“Tropa de choque” da Vale na Câmara manifesta contrária a convite para professora da Unifei explicar a poluição do ar em Itabira e é derrotada
Foto: Raíssa Meireles/ Ascom/CMI
Carlos Cruz
Bastou o vereador Weverton “Vetão” Andrade (PSB), líder do governo na Câmara Municipal, entrar com requerimento convidando a professora Ana Carolina Vasques Freitas, da Unifei para explicar como são produzidos os Boletins Mensais Informativos da Qualidade do Ar em Itabira, postado no site da Prefeitura, assim como se deu a reedição da deliberação normativa com parâmetros mais restritivos para a poluição, para alguns vereadores se revelaram fiéis escudeiros da mineradora.
Foi quando se formou, na sessão dessa terça-feira (17), o que pode ser chamado de “tropa de choque” dessa que é a maior empregadora no município de Itabira, assim como é também a maior poluidora do ar na cidade.
O requerimento do líder do governo é oportuno por levar ao legislativo itabirano o debate que se trava desde 10 de março no Codema, quando a Vale apresentou requerimento verbal pedindo a revisão dos parâmetros municipais mais restritivos da qualidade do ar, estabelecidos pela Deliberação Normativa número 2 do órgão ambiental municipal, aprovada em 12 de agosto do ano passado.
Após acirrado debate na Casa legislativa, 14 vereadores votaram favoráveis ao convite à professora Ana Carolina para apresentar o que tem sido feito na cidade para aprimorar o monitoramento e a divulgação da qualidade do ar na cidade minerada pela grande empresa.
Favoráveis, porém nem tanto
Entre os que votaram favoráveis ao requerimento, dois endossaram a crítica de quem votou contrário por não ter estendido o convite ao secretário municipal de Meio Ambiente, Denes Lott, além de representantes da Vale.
O vereador Neidson Freitas (MDB) foi um entre os que votaram favoráveis, mas não sem antes cobrar posicionamento mais firme da Prefeitura diante dessa realidade. “É muito fácil simplesmente jogar na conta da Vale os problemas. Precisamos saber qual é a providência que o prefeito tem tomado através do seu secretário de Meio Ambiente”, ponderou.
Já o vereador Robertinho “da Autoescola” Araújo (MBB) foi outro que votou favorável com críticas à administração municipal, por não ter o Saae resolvido em definitivo o eterno problema de esgotos clandestinos lançados no histórico poço da Água Santa, um dos lugares, segundo ele, mais bonitos de Itabira e que não pode ficar abandonado com esgoto correndo a céu aberto”.
Júber Madeira, vereador da bancada situacionista votou favorável, mas não sem antes defender a empresa. Isso como se a Vale estivesse sendo acusada pelo simples fato de o vereador Vetão convidar a professora Ana Carolina para explicar aos edis itabiranos, de forma técnica e didática, como é o monitoramento, divulgação e a composição de material particulado suspenso na atmosfera, com predominância de material particulado vindo das minas.
“É preciso saber também o que a Vale tem feito para mitigar esses impactos em suas operações”, disse Júber Madeira, que contou ter sido informado pela mineradora sobre um novo canhão aspersor instalado com sucesso no Espírito Santo.
“É um equipamento reconhecidamente eficaz no combate à poeira e que está sendo instalado nas minas nos pontos mais críticos”, destacou, reforçando a sugestão para que o convite seja estendido também à mineradora.
A vereadora Rosilene Félix (MDB) votou favorável, mas com críticas ao secretário municipal de Meio Ambiente, no exercício da presidência do Codema. “Eu fui praticamente escorraçada de lá pelo presidente para quem vereadores não podem compor os conselhos”, disse ela.
Não existe essa proibição no regimento do órgão ambiental, tanto que o próprio vereador Neidson já foi conselheiro, embora tenha comparecido a poucas reuniões.
Atualmente a cadeira da Câmara no Codema é ocupada por um servidor de carreira, quando o ideal seria ter a presença de um parlamentar participante e ativo nas reuniões do órgão ambiental municipal.
