Renovação da licença ambiental da Vale em Itabira é liberada para análise e pode ser aprovada sem audiência pública, com anuência antiga

Fotos: Carlos Cruz

Vencida desde 2016, e mesmo tendo a mineradora Vale protocolado, “tempestivamente”, requerimento de revalidação  da Licença Ambiental em 17 de março do ano anterior, a sua análise foi prorrogada por prazo indeterminado pela  Superintendência de Projetos Prioritários (Suppri), órgão técnico da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad).

Daí que, perante a legislação em vigor, “encontra-se válida nos termos do Decreto Estadual número 47.474, de 22 de agosto de 2018”, a licença ambiental para a Vale continuar extraindo e beneficiando minério de ferro do subsolo de Itabira.

É o que sustenta a mineradora, “tendo em vista o Processo de Revalidação da Licença de Operação formalizado em 17/3/2015, através do PA COPAM 00119/1986/113/2015.” Ainda segundo a Vale, não é possível prever o tempo de duração de sua análise pelo órgão ambiental estadual.

“Cabe ao empreendedor apresentar todas as informações e estudos exigidos pela legislação ou pelo órgão ambiental, no prazo respectivamente determinado, o que tem sido cumprido pela Vale.”

Recomeço

Só após pressão da Prefeitura, por meio da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, a Suppri remeteu o processo de licenciamento à Superintendência Regional de Meio Ambiente Leste de Minas (Supram-LM), “que irá inserir (a sua análise e deliberação) em seu planejamento”, informa a este site a assessoria de imprensa da Semad.

“Me disseram que o atraso (da análise pela Suppri) foi por falta de pessoal (para avaliar o pedido de renovação da licença ambiental)”, contou o secretário Denes Lott, na reunião do Conselho Municipal de Meio Ambiente (Codema), em 12 de agosto, após visita à Semad onde foi tratar do tema e da excessiva poeira de minério que tem sido despejada em Itabira.

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Essa falta de pessoal técnico para avaliar o processo é confirmada, em parte, pela assessoria Semad. “Foi dada prioridade (no período) aos demais requerimentos que não estavam resguardados pelo prazo e com atividades paralisadas.”

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Vigência

O órgão ambiental estadual confirma que, de acordo com o sistema de gestão da Supram-Leste, o processo de renovação da licença do empreendimento foi protocolado dentro do prazo legal, nos termos do artigo 14, parágrafo 4º da Lei Complementar 140/2011.

E que, por isso, encontra-se vigente o licenciamento ambiental da Vale, tendo sido prorrogado até manifestação conclusiva sobre a renovação. E que por isso estão mantidas “todas as obrigações decorrentes da Licença de Operação original (programas, condicionantes etc.)”.

Só agora, após pressão municipal, a Supram-Leste deve dar prosseguimento ao processo de licenciamento com as mesmas avaliações e documentos oferecidos pelo empreendedor em 2016.

E terá por base a anuência municipal apresentada pela Prefeitura de Itabira há mais de seis anos, após deliberação do Codema. Essa anuência deveria ser reavaliada, uma vez que a realidade da mineração é outra no município.

A deliberação do Codema com certeza não avaliou os novos impactos decorrentes da instalação das novas usinas de concentração de itabiritos.

E há ainda um novo entendimento sobre a insegurança das barragens após os trágicos rompimentos de estruturas em Mariana e Brumadinho, ambas menores que as existentes em Itabira, e que resultaram em centenas de mortes e impactos ambientais sem precedentes na história mundial da mineração.

Audiência Pública

Daí que antes de o Copam deliberar sobre a renovação da licença ambiental da Vale para continuar minerando em Itabira, é imprescindível a realização de uma audiência pública.

É o que promete requerer o secretário municipal de Meio Ambiente, Denes Lott, mesmo considerando que a legislação não é clara quanto à exigência de se realizar audiência pública no caso de renovação de licença ambiental. E mesmo tendo conhecimento da resistência do órgão ambiental estadual para a sua realização.

“Considerando que o empreendimento se encontra em fase de operação e com requerimento de revalidação da Licença de Operação, neste momento em que o complexo minerário se encontra, não há previsão, na referida norma, da realização de novas audiências públicas”, informou a Semad a este site por meio de sua assessoria de imprensa.

Isso mesmo tendo o órgão ambiental informado que, de acordo com Deliberação Normativa Copam nº 225/2018, as audiências públicas são previstas, tendo a função de informar “sobre o projeto e os seus impactos ambientais e discussão do Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental.”

Ao negar base jurídica à realização de audiência pública antes de aprovar a renovação da licença ambiental da Vale, o órgão ambiental estadual impede a participação da sociedade civil itabirana nesse processo de licenciamento que afeta a vida de todos os itabiranos e de participar da discussão dos EIA/Rima.

Outro argumento apresentado pelo órgão ambiental ao negar a sua realização é esdrúxulo, para dizer o mínimo, por não condizer com a realidade: sustenta que existem canais de comunicação disponíveis da empresa para esclarecer a população impactada.

“São mantidos pelo empreendimento programas de educação ambiental e de comunicação social que estabelecem contato direto entre a população afetada pelos impactos da atividade minerária e o empreendimento”, sustenta a Semad, dando mais uma prova de que desconhece a realidade impactada em Itabira, uma vez que faltam informações claras e objetivas do empreendimento minerário.

A insistência pela realização da audiência pública deveria unir todos os segmentos sociais em Itabira. Afinal, trata-se da renovação da licença ambiental de uma atividade que está terminando, com a exaustão agora prevista para pouco além de 2042, isso se “nada de novo no front” ocorrer nos próximos anos, antecipando o fim inexorável.

Ou mesmo que venha prorrogar ainda mais a exploração das minas locais, empurrando para o infinito o processo de discussão e implementação das medidas mitigadoras e compensatórias que devem constar do Plano de Fechamento das Minas de Itabira.

Previsão legal

Em resposta anterior a este site a Supram admitiu a realização de audiência pública em casos excepcionais, mesmo para minas em operação, a exemplo do que ocorreu em 18 de fevereiro de 1988, antes da aprovação da Licença de Operação Corretiva (LOC) em 2000.

“Quando cabível, e sendo solicitada por pessoas ou instituições legitimadas, no prazo de 45 dias contados da publicação de edital, a audiência pública é convocada pela Superintendência Regional de Meio Ambiente (Supram-Leste) da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) responsável pela análise do processo de licenciamento ambiental.”

Portanto, existe mecanismo legal para a sua realização, como admite a própria Vale em resposta a este site. “Cabe ressaltar que a Audiência Pública não é obrigatória no processo de revalidação das licenças de operação, cabendo essa avaliação ao órgão ambiental, conforme previsão da Deliberação Normativa Copam nº 225, de 25/07/2018.”

Sobre o atraso do órgão ambiental na avaliação do pedido de renovação da licença ambiental, a Vale diz que “não é possível ao empreendedor prever o tempo de duração de sua análise pelo órgão”.

“Cabe ao empreendedor apresentar todas as informações e estudos exigidos pela legislação ou pelo órgão ambiental, no prazo respectivamente determinado, o que tem sido cumprido pela Vale. O novo prazo de validade da Licença será definido pelo órgão ambiental, após a conclusão da análise do pedido de revalidação.”

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