Prestes a completar 20 anos, Memorial Drummond ganha projeto de revitalização

Projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer (1907-2012), quase 20 anos depois de ser inaugurado, o Memorial Carlos Drummond de Andrade já tem projeto conceitual pronto para ser revitalizado. O monumento foi inaugurado em 31 de outubro de 1998, nas celebrações dos 96 anos do nascimento de Drummond e no sesquicentenário da emancipação política e administrativa de Itabira. Fica na encosta do Pico do Amor, no Parque Municipal Natural Mata do Intelecto.

Revitalização inclui o retorno da lâmina d’água (Fotos: Divulgação)

Os detalhes para a elaboração do projeto executivo da revitalização foram acertados nessa quinta-feira (22), em uma reunião no Rio (RJ) entre o secretário de Obras, Ronaldo Lott, e o arquiteto Jair Varela, que coordena a equipe do escritório de Niemeyer. O engenheiro Altamir Barros, idealizador do projeto do Memorial no governo do ex-prefeito Jackson Tavares (PT), também participou da reunião.

O arquiteto Jair Varela, Altamir Barros e Ronaldo Lott se reúnem para detalhar projeto

“Só falta agora buscar parceiros públicos e privados”, diz Ronaldo Lott, que não vê dificuldades nessa empreitada histórica e cultural, memorialística. A Vale, que já patrocinou a obra, é uma das possíveis parceiras. “Mas existem outras empresas que iremos procurar”, adianta o secretário de Obras.

Painel com as fotos das obras de Niemeyer no escritório, no Rio. O memorial está na sétima linha, a sexta foto da esquerda para a direita

A previsão de custo para a revitalização é de até R$ 400 mil. “Não é uma quantia alta, mas necessária para adequar e modernizar o monumento sem que se percam as suas características originais”, considera Ronaldo Lott.

Pedro Drummond na inauguração do Memorial, com o ex-presidente da Vale Thiers Barsotti

“A Prefeitura deve participar com contrapartida dos royalties do minério”, adianta. A justificativa é de que se trata de um investimento cultural e turístico. Portanto, é parte da estratégia de diversificação da economia local.

Sem pressa

“É só uma revitalização, uma adequação ao que já existe, como foi, inclusive, previsto pelo próprio Niemeyer”, considera o secretário de Obras, que participou da construção do Memorial como secretário da mesma pasta no governo de Jackson Tavares (Leia abaixo trecho de Niemeyer dizendo da necessidade de a obra ser feita em etapas).

Trecho do projeto original, com recomendação de Niemeyer para que a obra fosse feita por etapas

Conforme explica Ronaldo Lott, as mudanças no monumento são necessárias para se fazer frente às demandas modernas, inclusive de acessibilidade e conforto para visitantes e estudiosos da obra drummondiana.

Na área ao fundo, será construído um deque de madeira, para contemplação da natureza e de parte da cidade. À esquerda do deque ficarão os banheiros, que serão ampliados – e adaptados às todas demandas de acessibilidade.

A entrada do memorial, na parte da frente, será deslocada para a direita. A lâmina d’água, imprescindível, será também restaurada. O passeio também será modificado – e terá um desenho especial (geométrico), de acordo com o projeto. E haverá um estacionamento à esquerda, de serviço.

Desenho do Memorial, no esboço de Niemeyer

Para complementar a revitalização, a iluminação do Pico do Amor será substituída. “O (arquiteto) Jair Varela virá a Itabira para fazer o estudo da iluminação. Será bem moderna, sem agredir o local e os seus objetivos, um sistema de iluminação inteligente.”

A previsão é concluir a revitalização só em outubro de 2019, na Semana Drummondiana. “Não temos pressa, para tudo sair bem feito, sem atropelos”, defende o secretário de Obras, que precisa também incluir a contrapartida da Prefeitura na previsão orçamentária para o próximo ano.

Drummond de Itabira para o mundo. E do mundo para Itabira

Altamir Barros, engenheiro da Prefeitura e idealizador do Memorial Drummond, conta que a ideia de construir o monumento veio à cabeça quando assistia uma entrevista com Oscar Niemeyer falando do projeto que estava elaborando para Porto Alegre (RS), em homenagem ao Cavaleiro da Esperança, o legendário Luiz Carlos Prestes (1898-1990) – um monumento que só foi inaugurado recentemente, em outubro do ano passado.

Altamir Barros com Niemeyer, no Rio, em 1997: trocando ideias sobre o projeto que viria a ser o Memorial Carlos Drummond de Andrade

“A entrevista era ao vivo e como podia fazer pergunta, telefonei para lá perguntando a Niemeyer se ele topava projetar um monumento a Drummond em Itabira. Ele respondeu que seria uma honra”, conta o engenheiro. “Consegui o telefone de seu escritório no Rio e do gabinete do prefeito liguei para Niemeyer. Ele atendeu com a maior presteza e já agendamos uma reunião no Rio”, recorda.

De acordo com o engenheiro Barros, a relação entre Drummond e Niemeyer sempre foi muito forte, não só pela modernidade que os dois representam, mas também pela amizade e respeito que um nutria pelo outro.