Tropa de choque
Da tropa de choque que se formou contra o requerimento, por não estender o convive aos representantes da Vale, o primeiro a manifestar o voto contrário foi o vice-líder do governo na Câmara, vereador Carlos Henrique de Oliveira (PDT).
“É preciso saber também o que a Vale tem feito para minimizar esse impacto ou se nada tem feito de melhorias. Precisamos ter as duas partes envolvidas nesse debate”, argumentou, como se a professora Ana Carolina fosse parte contrária à Vale, quando se trata de uma estudiosa da questão ambiental, doutora em ciências atmosféricas pela Universidade de São Paulo (USP).
Outro da bancada situacionista que criticou o requerimento por não incluir representantes da mineradora no convite foi vereador Marcelino Guedes (PSB), com os mesmos argumentos de Carlos Henrique, ambos empregados da Vale.
Entretanto, ele disse que ia votar favorável ao requerimento, mas oportunamente se ausentou do plenário na hora da votação. “A mineração tem os seus bônus, temos os orçamentos (da Prefeitura) da ordem de milhões graças à atividade mineral. Itabira não tem problema com desemprego”, ufanou-se, áulicamente.
Da bancada oposicionista, votou contra o requerimento o vereador Luciano “Sobrinho” Gonçalves (MDB), com a mesma justificativa alegada da pelos demais vereadores contrários, mas acrescentando uma pérola do aulicismo.
“O que seria de nossa cidade sem a mineração”, ele quis saber. “Nós não podemos ficar só culpando a Vale que emprega tantos itabiranos. Inclusive, vereadores desta Casa tiveram nela a primeira oportunidade de emprego”, assinalou.
Esclarecimentos
Para o presidente da Câmara, vereador Heraldo Noronha (PTB), sem a Vale Itabira seria uma cidade minerada por outra empresa como tantas outras, talvez com os mesmos problemas, como se observa na capital mineira, em Conceição do Mato Dentro.
“A Vale deve muito a Itabira e temos o dever de cobrar dela o que é de sua obrigação, assim como seria cobrado também se fosse outra empresa aqui estabelecida”, disse o presidente do legislativo itabirano, para quem o requerimento não critica a empresa, apenas busca informações sobre a poeira na cidade que afeta a todos os itabiranos.
O bom-senso entre a maioria dos vereadores ao votar favorável ao requerimento ficou evidente na ponderação do vereador Júlio “do Combem” Rodrigues (PP).
“É uma oportunidade de esclarecimentos, pela professora que coordena os boletins mensais da qualidade do ar, sobre um problema que aflige a população itabirana. Que se façam outros requerimentos convidando o secretário de Meio Ambiente, o presidente da Vale e até o presidente da República”, ironizou diante de tantas idiossincrasias.
O vereador Bernardo Rosa (Avante) foi além e quer ver o legislativo itabirano mais presente nas discussões das questões envolvendo a mineração no município. E cobra da Vale para que apresente aos vereadores o plano para o descomissionamento das minas de Itabira.
É o caso de os vereadores cobrarem da mineradora a remessa oficial ao legislativo itabirano do Plano Regional de Fechamento Integrado das Minas de Itabira (PRFIMI), de 2013, encaminhado pela Vale ao antigo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), mas que ficou escondido de Itabira até este site ter acesso e torná-lo público.
“O requerimento (com o convite à professora Ana Carolina) não é para um debate, mas para que ocorra um esclarecimento sobre a poeira na cidade. Debate é outro tipo de requerimento, como para se realizar uma audiência pública para a Vale esclarecer como será o fechamento das minas e o que ela irá fazer para se ter uma Itabira sustentável”, sugeriu.
A poeira advinda da mineração afeta a saúde da população de Itabira, como demonstraram os estudos realizados pela USP, no passado. Até então, a Vale fez pouco ou quase nada para mitigar as causas dessa poluição.
Os vereadores que votaram favoráveis com restrição demonstram pensamento infantil e obtuso. Não compreendem ou talvez por má fé, o que é a obrigação dos poderes de direito, de que são parte. E com certeza a mineradora Vale os despreza como representantes do povo.