Suicídio de Getúlio Vargas completa 69 anos nesta quinta-feira. Leia a íntegra de sua carta-testamento
Fotos: Reprodução/BN
Com um tiro no coração, o ex-presidente Getúlio Dornelles Vargas (1882/1954), na manhã de 24 de agosto de 1954. O tresloucado gesto foi uma trágica resposta aos ataques udenistas do então deputado Carlos Lacerda, em uma conjuntura de forte pressão, 19 dias após o atentado da rua Tonelero (em 5 de agosto daquele ano), quando foi assassinado um oficial da Aeronáutica, com envolvimento de pessoas próximas de Vargas, o que poderia levar ao impeachment do então presidente.
Isso porque as investigações do atentado mostraram o envolvimento de funcionários do Palácio do Catete, chegando-se ao nome de Gregório Fortunato, chefe da guarda pessoal de Getúlio, como participante do atentado seguido de morte. Outras denúncias davam conta que o filho do ex-presidente mantinha negócios nada republicanos com o chefe da guarda de seu pai.
Dois dias antes do trágico final, os militares exigiram a renúncia de Getúlio, que não aceita e responde: “daqui só saio morto”. Outros militares engrossaram o coro dos descontentes, apoiando a decisão da Aeronáutica e da Marinha, exigindo a sua renúncia, por meio do chamado Manifesto dos Generais.
Com a situação já bastante grave, Getúlio reúne o seu ministério, quando foi aconselhado a se licenciar da presidência, com o que ele teria concordado. Getúlio despede-se do então ministro da Justiça Tancredo Neves, que o presenteia com uma caneta Parker 51, de ouro, dizendo-lhe: “Para o amigo certo das horas incertas”.
Em sequência à crise já insuportável, na madrugada do dia 24, Getúlio é informado que o seu irmão, Benjamim Vargas, estava sendo convocado para depor na “República do Galeão”, nome dado à operação da Aeronáutica que se investira de funções policiais para apurar o atentado da Rua Tonelero, conforme registra a historiadora Joelza Ester Domingues, do blog Ensinar História.
Getúlio é informado também que a licença do cargo fora convertida em veto militar. Nessas circunstâncias históricas, o Palácio do Catete já estava protegido com trincheiras de sacos de areia. A possibilidade de uma guerra civil era considerada uma ameaça real. Por volta das 8:30h, Getúlio Vargas se suicida com tiro no coração.
Foi quando a nação tomou conhecimento do teor de sua carta-testamento, causando grande comoção popular. Em fúria a população saiu às ruas em protestos generalizados, principalmente em frente às redações de jornais e emissoras de rádio que apoiavam o golpe – e de empresas norte-americanas que também participavam das conspirações golpistas.
O deputado Carlos Lacerda e outros deputados udenistas fugiram para Portugal. E o udenismo virou sinônimo de golpismo em nome do combate à corrupção.
A carta-testamento foi encontrada ao lado do corpo de Getúlio Vargas, no palácio do Catete. Trata-se de um documento histórico contendo o ideário político do líder nacionalista que comoveu o país.
Leia a carta-testamento na íntegra:
“Mais uma vez, as forças e os interesses contra o povo coordenaram-se novamente e se desencadeiam sobre mim.
Não me acusam, me insultam; não me combatem, caluniam e não me dão o direito de defesa. Precisam sufocar a minha voz e impedir a minha ação, para que eu não continue a defender como sempre defendi, o povo e principalmente os humildes.
Sigo o destino que me é imposto. Depois de decênios de domínio e espoliação dos grupos econômicos e financeiros internacionais, fiz-me chefe de uma revolução e venci. Iniciei o trabalho de libertação e instaurei o regime de liberdade social.
Tive que renunciar. Voltei ao governo nos braços do povo. A campanha subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos nacionais revoltados contra o regime de garantia do trabalho. A lei de lucros extraordinários foi detida no Congresso. Contra a Justiça da revisão do salário-mínimo se desencadearam os ódios.
Quis criar a liberdade nacional na potencialização das nossas riquezas através da Petrobrás, mal começa esta a funcionar, a onda de agitação se avoluma. A Eletrobrás foi obstaculada até o desespero. Não querem que o trabalhador seja livre. Não querem que o povo seja independente.
Assumi o Governo dentro da espiral inflacionária que destruía os valores do trabalho. Os lucros das empresas estrangeiras alcançavam até 500% ao ano. Nas declarações de valores do que importávamos existiam fraudes constatadas de mais de 100 milhões de dólares por ano. Veio a crise do café, valorizou-se o nosso principal produto. Tentamos defender seu preço e a resposta foi uma violenta pressão sobre a nossa economia a ponto de sermos obrigados a ceder.
Tenho lutado mês a mês, dia a dia, hora a hora, resistindo a uma pressão constante, incessante, tudo suportando em silêncio, tudo esquecendo, renunciando a mim mesmo, para defender o povo que agora se queda desamparado. Nada mais vos posso dar a não ser meu sangue. Se as aves de rapina querem o sangue de alguém, querem continuar sugando o povo brasileiro, eu ofereço em holocausto a minha vida.
Escolho este meio de estar sempre convosco. Quando vos humilharem sentireis minha alma sofrendo ao vosso lado. Quando a fome bater à vossa porta, sentireis em vosso peito a energia para a luta por vós e vossos filhos. Quando vos vilipendiarem, sentireis no meu pensamento a força para a reação.
Meu sacrifício nos manterá unidos e meu nome será a vossa bandeira de luta. Cada gota de meu sangue será uma chama imortal na vossa consciência e manterá a vibração sagrada para a resistência. Ao ódio respondo com o perdão. E aos que pensam que me derrotaram respondo com a minha vitória.
Era escravo do povo e hoje me liberto para a vida eterna. Mas esse povo de quem fui escravo não mais será escravo de ninguém. Meu sacrifício ficará para sempre em sua alma e meu sangue terá o preço do seu resgate.
Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia, não abateram meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na história.”
se redator,
seria bom também republicar a matéria de Arp Procópio do cometa. (sobre a carta testamento)
na época mexeu com vários acadêmicos da UFMG, que intrigados foram perguntar pra mães de Claudia, Cleusa, então professora e cientista do ICB da UFMG, sobre a veracidade da tese de nosso professor garrucheiro, depois embaixador no Brasil do Principado Livre do Matto-Dentro, além de chefe da sucursal Ipanema / Rio