em outras ocorrências. É o que certamente irá fazer com as infrações registradas neste ano, com as duas ocorrências de 12 de agosto.

Nesse dia, o registro foi de 251,3 µg/m³ na estação Areão, e de 240,6 µg/m³ na estação Fênix. Em decorrência, a Prefeitura aplicou duas multas que totalizaram R$ 2,2 milhões.

Mas de nada tem adiantado a Prefeitura aplicar essas multas, como reconhece o secretário municipal de Meio Ambiente, Denes Lott, uma vez que até então nenhuma foi paga pela mineradora.

“A Vale prefere contratar escritórios de advogados caríssimos para que recorram indefinidamente e assim não pagar as multas, ao invés de investir em mais medidas de controle para os índices não extrapolarem”, afirmou o secretário de Meio Ambiente na reunião do Codema de 12 de setembro deste ano.

Ações mitigadoras

Por pressão e cobrança do município, fiscais da Fundação Estadual de Meio Ambiente (Feam), órgão técnico da Semad, acompanhados de técnicos da Prefeitura, fizeram uma rápida vistoria nas áreas da Vale, em Itabira, no dia 2 de setembro, após os episódios críticos de agosto deste ano.

Mas não lavraram autos de infração. Apenas recomendaram mais medidas de controle e contenção da poeira.

Após a vistoria, a mineradora informou ter adotado novas medidas – e que outras estão sendo estudadas, conforme apresentou o conselheiro Breno Caldeira Brant, representante da empresa, na reunião do Codema, no dia 9 de setembro.

Além da aspersão móvel de água para apagar a poeira e uso de caminhões-pipa e nebulizadores, está sendo também ampliada as áreas mineradas cobertas com gramíneas por meio de hidrossemeaduras.

Com o mesmo objetivo, está sendo aumentada a aplicação de polímeros nas áreas onde ainda não é possível fazer a revegetação, inclusive com teste de um produto que diz ser mais eficaz. Pretende também instalar sistemas de quebra-ventos, que serão primeiramente testados em pilhas de estéril.

Diferentemente do que tem feito no porto de Tubarão, na grande Vitória (ES), onde está sendo ampliado as malhas de wind fences, uma barreira com material apropriado, instalada nos pátios internos para diminuir a velocidade do vento e a emissão de poeira, essa medida ainda não está sendo cogitada para as minas de Itabira.

O investimento da Vale para o controle da poluição do ar em Tubarão é de R$ 4.6 bilhões. As medidas estão sendo implementadas por meio de um Plano Diretor Ambiental, com o qual a mineradora promete reduzir em até 93% a emissão do “pó preto” que despeja sobre as cidades no entorno do porto, na grande Vitória.

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Audiência pública

Para pressionar a Vale a adotar essas e outras medidas mais eficazes no combate à poeira, Denes Lott acredita que isso pode ocorrer com o andamento da renovação da licença ambiental da Vale, que está vencida desde 2016.

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Na reunião dessa sexta-feira (14), o Codema aprovou indicação para que a Prefeitura requeira junto à Semad a realização de uma audiência pública em Itabira, que é para colher subsídios para as condicionantes dessa nova licença ambiental. “Assim que sair o edital (da Semad) vamos entrar com o pedido (da audiência pública)”, disse Denes Lott.

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