Promotora de Justiça de Itabira assegura que a empresa Aecom não presta serviços à Samarco, à Vale ou à Fundação Renova
Contratada pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) como empresa independente para inspecionar e acompanhar as obras de reforço das barragens e estruturas de contenção de rejeitos da mineradora Vale em Itabira, e também em outros municípios, a empresa de consultoria Aecom Engenharia está sendo acusada pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) de já ter prestado serviço anterior à mineradora, por meio da Samarco e da Fundação Renova, ambas por ela controlada.
A condição de nunca ter prestado serviço à Vale foi apresentada como pré-requisito para o MPMG contratar a Aecom Engenharia como empresa de auditoria independente. Para a promotora de Justiça da Comarca de Itabira, Giuliana Talamoni Fonoff, a condição de empresa de auditoria independente pela Aecom está mantida:
“A Aecom não possui qualquer contrato com as mineradoras Vale, Samarco e BHP e com a Fundação Renova, além daqueles firmados em virtude de Termos de Compromisso assinados com o Ministério Público e outros órgãos públicos, documentos esses que explicitam que a empresa presta serviços a estes órgãos públicos e não às mineradoras e à Fundação Renova. Neste sentido, é totalmente adequado afirmar que a Aecom não presta serviços à Samarco, à Vale ou à Fundação Renova”, atesta a promotora em nota encaminhada à redação deste portal de notícias.
Suspeição
A denúncia do MAB foi publicada pelo jornal Estado de Minas (Tragédia de Mariana: relações familiares podem anular decisões na Justiça). A reportagem coloca sob suspeição, sobretudo, a atuação da promotora de Justiça do Espírito Santo, Mônica Bermudes.
A representante do Ministério Público do Espírito Santo (MPES) atua como coordenadora do Grupo de Trabalho de Recuperação do Rio Doce na ação de reparação de danos aos atingidos pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, que resultou na morte de 29 pessoas, quatro do distrito de Bento Rodrigues e as demais trabalhadores da Samarco, deixando um rastro de destruição por toda a extensão do rio Doce.
A suspeição ocorre pelo fato de Mônica Bermudes ser sobrinha de Sérgio Bermudes, dono de famoso escritório de advocacia, que leva o seu nome. Bermudes foi contratado pela empresa Samarco, que tem a Vale como uma de suas controladoras, para defender os seus interesses nas ações que apuram os crimes ambientais, patrimoniais e humanos ao longo do rio Doce.
Por essa relação de parentesco com o advogado Bermudes, o MAB entende que a promotora não poderia atuar no caso. Mônica Bermudes tem irmão também advogando para a mineradora Vale, segundo a mesma reportagem.
Auditorias
No caso da Aecom, contratada pelo MPMG sob a condição de nunca ter prestado serviço à Vale, o seu nome aparece, segundo o MAB, como tendo realizado perícias à Samarco e à Fundação Renova, ambas controladas pela Vale.
“Para nós, foi uma atuação jurídica bastante equivocada. Ela (a promotora Mônica Bermudes) pediu perícias. Apareceu a empresa Aecom, que é a mesma que hoje faz a maior parte das perícias do Rio Doce”, relatou a advogada do MAB, Tchenna Maso, à reportagem do Estado de Minas.
“Na ação que tramita na 12ª Vara Federal, foi a primeira vez que essa empresa surgiu. Logo depois, essa mesma empresa, que já fez auditoria para a Fundação Renova na parte da saúde, fez vários laudos e até o juiz federal queria usar essa mesma empresa para fazer outros laudos, mas o Ministério Público Federal interferiu. Não pode uma empresa fazer laudos e auditoria para duas partes litigantes. Pode ser mais um provável conflito de interesses”, considera a advogada do MAB.
Ministério Público de Minas Gerais esclarece atuação da Aecom Engenharia
Procurada pela reportagem da Vila de Utopia, a promotora Giuliana Talamoni Fonoff, curadora do Meio Ambiente na Comarca de Itabira, assegura que tudo não passa de um mal-entendido.
“A nomeação da Aecom como perita do Juízo no caso do Rio Doce (a qual não foi indeferida pelo Ministério Público Federal, até mesmo porque tal órgão não detém poderes para tal) se deu para escopos que não coincidem com aqueles constantes dos Termos de Compromisso firmados com o Ministério Público e evidencia que a empresa realiza um trabalho irrepreensível e imparcial no caso”, assegura a promotora.