“Eles foram correligionários no Partido Comunista Brasileiro. Niemeyer era também amigo de Capanema (Gustavo, ex-ministro de Educação de Vargas). Foi também um dos arquitetos que projetou o moderno prédio do Ministério da Educação, no Rio, onde Drummond trabalhou.”

Com tudo isso, aliado à forte presença da obra de Niemeyer em Minas Gerais, com o conjunto arquitetônico da Pampulha, o edifício JK, o prédio na praça da Liberdade onde Tancredo Neves residiu, não houve dúvida de que arquiteto e poeta poderiam estar juntos, sempre eternos nesse monumento itabirano em homenagem ao filho mais ilustre de Itabira.

Local de aprendizagem

“O Memorial tem uma relação dialética com a obra de Drummond”, filosofa Altamir, que prossegue: “É uma antena ligada que traz Drummond do mundo para Itabira, e assim também é, ou pode ser, de onde o poeta se projeta da Cidadezinha para o mundo.”

Altamir observa o arquiteto esboçando as curvas do Memorial

Ele espera que a revitalização ocorra não só na parte física, mas também em sua própria concepção, retornando ao seu projeto original. “ Que o Memorial se torne um centro de estudo da vida e da obra drummondiana, devendo ser assim caracterizado, e não apenas como um local de visitação.”

Barros, filosoficamente, ainda sonha com a possibilidade de se tornar de fato um espaço de memória, vivo e revitalizado. “Que seja um local de agradável espanto, um pouco escondido na encosta, mas que crie um impacto visual em um local bonito, dentro da proporcionalidade, sem obscurecer o Pico do Amor”, vislumbra.

“Que se torne um espaço de aprendizagem sobre o poeta e a sua obra, comparável entre as maiores da língua portuguesa”, projeta o engenheiro que não se prende à fria prancheta calculando a massa de concreto, mas que sonha com os itabiranos e visitantes de todo o mundo consumindo o “biscoito fino” da poesia de Drummond servido com a arquitetura de Niemeyer juntos no Memorial.

 

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6 Comentários

  1. Aleluia!
    Resta dizer que havia uma verba do Fundo Estadual de Cultura destinada para reformas no Memorial Drummond de Andrade, só não sei se ainda está disponível depois de tantos anos.

  2. Boas notícias, este menino, o Ronaldo, neto do Lott é um cara que também ama a Cidade, que bom que ele seja o secretário de Obras. Interessante construir mais puxadinhos, como o deque, tem que crescer pra abrigar mais pessoas e documentos. Na Casa de Rui tem um projeto assinado pelo Oscar Niemeyer de uma casa pro poeta Drummond e Dolores. Curiosidade, um dia vou ver e conto aqui no Vila. Também podiam trocar aquela porta de entrada que me parece portãozinho de quartinho.
    O mais interessante do memorial é que ele está de costas pra centralizada e de frente pra Cidade. O Oscar é o Oscar e ponto final.

  3. Para o secretário de Obras, o Ronaldo Lott: caro Ronaldo, alimento a expectativa de que vc convença o prefeito, mesmo decaído, a uma atitude em relação ao crime contra a ética-estética que é a aberração da estátua imposta à Cidade, no Poço da Água Santa (A canalha delira orgiasticamente com a vulgaridade).

    Nos surpreenda Ronaldo com uma boa e definitiva notícia!

    E pra te emocionar transcrevo especialmente pra você, trecho da crônica do poeta Drummond para Luiz Camillo.

    “Ao levantar-se para sair, depois de nossa conversa, um último episódio antigo foi evocado e a nós ambos pareceu tão vivo, tão presente, que nos surpreendemos; então, com aquela voz descansada que escondia o temperamento vibrátil, ele começou: “Você sabe que essas coisas aconteceram há trinta anos, meu caro?…” Passara-se todo esse tempo e continuávamos meninos, descendo e galgando ruas de uma cidadezinha calçada de ferro; ouvindo tanger o sineiro das tropas que pousavam no rancho de Juca Machado; TOMANDO BANHO NA SOMBRIA PISCINA NATURAL DA ÁGUA SANTA; penetrando, como em um templo délfico, no casebre solitário do velho feiticeiro Elias do Cascalho. Agora estas coisas perfizeram quarenta anos. Mas Luís Camillo não está aqui para evocá-la com o seu conterrâneo, como tanto nos aprazia, a tal ponto que ao longo da vida não mantivemos mais que um só diálogo, intermitente, desordenado e suave, sobre “uma certa Itabira” e nossa humilde inclusão em seu complexo emotivo e histórico: as pedras, os crepúsculos, as velhas bocas de minas de ouro, os doidos, o Dr. Robinson, da Serra, o Lilingue, o Zuzuna, o Nhonhô Bilioco, a área inamovível da infância.”

  4. Altamir, meu caro,

    A notícia da revitalização do Memorial Carlos Drummond de Andrade é verdadeiro presente que ganho neste domingo de Páscoa! O projeto é belíssimo, pleno de significado, ao unir, para sempre, duas das maiores expressões da moderna arte brasileira: Drummond e Niemeyer.

    Parabéns a todos nós, itabiranos (eu entre vocês, honrado que fui pela concessão do título de Cidadão Honorário de Itabira).

    Abraço fraterno do amigo de sempre,

    Edmílson Caminha

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