Leia a seguir a íntegra da nota do Ministério Público encaminhada à redação deste site de notícias:
Nota de esclarecimento
“Primeiramente, agradeço-lhe pelo questionamento, que acredito possa ser uma dúvida geral após a divulgação da reportagem citada pelo Estado de Minas. Para respondê-lo, penso ser necessário esclarecer como funciona o processo de contratação das empresas que prestam serviços de auditoria independente ao Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) referentes às ações de recuperação socioambiental decorrentes dos desastres do rompimento das barragens de Fundão e das barragens da Vale, em Brumadinho, além da segurança das barragens da mineradora Vale existentes em Minas Gerais.
Devido ao princípio do poluidor-pagador, as mineradoras custeiam os serviços prestados pelas empresas de auditoria independente para o MPMG. Para evitar que as mineradoras tenham qualquer ingerência sobre o processo, o MPMG participa da escolha das empresas de auditoria independente e fiscaliza os contratos das mineradoras com as auditorias, assim como possui Termos de Ajustamento de Conduta com todas as mineradoras que são auditadas. Os contratos são analisados pelos promotores de Justiça responsáveis e precisam refletir exatamente as previsões de imparcialidade e independência inseridas nos Termos de Compromisso firmados entre as mineradoras e o MPMG.
No caso da empresa Aecom, desde o ano de 2016, esta empresa presta serviços de auditoria independente ao MPMG para acompanhamento da segurança geotécnica das estruturas do Complexo Germano, em razão do desastre do rompimento da barragem de Fundão, da empresa Samarco S.A., que é controlada pelas empresas Vale S.A. e BHP Biliton Brasil Ltda. Em decorrência de Termos de Ajustamento de Conduta firmados entre o MPMG e a Samarco, a Aecom também audita o plano de manejo de rejeitos que vem sendo implementado pela Fundação Renova na bacia do rio Doce.
Diante do rompimento das barragens da Vale, em Brumadinho, foi firmado Termo de Compromisso entre MPMG e Vale, em 15 de fevereiro de 2019, pelo qual a Aecom passou a auditar para o MPMG todas as ações de recuperação socioambiental implementadas pela Vale na bacia do rio Paraopeba decorrentes do desastre. Desde 2019, em razão de outros Termos de Ajustamento de Conduta firmados entre MPMG e Vale, a Aecom também passou a auditar as barragens existentes nas minas da Vale situadas em Itabira.
No que toca ao desastre do rio Doce, em razão de o custeio das ações de auditoria referentes ao manejo de rejeitos ser realizado pela Fundação Renova, a Aecom consta como “cliente” em todas as Notas Técnicas e Relatórios expedidos pela auditora ao MPMG. Todavia, os serviços da Aecom são prestados ao MPMG e não à Fundação Renova.
É importante ressaltar que a Aecom vem prestando ao Ministério Público de Minas Gerais, de forma imparcial e independente, um trabalho de excelente qualidade. Da mesma maneira, a Aecom não possui qualquer contrato com as mineradoras Vale, Samarco e BHP e com a Fundação Renova, além daqueles firmados em virtude de Termos de Compromisso firmados com o Ministério Público e outros órgãos públicos, documentos esses que explicitam que a empresa presta serviços a estes órgãos públicos e não às mineradoras e à Fundação Renova. Neste sentido, é totalmente adequado afirmar que a Aecom não presta serviços à Samarco, à Vale ou à Fundação Renova.
A nomeação da Aecom como perita do Juízo no caso do Rio Doce (a qual não foi indeferida pelo Ministério Público Federal, até mesmo porque tal órgão não detém poderes para tal) se deu para escopos que não coincidem com aqueles constantes dos Termos de Compromisso firmados com o Ministério Público e evidencia que a empresa realiza um trabalho irrepreensível e imparcial no caso.
Nota-se, também, que nenhum dos relatórios anteriores emitidos pela AECOM foram questionados, e o foco excessivo no fato de a Fundação Renova constar como “cliente” evidencia que não há críticas a serem feitas às conclusões relatadas no documento, que se mostram completamente adequadas e imparciais, inclusive exigindo diversas alterações com relação ao estudo inicialmente sugerido pela Fundação Renova, o que não seria de interesse da Fundação.
Feitos estes esclarecimentos, coloco-me à disposição para eventuais esclarecimentos adicionais que se mostrem porventura necessários.”